Cronicas de Segurança Aeronáutica

Meu Caro,

Vamos começar a nossa croniqueta analisando uma AD da FAA relativamente ao problema das sondas Pitot de aeronaves Airvan. A propósito deste documento americano recordarei uma situação vivida por mim próprio relativamente ao aquecimento do Pitot de uma determinada aeronave.

Depois irei iniciar algumas piadas aeronáuticas para demonstrar que também se pode aprender algumas coisas em matéria de Segurança Operacional com um sorriso nos lábios.

Seguidamente irei continuar a análise do acidente ocorrido com o Cessna G-BABB. Mais especificamente irei explicar-te as recomendações feitas pelos Investigadores no sentido de evitar, de futuro, acidentes tão lastimáveis,

Terminaremos com a desmontagem dos códigos TAF.

O RISCO DUMA AVARIA NA SONDA PITOT – A 2012-CE-031-AD DA FAA

Esta semana recebi da FAA o Amendment 39-17274 da airworthiness directive CE-031-AD. E o que diz de tão importante esta AD para eu estar a publicitá-la tanto mais que é aplicável a uma aeronave que muito provavelmente não existe nenhuma no Registo Aeronáutico Nacional? Diz, simplesmente, isto:

“We are adopting a new airworthiness directive (AD) for GA 8 Airvan (Pty) Ltd Models GA8 and GA8-TC320 Airplanes. This AD results from mandatory continuing airworthiness information (MCAI) issued by an aviation authority of another country to identify and correct an unsafe condition on an aviation product. The MCAI describes the unsafe condition as burnt electrical connectors leading to the left-hand wingtip pitot heater, which may result in loss of airspeed indication.”

GA 8 Airvan a aeronave à qual se aplica a “airworthiness directive” CE-031-AD.

A perda da função “aquecimento do Pitot” em Condições Meteorológicas de Instrumentos (IMC) pode levar à perda da indicação da velocidade de ar. Como aprendeste, este facto pode levar à perda de controlo da aeronave e ao acidente subsequente.

Pessoalmente, aprendi por experiência própria que há operadores que não conseguem perceber este facto que corresponde a uma enorme violação da Segurança Operacional. Efectivamente, um dia ao realizar o “Pre-flight checklist” a uma aeronave verifiquei que ao ligar o interruptor do “Aquecimento ao Pitot” não se percebia nada no amperímetro da mesma que indicasse passagem de corrente. Tentei perceber se o pitot tinha aquecido nem que fosse um pouquinho. Infelizmente a sonda nem morna estava.

Como não quiséssemos descarregar a bateria, desligámos o “Aquecimento ao Pitot” e aproveitámos a viagem para durante o voo voltarmos a testar o sistema de aquecimento da sonda. Afinal em voo, a fonte primária de energia eléctrica sempre é o alternador e este não se “descarrega”! Meia hora antes de chegarmos ao destino ligámos o “Aquecimento” na esperança que ele estivesse operacional. Antes de pararmos o motor saí da aeronave – com todos os cuidados que uma saída destas obriga – e fui apalpar o Pitot com todo o cuidado para não me queimar na mão (risos). Infelizmente, como eu já previa a sonda estava mais fria que Ymir, Deus do Gelo.

Pela enésima vez reportámos, por escrito, a avaria. Levantámos o problema de viva voz com os responsáveis do operador. Nem assim compreenderam a gravidade da questão. E um dia, nestas coisas há sempre “um dia”, tempo mais frio, mais humidade na atmosfera e o inevitável deu-se: o velocímetro de ar ficou bloqueado, com a sonda branquinha de gelo. Um verdadeiro sorvete branco.

E sabes qual foi a atitude inteligente do operador ou de alguém à sua responsabilidade? Retirar o interruptor do sistema de “Aquecimento do Pitot”, provavelmente baseado no ultra cretino princípio enunciado tantas vezes pela vox populi e que nos lembra que “olhos que não vêem, coração que não padece”.

Não sei se a aeronave ainda anda a voar nestas condições. Os “rapazes” ainda hoje talvez não saibam que o acidente do voo AF447 começou com gelo numa sonda Thalès « AA » do Airbus A330. E nota que isto não é uma particularidade dos Airbus. Nos Cessnas o fenómeno é idêntico. Honni soit qui mal y pense

Já me ia esquecendo de dizer uma coisa importante. A FAA prevê que a reparação de cada aeronave do Registo Americano custe USD 440,00 (€340,00) para material e mão-de-obra. Definitivamente, o pequeno preço a pagar pela Segurança Operacional. Q

A SEGURANÇA OPERACIONAL TAMBÉM SE APRENDE SORRINDO (Parte – I)

Voar é a segunda maior emoção do mundo conhecida pelo homem. “Aterrar é a primeira”. Nunca descuides a preparação da aterragem!

INSTRUÇÃO, CONTROLO E ACIDENTE – (Parte – XII)

Esta semana vamos começar a entrar nas recomendações insertas no Relatório de Acidente produzido pelo Air Accident Investigation Branch – UK.

As primeiras recomendações endereçadas a diversas entidades começam pelo tema “Procedimentos para o controlo de aeronaves pilotadas por pilotos inexperientes”. Ao fim e ao cabo todos nós quando começámos.

Na altura em que ocorreu o acidente, apesar de ser prática corrente os instrutores avisarem o ATC de que um dado aluno iria realizar o seu primeiro voo solo, nada estava previsto no Southend Manual of Air Traffic Services Part 2 em relação aos outros primeiros voos dos alunos, voos, estes, que fazem pouca diferença em relação ao voo de largada.

Imediatamente após ter ocorrido o acidente o SATCO de Southend emitiu um memorandum, ao qual nos referimos a semana passada. Neste documento, os factos que estiveram na base do acidente com o G-BABB, foram simplesmente aflorados e para que houvesse uma eficácia efectiva tornava-se necessário fazer com que todas as partes interessadas se mantivessem devidamente informadas da sua existência. Assim, o Air Accident Investigation Branch – UK decidiu emanar a seguinte recomendação:

Safety Recommendation 2007-036

It is recommended that London Southend Airport includes information relating to the notification and handling of flights by inexperienced solo pilots in its Part 2 of the Manual of Air Traffic Services.

Em relação a esta recomendação o CAA (UK) afirmou em carta enviada ao AAIB (Air Accidents Investigation Branch) que era sua opinião haver mérito em implementar um prefixo que identificasse os pilotos-alunos. Tal prefixo poderia ser: “Student”, “Trainee” ou “Tyro” (tirocinante) e seria utilizado por todos os pilotos-alunos a quem, ainda não tivesse sido autorgada a licença de PPL (Private Pilot Licence). A CAA (UK) sugeriu que o prefixo fosse utilizado na primeira comunicação realizada para uma dada estação, por exemplo:

“Student G-BXLM’

e que após a primeira comunicação de apresentação o piloto-aluno deverá regressar à expressão normal do “call sign” da aeronave. deste modo o FPS (plano de voo) pode ser anotado com esta especificação eliminando-se assim a possibilidade de se perder a informação de “Estudante” mesmo que o controlo da aeronave para outro controlador.

Aliás a expressão “Tyro” é utilizda já há bastante tempo no domínio dos voos militares ingleses. Assim, foi proposta a seguinte recomendação:

Safety Recommendation 2007-050

The Civil Aviation Authority should instigate the use of a suitable prefix, for use in civil radiotelephony, to signify a student pilot, flying solo.

 

Safety Recommendation 2007-051

The Civil Aviation Authority should amend the Manual of Air Traffic Services Part 1 and the Radio Telephony Manual (CAP413) to emphasise to controllers that pilots identifying themselves as students have limited ability, which must be taken into consideration when issuing instructions.

Para a semana provavelmente terminaremos a análise deste acidente de cujo relatório tanto se pode aprender. Q

METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – XIX)

Todos nós temos noção dos riscos de voar em situações de gelo. Muitos aviões não estão preparados para voar nestas condições. Outros estão preparados para voar “into known icing conditions” e podem enfrentar as condições de gelo desde que se preparem para essas condições. Como tal, o que as mensagens TAF nos dizem sobre estas condições é algo de extrema importância. Vejamos como podemos descodificar os TAF’s naquilo que ao gelo diz respeito.

CONDIÇÕES DE GELO

Comecemos por analisar um TAF exemplo, contendo informação sobre condições de gelo.

TAF

KBLV 051212 14005KT 8000 BR FEW030 QNH2960INS

BECMG 1617 29008KT 3200 -RA OVC030 620304 QNH2958INS

BECMG 2021 30008KT 9999 SKC QNH2950INS T08/18Z M01/11Z

Se houver previsão de gelo, o grupo de códigos respeitante à informação de “Gelo” inicia-se sempre pelo dígito 6 , e aparece imediatamente a seguir ao grupo de informação de nuvens. Para realizar a descodificação do grupo de “Gelo”, meu Caro, segue as seguintes instruções:

Identifica o designador de gelo – “6” – imediatamente a seguir ao grupo de informação sobre nuvens. 620304 no exemplo do TAF;

O dígito seguinte indica-nos o tipo e intensidade do gelo: 620304. (ver tabela);

Os três dígitos seguintes fornecem informação sobre a altitude da base da camada de gelo, expressa em centenas de pés. Exemplo: 620304.

O último dígito informa sobre a espessura da camada de gelo expressa em milhares de pés. No caso do exemplo temos 620304, o representa uma camada de atmosfera com gelo com uma espessura de 4.000 ft. Assim para sabermos qual é a altitude do topo da camada com condições de formação de gelo basta somar-se a este código a altitude da base da camada. No exemplo (3.000+4.000= 7.000 ft).

Icing Intensity Decode Table

Code  -  Decode

   0          - None (see note)

   1          - Light Mixed Icing

   2          - Light Rime Icing In Cloud

   3          - Light Clear Icing In Precipitation

   4          - Moderate Mixed Icing

   5          - Moderate Rime Icing In Cloud

   6          - Moderate Clear Icing In Precipitation

   7          - Severe Mixed Icing

   8          - Severe Rime Icing In Cloud

   9           -Severe Clear Icing In Precipitation

Tem sempre o máximo cuidado com esta camada se a tua aeronave não está certificada “to fly into known icing conditions”, caaso contrário estás a meter-te na boca do lobo. Q

Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ

Como sempre, um abração do

Fernando

Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve segundo a ortografia do Acordo Ortográfico de 1945.

Meu Caro,

Esta semana começo a minha croniqueta com uma notícia alarmante. Depois passarei à análise de uma AD da FAA relativa a um problema no sistema de combustível nos Cessna’s C172R e C172S.

O nosso prato de substancia será a continuação da análise de um acidente ocorrido em London-Southend com um Cessna C150L durante o segundo voo solo de um piloto-aluno.

Terminarei com a desencriptação dos códigos das mensagens meteorológicas TAF.

UMA NOTÍCIA ALARMANTE

De acordo com uma notícia que recebi ontem da Curt Lewis & Associates, LLC, a Europa, com um incidente por cada 10.000 de voo no universo dos aviões ligeiros, têm um nível de registo de Segurança muito pior do que aquele que se verifica com a Aviação de Linha Aérea.

Isto dá que pensar. Cumpre-nos a nós aumentar significativamente aquele número de horas. Cumpre a tua parte. Um conselho do Fernando. Q

PROBLEMA COM O SISTEMA DE COMBUSTÍVEL DOS CESSNA C172R E C172S

Publicou a FAA, esta semana, uma airworthiness directive (AD) que vem alertar os proprietários e operadores dos modelos C172R e C172S do fabricante Cessna Aircraft Company. Esta AD é identificada pela Regulation Identifier Number (RIN) 2120-AA64.

Trata esta AD de um problema surgido no Sistema de Combustível dos aviões dos modelos citados em virtude de terem sido encontrados tubos de combustível danificados em virtude de roçarem nos comandos do leme vertical que, em extremo de movimento, tocam nos tubos. Dado o melindre da tradução de um documento com a importância de uma AD prefiro não traduzir e apresentar o texto na sua forma original.

SUMMARY: We are adopting a new airworthiness directive (AD) for certain Cessna Aircraft Company Models 172R and 172S airplanes. This AD was prompted by reports of chafed fuel return line assemblies, which were caused by the fuel return line assembly rubbing against the right steering tube assembly during full rudder pedal actuation. This AD requires you to inspect the fuel return line assembly for chafing; replace the fuel return line assembly if chafing is found; inspect the clearance between the fuel return line assembly and both the right steering tube assembly and the airplane structure; and adjust as necessary. We are issuing this AD to correct the unsafe condition on these products.

Um problema a discutires com a Oficina de Manutenção que presta serviço à tua aeronave se ela for da marca/modelo indicada. Q

INSTRUÇÃO, CONTROLO E ACIDENTE – (Parte – X)

Temos, ao longo de semanas, vindo a analisar o acidente com o Cessna C150L pilotado por um piloto-aluno no seu segundo voo solo e do qual resultou a morte do mesmo. Temos feito esta análise com um detalhe para além daquilo que é nosso hábito pois, para o resultado do acidente, tiveram de convergir diversas situações de risco, situações, estas, que tiveram origem quer na Formação, quer na Pilotagem, quer no Controlo no seu particular e no seu geral.

Ao longo desta série de artigos fizemos já referência a uma situação de desconhecimento de um memorandum por parte do ADC (Aerodrome Controller) em serviço, no momento do acidente com o G-BABB, Note-se que este documento era pré-existente à data de entrada em funções deste técnico.

Uma situação lastimável por parte do “Sistema” a fazer lembrar uma outra ocorrida em Milano Linate em que o ADC não conhecia (!) em pormenor a planta do aeroporto, em particular as marcações de S1, S2, S3, S4 e S5, um desconhecimento que foi uma das causas que esteve na base da colisão de dois aviões neste aeroporto de Milão. Para conhecer em pormenor os detalhes do acidente basta seguires a hiperligação.

O memorandum que tivemos oportunidade de analisar na minha crónica anterior havia, ele próprio, sido alvo de discussão no Forum da Guilda dos Air Traffic Control Officers (GATCO) bastante antes do nefasto acontecimento do dia 19 de Julho de 2006. Neste Forum estabeleceu-se o consenso generalizado de que os pilotos pouco experientes, na proximidade da “Final”, nunca deveriam ser instruídos a realizar qualquer manobra que não fosse um simples “go-around”. Neste Forum chegou-se, porém à conclusão que seria razoável que estes pilotos pudessem ser instruídos para realizarem uma “órbita de 360º” até ao fim da perna do “Vento de Cauda” de modo a garantir a separação com qualquer outro tráfego conflituante. Porém, como tu sabes, pois isso fez parte do teu treino, o piloto só começa a “sujar” o perfil, a diminuir a velocidade e a colocar “ar quente” ao carburador exactamente no fim do “Vento de Cauda”. Assim, a “órbita” seria sempre realizada com a aeronave em condições normais de voo, o que não aconteceu no voo do Cessna C150L G-BABB.

A semana passada referimos ainda que no próprio dia do acidente de London Southend e após este ter ocorrido o SATCO do aeroporto voltou a publicar um novo memorandum onde se clarificavam os procedimentos a seguir no caso dos voos de treino.

Vejamos agora o que nos diz o relatório da AAIU sobre os.

“Factores Humanos que Influenciaram o Piloto”

O Piloto-aluno recebeu todo o treino requerido pela JAR-FCL para que pudesse conduzir o voo que terminou em acidente. Contudo, ao contrário do que se possa pensar, o processo de voar um circuito visual não é fácil mas, sim, complexo. Quem não se lembra das dificuldades pelas quais passou! Nas primeiras etapas do treino de voo, o aluno é induzido a seguir uma série de rotinas como maneira de ultrapassar as dificuldades naturais do voo. Uma maneira para evitar a necessidade de proceder a julgamentos que a experiência do aluno ainda não permite fazer.

Por exemplo, os passos que se treinam para executar correctamente a “Perna Base” e a volta para a “Final” – selecção da posição dos flaps, selecção da potência do motor e selecção da atitude da aeronave – devem, se correctamente executados, colocar o avião no alinhamento da “centre line” da pista e na configuração apropriada para uma ladeira de 3º ou de 1:20. Se estas rotinas forem bem interiorizadas, a tarefa torna-se muito menos exigente e as compensações de ajustamento à trajectória ideal são minimizadas.

A rotina sistemática do circuito fornece os meios necessários para um piloto inexperiente alcançar o treino básico, ganhando experiência e confiança através de uma certa automatização. Por outras palavras: constroem-se rotinas para automatizar procedimentos e permitir o avião chegar naturalmente a uma trajectória correcta à “Final” e realizar a respectiva aterragem.

A norma do piloto reportar “Final” permite-lhe ter a certeza que este vai ser o seu principal objectivo e, assim, concentrar-se na pilotagem até ao momento de pôr as rodas no chão.

Os benefícios da rotinação dos procedimentos são de importância máxima durante os primeiros estágios da aprendizagem, em especial nos primeiros voos solo. Nestes primeiros voos o piloto-aluno está assoberbado em aplicar os princípios básicos do voo e, de certeza, não terá capacidade para pensamentos estratégicos ou para ampliar a sua consciencialização dos factos para além daqueles estritamente imediatos. Todas estas tarefas adicionais entram no campo do “airmanship” coisa que o piloto-aluno nesta ocasião ainda não tem.

Certamente o piloto-aluno do Cessna G-BABB, devido à sua inexperiência (15 horas de voo somente) descansou fortemente na prática das rotinas que havia apreendido durante a instrução do voo em circuito, pelo que as suas acções e expectativas foram extremamente tipificadas. Qualquer acção para além da prática corrente da instrução introduziria certamente um “ruído” que o aluno não saberia resolver. Na realidade não soube resolver e o acidente surgiu.

Dissequemos o modo como o piloto-aluno se baralhou completamente perante instruções do Controlo, instruções estas que saiam completamente fora da rotina.

A frase standard:

GO-AROUND, I SAY AGAIN, GO-AROUND (INSTRUCTION) ACKNOWLEDGE”

destina-se a comunicar uma Instrução clara, sem qualquer ambiguidade ao piloto. Esta frase está construída de modo a despoletar uma sequência de acções que, mesmo no caso de um piloto-aluno inexperiente, lhe foram ensinadas e praticadas.

Contudo, a instrução de “go-around” foi encaixada na transmissão tendo, porém, sido contrariada pela instrução:

…DISREGARD THAT JUST TAKE A LEFT TURN AND FLY NORTH …

No fim desta alteração à frase standard, o piloto-aluno não deu o “acknowledged à instrução de execução de um “go-around” limitando-se a repetir:

“BRAVO BRAVO TURN NORTH ”.

Como todos podemos calcular, para o piloto-aluno, a instrução:

“...TURN LEFT AND FLY NORTH...”.

foi uma surpresa completa tanto mais que dada com a aeronave a 250 ft agl. O facto de esta ter sido dada no seguimento de outras instruções para as quais lhe foi dito para esquecer podem ter sugerido ao piloto do Cessna G-BABB um enorme grau de urgência. Efectivamente o aluno voltou conforme instruído mas, provavelmente, sem ter qualquer ideia do que se iria seguir ou como ele se devia comportar. Um gesto automático (!). O facto de o aluno ter voltado para um caminho de 330º (o recíproco do caminho da “perna base”, em vez de ter voltado mantendo um heading norte, conforme instruído, faz sugerir que o aluno sentiu-se constrangido a manter-se no circuito.

O facto de o aluno ter ficado a voar numa direcção inversa à do circuito normal, saiu completamente fora da sua experiência, possivelmente atrapalhando-o por este não ter a certeza se havia uma outra aeronave no circuito.

Na prática a sua capacidade para criar um pensamento construtivo e monitorizar o estado do seu Cessna C150L ficou completamente reduzida. Para complicar ainda mais a situação, muito provavelmente, parte da sua atenção foi distraída para procurar uma outra qualquer aeronave no circuito ou para:

“…FAST TRAFFIC BEHIND...”.

Uma estratégia que um qualquer piloto com experiência teria adoptado sem problemas de maior:

  • Reconfigurando a aeronave e subindo para a altitude do circuito, reposicionando-se para se juntar novamente ao circuito na perna do “vento de cauda” (um verdadeiro “go-around”; ou
  • Reconfigurando a aeronave para um voo nivelado esperando novas instruções para se reposicionar na “final”, situação na qual, utilizando o seu próprio julgamento, poderia reconfigurar a aeronave para realizar uma nova aproximação e, a partir daí, começar de novo a desce para a pista; ou ainda
  • Reconfigurando a aeronave para um voo nivelado e pedindo instruções ao ATC para esclarecimento da situação.

Porém todas estas estratégias implicam um certo grau de confiança muito difícil de encontrar num piloto-aluno que realizava o seu segundo voo solo. Para agravar a situação o aluno tinha 16 anos de idade. Quando o piloto-aluno taxiou para a descolagem, o ADC instruiu para realizar um “backtrack” que o faria taxiar até ao início da pista. O ADC teve de repetir a instrução pois tudo leva a crer que o aluno não percebeu a instrução.

Este facto vem demonstrar a dificuldade que um piloto inexperiente sente para interpretar uma comunicação não expectável por parte do ATC. Para além disso demonstra, também, a relutância do aluno em pedir ao ATC uma clarificação da instrução. Um simples “Say again”.

Dá-se ainda um outro fenómeno bizarro ou não. Porém um fenómeno bem real. Verifica-se que nas primeiras fases do treino da pilotagem o aluno é dominado por duas vozes, digamos autoritárias. Os “his masters voice” do piloto: a voz do instrutor e a voz do controlador. Quando o aluno começa a voar solo, dada a inexistência do instrutor a bordo a autoridade do ATC aumenta proporcionalmente. A experiência da incompreensão da instrução para realizar o “backtrack” pode ter sido um bom exemplo desta situação.

Comigo próprio passou-se uma situação de escravidão ao “master voice” do ATC típica de um aluno em voo solo. Estava eu a realizar a minha primeira viagem a solo e estava a voar o segundo troço daquela. Este troço partia de LPCS, passava no VOR LIS, dirigia-se ao VOR FTM e terminava em LPCO.

Antes de sair para a viagem fui recomendado por tudo quanto era instrutor na minha Escola para respeitar escrupulosamente todas as instruções do ATC. Com este espírito parti para a viagem. Havia passado o VOR LIS havia poucos minutos quando Lisbon Approach pede-me para mudar o meu heading aumentado o rumo visto haver um Lufthansa em descida para Lisboa. Se Lisbon Approach me instrui para carregar o heading, de imediato, eu voltei mais para a direita seguindo o novo rumo que me foi indicado. Como era a minha primeira viagem a solo e tinha sido bem instruído para cumprir com as instruções do ATC, o Fernando foi entrando cada vez mais por terras transtaganas, afastando-se do seu caminho para o VOR FTM. Passados muitos minutos vem o controlador de Lisbon Approach à frequência pedir-me para lhe confirmar as minhas intensões. Nesta altura em que eu já não sabia em que parte do Alentejo estava deu-me vontade de responder que “as intensões eram as melhores”. Porém contive-me e confirmei que, conforme plano de voo, pretendia dirigir-me ao VOR FTM. Fui então informado pelo ATC que com o meu presente heading o meu destino seria CCS (Cáceres). Repliquei, então, que estava a seguir o heading que me havia sido indicado pelo ATC e que não havia recebido qualquer instrução em contrário. Muito gentilmente o ATC deu-me uma vectorização da minha presente posição para o VOR FTM.

Penso que este é um bom exemplo de um piloto novato estar completamente “escravizado” às instruções do ATC e não ter suficiente experiência para questionar Lisbon Approach se ainda era necessário manter-me no tal heading que me havia sido fornecido para me afastar do Lufthansa.

No caso do acidente que temos vindo a analisar nas últimas semanas houve, ainda, diversas outras circunstâncias que levaram a que o piloto-aluno não tivesse sido capaz de cumprir com todas as instruções recebidas.

Antes de mais temos de considerar que o segundo voo solo é uma experiência excitante para o aluno. Todos nós passámos por esta experiência. Por outro lado o facto de não ter compreendido as instruções de rolagem começou logo por ser um factor desestabilizador. Mais tarde na fase “final” da aproximação, o piloto do Cessna C150L recebeu uma comunicação complexa que tudo faz crer que este não entendeu correctamente visto tratar-se de uma manobra totalmente não familiar para um piloto nesta fase de treino. Estes factos, certamente, colocaram o piloto-aluno numa situação para a qual ele não tinha airmanship suficiente nesta fase da instrução. Nesta fase do treino o piloto só era efectivamente capaz de reagir de acordo com um certo automatismo que foi completamente “furado”. Como tal ele não foi sequer capaz de reconfigurar a aeronave para executar um voo horizontal e não se deu conta que a velocidade do Cessna G-BABB decresceu perigosamente.

Connosco todas estas fases se passaram da mesma maneira. Durante as primeiras horas do nosso treino de voo, provavelmente, a maior parte dos nossos procedimentos eram procedimentos “semi-automáticos”. Só gradualmente começámos a ganhar a segurança suficiente para sermos capazes de realizar manobras não estereotipadas. Este nosso companheiro teve o azar de o instruírem para fazer algo para o qual as suas 15 horas de voo ainda não chegavam.

Continuaremos para a semana com o estudo dos “Human factors affecting the aerodrome controller”. Q

METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – XVII)

Vejamos hoje como são representados numa mensagem TAF os códigos referentes à previsão da nebulosidade.

NUVÉNS

Comecemos por ver um exemplo duma mensagem TAF real:

TAF

KBLV 051212 14005KT 8000 BR FEW030 WS010/18040KT

QNH2960INS

BECMG 1314 16010KT 3200 -SHRA OVC020 QNH2959INS

TEMPO 1416 21015G30KT 1600 TSRA BKN008CB OVC020

BECMG 1617 29008KT 3200 -RA OVC030 620304

QNH2958INS

BECMG 1819 31012G22KT 9999 NSW SCT040 WSCONDS

520004 QNH2952INS

BECMG 2021 30008KT 9999 SKC QNH2950INS T08/18Z

M01/11Z

Numa mensagem TAF a previsão da altura das nuvens é sempre indicada em “centenas de pés”. Para se obter a informação real há que adicionar dois zeros no fim do valor que indica a altura. No exemplo anterior, FEW030, BKN008CB, OVC020 e SKC representam respectivamente os seguintes valores: 3.000 few, 2.000 overcast, 800 broken cumulonimbus, e sky clear.

No lugar de camadas de nuvens, poder-se-á indicar num TAF a visibilidade vertical em centenas de pés quando o céu se encontrar totalmente encoberto. Por exemplo, VV002 representa uma visibilidade vertical de 200 ft. Deste modo, a visibilidade vertical numa mensagem TAF indica o valor do tecto previsto.

Recapitulemos a tabela dos códigos de cobertura de nuvens:

Cobertura do céu por nuvens (oitavos):

SKCCéu limpo

FEW - Few -- 0-2 oitavos

SCT - Scattered -- 3-4 oitavos

BKN *-  Broken -- 5-7 oitavos

OVC *-  Overcast -- 8 oitavos

* Estas situações consubstanciam uma situação de “tecto”

Para a semana voltaremos ao tema agora para analisar as situações de “Wind Shear”. Q

Q

Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ

Como sempre, um abração do

Fernando

Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve segundo a ortografia do Acordo Ortográfico de 1945.

Meu Caro,

Esta semana vamos abordar a problemática da falta de pilotos e as novas condições para reforçar a segurança da formação dos novos co-pilotos.

Como tema de substancia iremos prosseguir a análise do acidente com o Cessna C150L G-BABB do qual resultou a morte de um piloto-aluno que executava o seu segundo voo solo.

Terminarei com o desbravar dos códigos das mensagens meteorológicas TAF.

FALTA DE PILOTOS COMO RESULTADO DUMA FORMAÇÃO MAIS CUIDADOSA?

Há dias fui confrontado como uma informação que me deixou a pensar se já estaremos a sofrer as consequências das medidas legislativas publicadas no sentido de melhorar a formação dos pilotos de linha aérea. Nessa informação podia ler-se o seguinte:

IATA predicts that over the next 10 years the aviation industry, both commercial and business, will need 17,000 new pilots per year worldwide. Currently global pilot training programmes can train only about 15,000 per year, which would leave a shortfall of over 3,000 new pilots annually.”

Há uns anos um Amigo, especialista em Segurança Aeronáutica, dizia-me que a Segurança Operacional nasce nos Organismos Reguladores. Ao princípio esta ideia fez-me alguma confusão e necessitou ser “trabalhada” para que eu a aceitasse quase como uma verdade axiomática. Hoje em dia penso, igualmente, que a verdadeira paternidade da Segurança Operacional reside nos Organismos Reguladores. Para ser segura dificilmente a Aviação podia cair numa situação de auto-regulação.

Deste modo, depois do acidente ocorrido em 2009 com o Colgan Q400 em Buffalo, N.Y., as autoridades norte-americanas tomaram medidas de fundo para evitar este tipo de riscos. Recorde-se que relativamente ao referido acidente, o NTSB determinou que uma das causas próximas tinha sido a inapropriada acção do comandante perante a activação do “column shaker” (avisador de perda), uma acção que tinha levado à “perda” aerodinâmica, da qual a aeronave não recuperou,.

Para além disto foram considerados, como factores colaterais, os seguintes:

  1. Desprezo dos avisos de “Low Speed”;
  2. Não cumprimento da política de “Sterile Cockpit”;
  3. Incapacidade do comandante para assumir efectivamente o “comando” do voo;
  4. Procedimentos inadequados estabelecidos pela Colgan para aproximações em situações de gelo conhecido.

Como deves estar lembrado, deste acidente resultaram 50 baixas mortais. Isto fez com que a opinião pública reclamasse, uma reclamação que foi escutada pelo próprio Congresso dos USA.

Um factor que o órgão de cúpula legislativa dos USA determinou como contribuinte para o acidente foi a deficiente preparação da co-piloto para o exercício daquelas funções. Deste modo, o Congresso legislou que os novos co-pilotos de linhas aéreas teriam de passar a ter pelo menos 1.500 horas de voo de experiência e uma qualificação de ATPL. Para além disso o Congresso estipulou que parte desta experiência de voo teria de ser obtida em ambiente de linha aérea e não mais em ambiente de voo em aviões ligeiros.

Penso que foi um enorme salto em frente a favor da Segurança Operacional. Contudo, penso, igualmente, que estas novas condições vão ter repercussões enormes no mercado de trabalho dos pilotos de linha aérea. Os custos da formação vão disparar fortemente. Será que as companhias vão poder continuar a pôr-se de fora da problemática e querer que os custos sejam suportados exclusivamente pelos seus pilotos? Veremos o que o futuro reserva.

A FAA estima que a implementação das novas regras (segue a hiperligação para acederes à legislação proposta pela FAA) custe 400 milhões de USD para implementar, durante um período de vinte anos, mas irá gerar um benefício de 900 milhões de USD em termos de acidentes evitados.

A Segurança Operacional custa sempre muito dinheiro. Contudo, o que se ganha é sempre superior aos custos. Como tal estamos perante um saldo positivo.

Por enquanto estas novas regras aplicam-se exclusivamente aos USA. Pergunta-se: por quanto tempo? Q

INSTRUÇÃO, CONTROLO E ACIDENTE – (Parte – IX)

Na semana passada no que se refere ao acidente com o Cessna C150L G-BABB pilotado por um aluno no seu segundo voo solo vimos o que no Relatório de Acidente se diz em relação aos planos de formação do aluno em causa. Hoje vamos debruçar a nossa atenção especialmente naquilo que ao Controlo concerne.

Porém, antes, vamos ver alguns resultados de voos de confirmação de dados realizados por aeronave semelhante após o acidente.

Uma tabela inserta no manual da aeronave diz-nos que com um peso bruto à descolagem de 1.600 lbs (726 kgs), em condições ISA, sem potência, com um CG à frente e 20º de flaps, a aeronave deve entrar em perda a 43 KCAS (knots, calibrated air speed). Se, com a mesma configuração, “prancharmos” o avião 20º, à direita ou à esquerda; a perda já irá ocorrer a 44 KCAS. Porém, se a volta for realizada com 40º de pranchamento, a perda ocorrerá a 49 KCAS.

Infelizmente o Manual nada diz para pesos inferiores nem para condições atmosféricas não-ISA, situação da aeronave no momento do acidente. Não podemos deixar de ter em atenção duas condições gerais:

  1. A velocidade de perda diminui com o peso bruto da aeronave;
  2. A velocidade de perda aumenta com condições de temperatura superiores a ISA.

Esta semana vamos começar a debruçar a nossa atenção sobre diversos aspectos relacionados com a função Controlo.

No Reino Unido a actividade do serviço de Controlo é regulada genericamente pelo “Manual of Air Traffic Services – Part 1” (MATS). Para consultar este documento da CAA (UK) basta seguir a hiperligação. Este manual contém os procedimentos, as instruções e toda a informação necessária a formar a base dos serviços de tráfego no UK. É um documento constituído pela “Part 1” acima referida e pela “Part 2”. Esta última é compilada por cada uma das unidades de serviço de tráfego aéreo e aplica-se a cada uma destas unidades em particular. Portanto, um documento não genérico.

Consultando o Ponto 1.2 do Chapter 1 Air Traffic Services, inscrito na primeira página do Manual of Air Traffic Services pode ler-se, e passo a reproduzir ipsis verbis:

The Manual of Air Traffic Services contains instructions and guidance for controllers providing Air Traffic Services to cater for both routine and many emergency situations.

However, nothing in this manual prevents controllers from using their own discretion and initiative in response to unusual circumstances, which may not be covered by the procedures herein.”

No ponto 1.3 do Appendix E - Communications Technique and Standard Phraseology lê-se:

“A list of standard phrases, under appropriate headings, appears in the attachment to this appendix. The message is to be composed from one or more phrases but the whole phrase must be used. The lists are not exhaustive and controllers will, on occasions, have to use plain language. This must be clear and concise and only used when a standard phrase is not applicable.

Isto é importante pois vem alertar a comunidade para o facto de, nas comunicações aeronáuticas, nem sempre se poder respeitar a fraseologia tipificada. Às vezes tem de se ir mais além para que as mensagens consigam transmitir a informação necessária.

Mais adiante, no parágrafo 5.2.2., pode ler-se um complemento que achamos muito importante pois vem disciplinar as comunicações feitas para aeronaves pilotadas por pilotos estrangeiros com dificuldades na língua inglesa ou por pilotos em instrução. Este complemento diz:

Messages should not contain more than three specific phrases comprising a clearance, instruction or pertinent information. In cases of doubt, e.g. a foreign pilot having difficulty with the English language or an inexperienced pilot unsure of the procedures, the number of items should be reduced and if necessary passed, and acknowledged, singly.’

Por aqui se verifica o cuidado do Regulador no referente à relação entre o Serviço de Controlo e os pilotos-alunos.

De acordo com o MATS – Part 1 a instrução para executar um “Go-Around” deverá ser dada utilizando a seguinte fraseologia:

“Go-around, I say again, go-around (instructions), acknowledge”.

Consultando o MATS – Part 1 sob o título “Flight Priorities” encontramos a seguinte informação que se descreve ipsis verbis:

10.1 Normally requests for clearances shall be dealt with in the order in which they are received and issued according to the traffic situation. However, certain flights are given priority over others and the following table shows the categorisation.”; e

10.2 When two or more flights of different categories request clearance the flight with the highest category shall be dealt with first. Flow control procedures are implemented and actioned by the Central Flow Management Unit. A flow control priority will be allocated automatically on receipt of a flight plan.’

A expressão “categorization” refere-se a situações tais como voos “normais” como aquele conduzido pela aeronave N347DW, um avião com maior prioridade do que um voo de “treino” tal como correspondia o voo do G-BABB.

Porém o MATS Part 1 não contem indicações de prioridades específicas a serem atribuídas ao tráfego com precedência ou a pilotos inexperientes quando em situação de conflito tal como o que se gerou entre o G-BABB e N347DW.

O MATS Part II, promulgado para o Aeroporto de London-Southend, contem os procedimentos específicos para aquele aeródromo.

Vejamos alguns extractos importantes deste documento.

‘CIRCUIT FLYING

By day, circuit flying may be undertaken at the discretion of the Aerodrome controller. Approach control is to be kept fully informed of the number of such aircraft and of any manoeuvre which departs from the normal circuit pattern.

CO-ORDINATION WITH APPROACH CONTROL

Aerodrome control is to keep Approach control updated of the current state of any circuit flying activity.

CIRCUIT TRAINING FLIGHTS

The Aerodrome controller may exercise discretion in respect of the number and variety of aircraft accepted for simultaneous circuit training flights.

Factors to be taken into consideration include the forecast and actual weather, other pending movements including instrument training flights, and whether it is day or night.’

Infelizmente, a versão do MATS Part 2 de Southend, em vigor à data do acidente, não descrevia procedimentos para resolver problemas com pilotos inexperientes tais como os gerados por pilotos em treino e/ou formação.

Porém existia um memorandum, datado de 15 de Abril de 1977 (o acidente ocorreu em 19 de Julho de 2006) publicado pelo SATCO (Senior Air Traffic Control Officer) em que se dizia textualmente o seguinte:

‘…club aircraft (have been) instructed to orbit or fly through final and reposition on opposite base leg. This is not an acceptable practice, particularly with club pilots, and especially those of low hours, in a situation where the aircraft is in approach configuration – ie reduced power, low airspeed and with flaps extended.

In this situation, the pilot should be instructed to go-around. The clubs are very happy for their pilots to get this practice and that they should be encouraged to initiate a missed approach themselves.”

Como se pode ver pelo excerto deste memorandum estava perfeitamente definido que, no caso de um aluno ter de abortar uma aterragem, este deveria ser mandado executar um “go-around” em frente e, nunca, volta de 90º pela esquerda com a aeronave configurada para a aterragem e a 250 ft agl.

Perguntar-se-á porque é que então o ADC (controlador de serviço à “Torre”) entendeu instruir o piloto do Cessna C150L G-BABB a fazer a manobra de viragem à esquerda? O controlador desculpou-se afirmando que não tinha conhecimento de um documento publicado 8 anos antes de ter iniciado as suas funções em Southend. Simples desculpa ou pura ignorância? Não nos cabe a nós julgar.

Quando eu era pequeno o meu Avô costumava contar-me uma fábula que terminava com a seguinte frase: “ – Burro morto, cevada ao rabo!”. O que significa este provérbio? Significa que depois de uma pessoa morrer são escusados laudatórios. (In Dicionário de Expressões Populares Portuguesas, de Guilherme Augusto Simões, Publicações Dom Quixote, Lisboa).

Por isso custa-me saber que no próprio dia 19 de Julho de 2006, imediatamente após se ter dado o acidente com o G-BABB, o aviso contido no tal memorandum de 1997 fosse divulgado novamente pelo Senior Air Traffic Control Officer (SATCO) num novo memorandum dirigido a todos os Air Traffic Control Officers (ATCOs).

Neste memorandum do dia do acidente o SATCO recomendava o seguinte:

‘Light aircraft on or approaching final will have limited manoeuvrability available.

Such aircraft, particularly those with club pilots, and especially those with low hours, are not to be instructed by ATC to:

1) Orbit on final;

2) Fly through final approach and reposition on opposite base leg;

3) Be given any other significant manoeuvres whilst at low level (ie: below 600 ft) in the vicinity of the final approach and base leg positions.

Any of these unacceptable practices could put the pilot in a position where the aircraft is in approach configuration – ie reduced power, low airspeed and with flaps extended, and as a result with very limited safe manoeuvrability available.

If necessary the pilot is to be instructed to goaround using standard MATS PT 1 phraseology. Solo student pilots should be aware of this possible requirement and should be reasonably familiar with the procedure to be followed. Wherever possible, student pilots should be allowed to follow the standard circuit pattern, once making the missed approach.

Turns below 600 ft are always to be avoided unless there is an over-riding safety issue.

The AFS are to be informed before a student is about to commence a ‘First Solo’ exercise, and also at the discretion of the flying club instructors or the duty ATCO for nervous or lowhours students.

With immediate effect, the number of POB for circuit training is to be recorded (on the flight strip).

The number of POB is to be updated whenever there is a change, (ie: due to dropping off of the instructor, etc). Other pertinent information such as ‘1st Solo’ or ‘Tyro’ (to denote low hours student or recently qualified) is also to be added when so informed by pilot or flying club.’

Tudo o que se diz neste documento emitido pelo SATCO é do mais elementar bom senso. Porém, infelizmente, este memorandum não ressuscitou o desventurado piloto-aluno que realizava o seu segundo voo solo e que morreu aos comandos do G-BABB.

Para a semana continuarei com a análise da parte final do RelatórioQ

METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – XVI)

Mais uma semana e prosseguimos a nossa análise dos códigos das mensagens meteorológicas TAF. Esta semana vamos analisar os códigos do:

TIPO DE TEMPO

Pergunta-se: como posso determinar se existe na mensagem uma previsão de condições meteorológica. Vejamos o exemplo seguinte:

TAF

KBLV 051212 14005KT 8000 BR FEW030 WS010/18040KT

QNH2960INS

BECMG 1314 16010KT 3200 -SHRA OVC020 QNH2959INS

TEMPO 1416 21015G30KT 1600 TSRA BKN008CB OVC020

BECMG 1617 29008KT 3200 -RA OVC030 620304

QNH2958INS

BECMG 1819 31012G22KT 9999 NSW SCT040 WSCONDS

520004 QNH2952INS

BECMG 2021 30008KT 9999 SKC QNH2950INS T08/18Z

M01/11Z

O grupo de códigos do tempo – previsão de precipitação e/ou previsão de obstrução da visibilidade – segue o grupo de informação sobre a visibilidade.

Neste exemplo BR indica “mist” (neblina), -SHRA significa “aguaceiros de chuva ligeira”, TSRA significa “trovoada com chuva moderada”, e -RA indica “chuva ligeira”. NSW (no significant weather) é utilizado para indicar que as condições atmosféricas ou condições de obstrução da visibilidade indicadas no grupo prévio não se esperam que venham a acontecer.

A falta de indicação das condições meteorológicas e/ou condições de obstrução da visibilidade significa que não se prevêm condições meteorológicas adversas e/ou condições de obstrução da visibilidade para o período da previsão.

Para realizar a descodificação metódica de um grupo de tempo devemos ter em atenção seis elementos fundamentais (dependendo do tipo de fenómeno, um ou mais podem ser omitidos. Por ordem estes elementos são:

  • Intensidade (símbolo precedendo o código);
  • Proximidade;
  • Descritor;
  • Descrição da Precipitação;
  • Condições de obstrução da visibilidade;
  • Outros.

Para conhecer a tabela completa dos elementos dos grupos de tempo ver a crónica Nº 325 de 2012-07-13.

Para a semana voltaremos ao tema para analisar os códigos das nuvens. Até lá nunca deixes de consultar www.meteo.pt antes da tua viagem. Q

Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.Q Q

Como sempre, um abração do

Fernando

Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve segundo a ortografia do Acordo Ortográfico de 1945.

Meu Caro,

Vou começar esta minha croniqueta chamando a atenção para um facto que recomendo quase todas as semanas: a vantagem de conhecer os relatórios oficiais sobre acidentes. Em minha opinião é nestas fontes que se consegue beber a verdadeira informação que trás conhecimentos que adicionam algo ao nosso airmanship e melhoram a nossa Segurança Operacional. Para ilustrar o ponto vou servir-me de um acidente que analisámos a semana passada.

Como tema intermédio vou continuar a analisar contigo, meu Caro, o acidente com o Cessna C150 G-BABB no qual faleceu um jovem no seu segundo voo solo. Pode parecer que eu estou a levar este tema à exaustão mas o Relatório do AAIU é tão rico em ensinamentos que o aproveito para demonstrar a necessidade do perfeito funcionamento do “Quadrado da Confiança” – Piloto/Manutenção/Controlo/Regulador – sob pena de se ferir gravemente a Segurança Operacional.

Terminarei com a análise e desencriptação dos códigos das mensagens TAF.

A VANTAGEM DO CONHECIMENTO DOS RELATÓRIOS ORIGINAIS DOS ACIDENTES

Para se tirar um real proveito das matérias sobre Segurança Operacional é necessário fazer uma leitura não acéfala das mesmas. Isto, sob pena de não retirarmos ensinamentos ou, pior do que isso, criarmos factos imaginários na nossa cabeça. Afinal nunca sabemos quando, “lá em cima”, não vamos ter de fazer utilização de conceitos que nos podem retirar de situações complicadas. Assim, quer a falta de conceitos, quer conceitos errados, podem não nos ajudar a ultrapassar potenciais obstáculos da nossa actividade de Pilotos.

A semana passada resolvi partilhar contigo a problemática da gestão errada do combustível. Para abordar este assunto, recorrente nas minhas croniquetas, resolvi fazer recurso aos últimos dados disponíveis na minha biblioteca. Assim, consultei o último Relatório Nall (2010). Este Relatório, publicado pelo Air Safety Institute da AOPA USA é, sem dúvida, uma referência em questões de Segurança. Como tal digno da nossa total confiança.

Assim, o case study que ilustrava a matéria no Relatório Nall reportava o acidente com um Beechcraft C23 Sundowner que analisámos a semana passada.

Lendo o texto do estudo de caso somos informados que as “Causas Prováveis” do acidente são:

The pilot’s improper placement of the fuel selector valve during takeoff, and his failure to maintain adequate airspeed following a total loss of engine power resulting in an inadvertent stall.

Termina o Air Safety Institute dizendo:

The first step in fuel management is familiarity with the aircraft’s systems. The Beech C23’s fuel selector has a long handle used to turn the valve that is opposite the short indicator marked with a white arrow that shows the position chosen (left tank, right tank, or one of the two “OFF” positions opposite them). In many other popular models, including comparably sized Cessna and Piper singles, the long arm of the selector handle indicates the tank selected. Assuming that the pilot did verify the selector position before takeoff, his lack of make-and-model experience (and perhaps of systematic check-out training) may have been the crucial link in the accident chain.

Todos estes factos apresentados no Relatório Nall são lógicos e coerentes. Porém estava-me a escapar um pequeno grande pormenor: como é que um avião consegue descolar com o motor à potência máxima, com a válvula de combustível na posição “OFF” por erro de manobra do piloto?

O motor do avião acidentado era um Lycoming O-360-A4J de 180 hp que, a 100% da potência máxima, consome 14,5 gal/h (54,8 l/h). Partindo do pressuposto que a cuba do carburador (a única zona do circuito de combustível que se mantém sempre à pressão atmosférica e, como tal, não é influenciada pelo facto da válvula de combustível estar fechada) terá uma capacidade de 0,25 l, o motor deveria parar ao fim de 16 s.

Tendo em atenção este dado, o avião ter conseguido descolar só poderia ter acontecido por um acto suicida do piloto que teria fechado o combustível já em plena corrida de descolagem. Como este facto me parecia extremamente inverosímil, deveria de ter havido qualquer outro factor.

Deste modo, resolvi pesquisar outra fonte de informação. E qual a informação mais fiável numa situação destas? Sem sombra de dúvida a versão original do Relatório de Acidente do NTSB (NTSB ACCIDENT NO. ERA10FA150). Para acederes a este Relatório basta seguires a hiperligação. E lá estava espelhado o problema que tinha levado o motor a funcionar tanto tempo antes de ter parado definitivamente:

“...The unit was bench tested as received which revealed it failed due to excessive leakage from the “out” port when tested in both “off” positions at approximately 5.0 psi. The leakage amount was noted to be 500 mL a minute (maximum allowed leakage is 2 cc a minute). Each respective inlet port was then separately pressurized with the fuel selector positioned to the opposite tank; fuel leakage was noted from the outlet port. The fuel selector was then disassembled and the surface finish of the sealing side of the selector plate was 24 microfinish (specification is 4 microfinish). Inspection of the surface revealed multiple sets of full diameter scratch marks. All new o-rings were installed and the unit was re-assembled and returned to the test bench. No leakage was noted after replacement of the o-rings.”

O piloto cometeu um erro mas não era um vulgar suicidário. Antes, vítima de uma aeronave avariada e com deficiente manutenção. Aliás, o que aconteceu neste acidente não foi caso virgem. Já antes tinha ocorrido um acidente com um outro Beech C23 resultado dum problema do mesmo tipo com a válvula selectora. Ver NTSB Report MIA00FA177 (basta seguir a hiperligação). 

Neste último relatório do NTSB, em relação à válvula selectora, lê-se o seguinte:

“Postaccident bench testing of the fuel selector valve revealed it failed due to excessive leakage from the "out" port when tested in both "off" positions at approximately 2 and 5 psi. All detents could be felt. The valve was placed in the same make and model airplane as the accident airplane and failed to secure fuel to the engine. A copy of the report from the airplane manufacturer representative who witnessed the engine run test is an attachment to this report. Trouble shooting of the fuel selector valve determined that the leakage was due to the O-rings; replacement of the O-rings resulted in no fuel leakage when tested for a 1-minute period.”

Meu Caro, neste tema pretendi explicar duas coisas distintas:

  • A necessidade de uma leitura muito atenta e criteriosa dos Relatórios de Acidente divulgados. Só assim poderemos aprender e reter conhecimentos e experiências que nos podem ser úteis em situações anormais da nossa pilotagem;
  • A necessidade da consulta dos documentos mais completos e credíveis de modo a não chegar a conclusões menos correctas.

Estes os conselhos do Fernando. Q 

INSTRUÇÃO, CONTROLO E ACIDENTE – (Parte – VII) 

Ao longo de diversas semanas temos vindo a estudar um acidente ocorrido no aeroporto de London-Southend com um Cessna C150, G-BABB de matrícula, com um piloto-aluno aos comandos, no seu segundo voo solo. Este, quando se encontrava na “Final Curta” (a menos de 1 NM da cabeceira da pista 06), é instruído a fazer uma volta de 90º pela esquerda, a fim de deixar passar um tráfego mais rápido que também pretendia aterrar em Southend. Na minha crónica da semana passada pudemos analisar as obrigações funcionais, quer do ADC (Aerodrome Controller), quer do APC (Approach Controller). Tomámos, ainda, conhecimento dos testemunhos de diversas pessoas que presenciaram o acidente.

Vamos, agora, ver a informação registada a partir do radar de Stansteed. Os registos fornecidos pelo National Air Traffic Services para o Cessna C150 G-BABB começaram às 1521:11 hrs (sem informação de altitude).


Localização radar das aeronaves registada a partir do aeroporto de Stansteed. Figura inserta no relatório do AAIB.

Os ecos radar registados às 1527:09 hrs confirmam que, a esta hora, o G-BABB se encontrava já a 0,82 NM do “aiming point” da pista 06, momento em que inicia a sua volta de 90º pela esquerda. Se a aeronave estivesse a fazer a “Final” com a tradicional ladeira de 3º, no momento em que iniciou a volta para a esquerda dever-se-ia encontrar a cerca de 250 ft de altura. No mesmo momento o Piper Malibu N347DW encontrava-se a 1,20 NM da cauda do Cessna.

Depois da instrução para virar à esquerda ainda foram registados 7 ecos que mostram o G-BABB já com um rumo noroeste.

Devido à precisão dos registo do sistema de radar, não foi possível calcular uma velocidade terreno precisa para a parte final do voo. Contudo, depois de aplicar a velocidade do vento reportada ao N347DW – 070º/09 kt – às velocidades calculadas a partir dos ecos radar, foi possível estabelecer que a velocidade média de ar era 60 kts na fase da ladeira da “Final” e de 47 kts quando o Cessna já rumava com uma direcção noroeste.

Notemos que a “Clean stall” do Cessna C150 é de 48 KIAS e a “Flap stall” é de 42 KIAS. Como podes ver o G-BABB estava a voar na borda da velocidade de perda. Se a isto juntares a baixíssima altura a que se encontrava a aeronave no momento em que começou a voltar para a esquerda, percebes facilmente que o Cessna se encontrava numa situação impossível de executar por um aluno com 15 horas de experiência de voo. Daí o acidente se desenvolver como uma consequência natural.

Vejamos agora o que nos diz o Relatório sobre o pessoal interveniente no acidente: o piloto-aluno, o ADC (Aerodrome Controller) e o APC (Approach Controller).

Como já referimos atrás por diversas vezes, o piloto-aluno tinha 15 horas de experiência de voo e encontrava-se a executar o seu segundo voo solo.

Em relação ao ADC (Aerodrome Controller) o relatório diz-nos ipsis verbis o seguinte:

“The ADC on duty at the time of the accident gained his initial Aerodrome Instrument Controller rating in 2000 and an Approach Control Procedural rating in 2001. He completed an Approach Control Surveillance rating in 2004 and started work at Southend Airport, in 2005. At the time of the accident his qualifications were current and appropriate to his duties. The ADC also possessed a United Kingdom PPL issued in 1996.”

Estamos assim perante um controlador com seis anos de experiência profissional à qual se deve acrescer a sua experiência de piloto o que lhe deveria dar a noção das manobras passíveis e não passíveis de mandar executar.

Em relação à APC (Approach Controller) o relatório diz-nos o seguinte:

“The APC had worked at Southend throughout her career as an air traffic controller. She gained her initial Aerodrome Instrument Controller rating in 1998, an Approach Control Procedural rating in 2001 and an Approach Control Surveillance rating in 2004. She was also an “On the Job Training Instructor”, authorised to supervise other controllers in a live air traffic environment. The APC also possessed a United Kingdom PPL issued in 1993.”

No caso da APC temos uma controladora com oito anos de experiência profissional e igualmente habilitada com a qualificação de Piloto Particular de Avião. Salvo melhor opinião, esta controladora demonstrou maior sageza pois ainda propôs ao ADC instruir o Piper Malibu para fazer uma manobra de atraso na aproximação de modo a deixar o Cessna C150 aterrar sem quaisquer riscos de colisão entre aeronaves.

Na próxima semana iremos analisar, com base no Relatório do AAIU, o sistema de treino a que deveria ser sujeito o aluno, de acordo com as regras em vigor ao tempo no UK. Até lá analisa bem os pormenores que descrevemos atrás. Eles são muito importantes para a compreensão do acidente. Q

METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – XIV)

Continuando a nossa análise dos códigos das mensagens TAF vejamos, hoje, a desencriptação de mais um grupo de códigos.

VENTO

Uma das informações muito importantes para o Piloto é o conhecimento do vento – intensidade e direcção – previsto para os aeródromos que se prevê incluir na viagem que vamos realizar. Vejamos um exemplo de uma mensagem TAF para analisarmos a codificação do “Vento”:

TAF

KBLV 051212 14005KT 8000 BR FEW030 WS010/18040KT QNH2960INS

BECMG 1314 16010KT 3200 -SHRA OVC020 QNH2959INS

TEMPO 1416 21015G30KT 1600 TSRA BKN008CB OVC020

BECMG 1617 29008KT 3200 -RA OVC030 620304 QNH2958INS

BECMG 1819 31012G22KT 9999 NSW SCT040 WSCONDS 520004 QNH2952INS

BECMG 2021 30008KT 9999 SKC QNH2950INS T08/18Z M01/11Z

Imediatamente a seguir ao grupo data/hora encontramos um grupo de dígitos seguidos das letras KT. Este grupo indica-nos a velocidade de vento prevista.

Os três primeiros dígitos dentro do grupo “Vento” indicam-nos a direcção verdadeira (true direction) aproximada aos 10º mais próximos da direcção da qual soprará o vento. O quarto e o quinto dígito indicam a velocidade constante com que soprará o vento (expressa em knots).

Se forem esperadas rajadas, o segundo e o terceiro dígito a seguir à letra G indicativa de rajada (gust) correspondem à velocidade máxima do vento medida durante uma janela de 10 minutos.

Descodifiquemos o exemplo precedente.

Neste exemplo, 14005KT, 16010KT, 21015G30KT, 29008KT, 31012G22KT, e 30008KT são os diferentes grupos direcção/intensidade do vento previsto para o período de validade da mensagem TAF.

No primeiro grupo “Vento”, indica-se que se prevê que o vento sopre de 140 (verdadeiros) com uma velocidade constante de 05 knots. Não se prevêem rajadas.

No terceiro grupo “Vento”, indica-se que se prevê que o vento sopre de 210 (verdadeiros) com uma velocidade constante de 15 knots com rajadas de 30 knots .

Nunca te esqueças de reparar se o grupo ”Vento” prevê rajadas. Este dado é de grande importância se a direcção da qual sopra o vento não for enfiada com a pista. Tem cuidado pois a rajada pode ultrapassar os limites máximos demonstrados para a tua aeronave. Um conselho do Fernando. Q

Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ

Como sempre, um abração do

Fernando

Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve segundo a ortografia do Acordo Ortográfico de 1945.

Meu Caro,

Esta semana, para além da divulgação dos “Amendments” publicado pela NAV Portugal, vamos analisar a problemática dos acidentes motivados pela deficiente operação do Sistema de Combustível e continuaremos a fazer a análise detalhada do acidente acontecido em London-Southend com um Cessna C150.

A seguir filosofaremos um pouco sobre a necessidade de não nos deixarmos ofuscar pelos avanços tecnológicos deixando para trás os princípios básicos da Aviação. Acabaremos, como tem sido nosso hábito nas últimas semanas, com uma análise dos códigos das mensagens TAF.


A NAV Portugal anunciou esta semana dois Amendments um dos quais de especial interesse para quem faz voos VFR.

Trata-se do conjunto AMDT 006-2012 indicado a seguir.

AMDT 006-2012 Part I

AMDT 006-2012 Part II

AMDT 006-2012 Part III

AMDT 006-2012 Part IV

Para fazeres o download de cada uma das partes basta seguires as hiperligações.

O outro Amendment é o AIRAC AIP AMDT 004/12 efectivo a partir de 18 de Outubro. Podes encontrá-lo em http://www.nav.pt/ais/ .

O conhecimento da Informação Aeronáutica é uma peça fundamental para a Segurança Operacional. Nunca te esqueças de, sempre que fores realizar um voo, consultar a informação publicada pela NAV Portugal. Um conselho do Fernando. Q

A GESTÃO DE COMBUSTÍVEL

Regularmente abordamos o tema da Gestão de Combustível numa aeronave e o perigo que pode acarretar para a Segurança Operacional um erro nessa mesma gestão.

Estando dois terços da Aviação Geral dentro dos USA, as estatísticas dos acontecimentos aeronáuticos naquele País representarão certamente aquilo que se passa para o universo daquela Aviação. Consultando o último Relatório Nall – o 22º da ordem e referente a 2010 – verifica-se que houve um declínio de 50%, em 10 anos, dos acidentes devidos à má gestão do combustível durante o voo, de aeronaves de GA.

Na imagem seguinte podemos ver a evolução do número de acidentes no período entre os anos de 2001/2010. Este tipo de acidente, no ano de 2010, correspondeu a 8% do total de acidentes da GA (dentro dos USA). Sendo um erro essencialmente humano dá que pensar.


No gráfico, a cinzento, indica-se os acidentes não-fatais. A laranja indica-se o número de acidentes fatais.

Mas façamos uma análise mais fina do universo dos acidentes provocados por deficiente gestão do combustível. Para nos auxiliar vou-me servir de um gráfico extraído do Relatório Nall. No gráfico seguinte a coluna A indica o número de acidentes devidos a deficiente “Planeamento de Voo”. A coluna B indica o número de acidentes devidos a erro de “Manobra do Sistema de Combustível”. Finalmente a coluna C indica o número de acidentes devidos a problemas de “Contaminação do Combustível”. As duas primeiras colunas representam, essencialmente, erros humanos. A terceira, má qualidade do combustível.


Coluna A – Acidentes de Planeamento de Voo; Coluna B – Acidentes por Manobra do Sistema de Combustível; C – Acidentes por Contaminação do Combustível.

Analisando os acidentes na perspectiva da complexidade do sistema de combustível não se encontra correlação entre os ocorridos com aeronaves com sistemas complexos e os ocorridos com aeronaves com sistemas simples. Na realidade, cerca de 70% dos acidentes ocorreram com aeronaves monomotores de trem fixo, aquelas com os sistemas mais simples.

Para ilustrar a problemática da deficiente gestão do combustível vou-me servir de um relatório de acidente do NTSB. Trata-se do relatório NTSB ACCIDENT NO. ERA10FA150 que poderás consultar directamente seguindo a hiperligação. Como sempre, recomendo-te muito vivamente a leitura da versão original e completa do documento.

O acidente descrito no Relatório ocorreu com um avião Beechcraft C23 Sundower semelhante ao da fotografia seguinte. Trata-se de uma aeronave não vulgar em Portugal. Provavelmente não haverá mesmo nenhuma no Registo Aeronáutico Nacional.


Beechcraft C23 Sundowner

O acidente analisado no relatório do NTSB descreve-se em poucas linhas.

Ao descolar do aeródromo de Winter Haven’s Gilbert um Beechcraft 23 ultrapassou o extremo da pista a uma altura de cerca de 150 ft naquilo que parecia ser uma normal descolagem à Vy, a velocidade de “best rate of climb”. Porém, cinco segundos depois, a uma altura estimada entre 200 e 300 ft acima da pista, o motor parou sem causa aparente. De imediato a atitude do avião diminuiu cerca de cinco graus, tendo de seguida a aeronave iniciado uma volta pela direita com um pranchamento de 30 graus. Teria o piloto iniciado os “180 da morte”? Uma pergunta que ficará sem resposta pois ele e o seu passageiro pereceram no acidente.

Inspeccionados os destroços da aeronave os Investigadores do NTSB não encontraram qualquer anomalia no motor que indicasse uma avaria pré-embate com o solo. Por outro lado, cada depósito continha, ainda, 22 galões de combustível, o que levaria a supor que o motor não teria parado por falta de combustível. Porém, a válvula selectora de combustível foi encontrada na posição “OFF”. Perguntar-se-á: como é que o avião descolou com a válvula na posição “OFF”?

A resposta foi encontrada numa operação de manutenção mal executada.

Vejamos: a FAA publicou a Airworthiness Directive (AD) 85-05-02 para oficializar o Beechcraft Mandatory Service Bulletin 2053 que obrigava à instalação de uma guarda para prevenir que a válvula de combustível fosse inadvertidamente passada para a posição “OFF”. Dizia essa AD:

Modify the fuel selector guard by incorporating the Selector Stop, Part Number 169-920041-9 and appropriate decal as described in Beechcraft Mandatory Service Bulletin No. 2053 dated February 1985, or Beechcraft Service Instructions No. 1095, Revision 1.

Marcação obrigatória na válvula, inserta no Mandatory Service Bulletin 2053:

A citada AD obrigava ainda a colocação de marcas específicas na sede da válvula tal como se indica na figura anterior. Porém esta marcação nunca foi feita.

Para complicar a questão, os Investigadores verificaram que devido às folgas na válvula selectora, esta deixava passar combustível suficiente para manter o motor a trabalhar às 2.250 rpm, pelo menos durante dois minutos. Foi ainda verificado que bastava substituir os vedantes da válvula – o-rings no caso vertente – para que esta deixasse de ter a fuga detectada.

Durante os trabalhos da investigação do acidente a mecânica que tinha realizado a última inspecção anual confirmou que tinha seguido o mesmo checklist que era utilizado para as inspecções de 100 horas. Esta TMA confirmou que tinha verificado o funcionamento correcto da válvula selectora, porém com o motor parado. Não tinha avaliado o funcionamento da selectora com o motor em funcionamento para se certificar que este parava quando a válvula fosse colocada na posição “OFF”.

Tendo em atenção os factos investigados o NTSB concluiu que a causa provável do acidente ficou a dever-se a:

a)    Uma manobra errada da válvula selectora de combustível por parte do piloto ao iniciar a descolagem;

b)    A incapacidade do piloto em manter a velocidade aerodinâmica adequada após a falha total de potência. Desta resultou uma entrada em perda inadvertida.

Contribuiu ainda para o acidente o facto de a Manutenção não ter detectado:

a)    A incapacidade da válvula selectora, uma vez na posição “OFF”, cortar rapidamente o funcionamento do motor; e

b)    A falta das marcas obrigatórias na sede da válvula selectora, nem no acto de montagem da protecção, nem nas inspecções de 100 horas.

Por muitas vezes, nas minhas croniquetas, tens visto referência ao “Quadrado da Confiança”. É um paradigma geral do funcionamento da Aviação. Para que esta funcione em segurança é necessário que cada um dos vértices deste quadrado - a Pilotagem, a Manutenção, o Controlo e a Regulação – tenham confiança no trabalho dos restantes. Salvo melhor opinião, é impensável que cada um vá controlar as actividades dos restantes. Porém, se eu ainda exercesse os privilégios das minhas licenças, era capaz de pôr mais um ponto nos meus checklists: verificação do correcto funcionamento da válvula selectora. Passaria a verificar ao fim de quanto tempo o motor parava quando seleccionasse a válvula para a posição “OFF”. Isto, porque é muito desagradável ficar sem motor no momento mais crucial da descolagem. Isto é a rejeição pura e dura do “Quadrado da Confiança” uma posição que simplesmente não perfilho.

Este acidente vem mostrar, mais uma vez, quão importante é a manobra correcta do Sistema de Combustível e quão importantes são os trabalhos de Manutenção.

Neste acidente o único vértice que funcionou correctamente foi o Regulador, que publicou legislação para ultrapassar uma deficiência de concepção do Sistema de Combustível. Isto porque, na fase de voo em que se deu o acidente, o Controlo não tinha qualquer influência sobre o voo. Infelizmente, a Manutenção e o Piloto falharam. Alinharam-se os “buracos do Queijo Suiço” deixando passar o “acidente”. E assim pereceram duas pessoas. Cumpre sempre o mais correctamente com as tuas funções no momento. Um conselho do Fernando. Q

FILOSOFANDO SOBRE O RETORNO AOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO VOO

Um instrutor sénior de voo, Tony Jonhstone, lançou uma questão que me parece extremamente pertinente.

Jonhstone interroga-se se os pilotos podem considerar-se seguros – entenda-se os pilotos + os seus passageiros – mesmo dispondo de toda a aviónica e sistemas de alta tecnologia actuais. Este instrutor defende, e eu subscrevo, que os pilotos se deveriam preocupar um pouco mais com os princípios básicos da pilotagem.

Queres um exemplo? Para que servem os mais sofisticados sistemas de detecção do fenómeno da perda aerodinâmica se, depois, os pilotos metem manche à barriga para cortar o afundamento da aeronave?

Às vezes filosofar também faz bem. Pode despertar-nos para a realidade e não nos deixarmos intoxicar pela Tecnologia! Q

INSTRUÇÃO, CONTROLO E ACIDENTE – (Parte – VII)

Ao longo de várias crónicas temos vindo a analisar um acidente ocorrido com um Cessna C-150, pilotado por um piloto-aluno, no aeroporto de London-Southend. Como particularidade o aluno estava na “Final Curta” quando realizava o seu segundo voo solo e foi instruído pelo ADC para voltar 90º pela esquerda para deixar passar um tráfego mais rápido.

Na figura seguinte podemos apreciar a posição relativa entre as duas aeronaves quando o piloto do G-BABB – o Cessna 150 – foi instruído para voltar saindo da “Final”. Sendo o N347DW – um Piper PA46T Malibu Meridian – uma aeronave de alta performance que fazia a sua aproximação com uma velocidade superior a 120 kts, contra os 60 kts do Cessna C150, poder-se-á perguntar se será prudente deixar aproximar as duas aeronaves até uma distância de 1,1 NM. É que, com esta diferença de velocidades, a distância entre as aeronaves - 1,1 NM – é absorvida em 60 segundos. Não será este um intervalo demasiado reduzido? Que responda quem souber.

Distância entre o N347DW e o G-BABB no momento em que este é instruído para voltar 90º pela esquerda: 1,1 NM. A cabeceira da pista de Southend encontra-se no canto superior direito da fotografia.

Para percebermos o contexto em que se deu o acidente passemos à análise das comunicações de aeródromo e estrutura de controlo.

Na altura em que ocorreu o acidente o ATC (Air Traffic Control) no aeroporto de London-Southend utilizava duas frequências. O ADC (Aerodrome Controller) utilizava uma frequência cujo callsign era Southend Tower e destinava-se a fornecer os serviços de controlo de aeródromo. O APC (Approach Controller) utilizava outra frequência para fornecer os serviços de controlo de aproximação. Este último tinha o callsign Southend Radar.

Para se perceber quem era quem e quais as suas obrigações vejamos o que dizia a Parte I do MATS (Manual of Air Traffic Services). Este documento definia as responsabilidades do controlo de aeródromo da seguinte maneira (não traduzo para não retirar qualquer pormenor fundamental):

‘Aerodrome control is responsible for issuing information and instructions to aircraft under its control to achieve a safe, orderly and expeditious flow of air traffic and to assist pilots in preventing collisions between:

a) aircraft flying in, and in the vicinity of, the aerodrome traffic zone;

b) aircraft taking off and landing;

c) aircraft moving on the apron;

d) aircraft and vehicles, obstructions and other aircraft on the manoeuvring area.’

Segundo o mesmo documento – MATS – este define para a Aproximação as seguintes obrigações:

‘Approach control shall co-ordinate with aerodrome control:

a) Aircraft approaching to land; if necessary requesting clearance to land.

b) Arriving aircraft which are to be cleared to visual holding points.

c) Aircraft routeing through the traffic circuit.’

Para se perceber como é que os dois controladores se coordenavam entre si, o Relatório diz-nos que ambos trabalhavam na mesma sala, à distância de 3,5 m um do outro, no edifício da Torre do aeródromo. A sua coordenação era feita através de um intercomunicador que injectava as comunicações nos headsets de cada um sem que esta coordenação fosse ouvida nas respectivas frequências.

Durante as averiguações o Controlador de Aproximação referiu que era vulgar o LTCC (London Terminal Control Centre) avisar Southend para o tráfego em aproximação quando este já estava muito próximo do aeródromo. Situação que aconteceu no caso do Piper N347DW. Os vários buracos do “Queijo Suiço” a alinharem-se para potencializarem o acidente.

Vejamos agora o que testemunharam diversas pessoas posicionadas, quer no aeródromo, quer na zona onde a aeronave se despenhou.

Todos eles estranharam a colocação do avião em relação ao circuito de aeródromo já que aquele seguia um rumo Norte ou Noreste quando deveria estar a fazer a final para a pista 06 de Southend. Uma das testemunhas afirmou que:

“... that (G-BABB) it had a “substantial nose-up attitude”, suggesting that “the pilot was attempting to maintain lift at a low airspeed... the aircraft looked like it was going to stall”.

O próprio piloto da aeronave que estava igualmente em aproximação para aterrar – o Piper Malibu N347DW – confirmou o seguinte, junto dos investigadores do acidente:

He recalled thinking that the spacing was going to be “pretty tight” if the Cessna was going to make a full stop landing because his aircraft had a faster approach speed. He estimated the separation to be between 1 and 1.5 nm.”

A mesma ideia já eu próprio a expendi acima.

Ouvido o SATCO (Senior Air Traffic Control Officer) de Shoutend corroborou que:

“... he saw the aircraft turn northbound, in a position slightly north of the normal final approach track, adding “it seemed very low and I had the impression that the flaps were still extended”

Disse ainda que:

“... the aircraft “had the nose pointing as if to climb; it was noticeably having difficulty in attaining any significant rate of climb”.

Tudo isto contribui para se pensar que o piloto-aluno – um aluno com pouquíssima experiência e no seu segundo voo solo - quando instruído para fazer uma manobra para cuja execução ele ainda não tinha a necessária experiência, atrapalhou-se, não recolheu os flaps para poder ganhar velocidade e a melhor solução que encontrou para não deixar o avião “cair” foi puxar-lhe o nariz para cima, induzindo uma perda.

A matéria que descrevemos esta semana já contém pormenores que nos põem a pensar sobre o que aconteceu realmente. Continuaremos na próxima sexta-feira com a análise deste Relatório com o qual se pode aprender muito.

METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – XIII)

Prosseguimos hoje com a revisão dos códigos das mensagens TAF’s, essas mensagens que nos permitem ter uma noção das condições meteorológicas futuras num dado aeródromo.

HORA E TIPO DAS ALTERAÇÕES METEOROLÓGICAS EXPECTÁVEIS

Como é que se determina a hora e o tipo de alterações meteorológicas expectáveis dentro do período de validade do TAF? Vejamos o exemplo seguinte:

TAF

KSTL 051130Z 051212 14008KT 5SM BR BKN030

WS010/18025KT

TEMPO 1316 1 1/2SM BR

FM 1600 16010KT P6SM NSW SKC

BECMG 2224 20013G20KT 4SM SHRA OVC020

PROB40 0006 2SM TSRA OVC008CB

BECMG 0608 21015KT P6SM NSW SCT040

O código TEMPO indica uma condição meteorológica temporária. No exemplo anterior o código TEMPO 1316 1 1/2SM BR significa:

Condições meteorológicas temporárias entre 1300Z e as 1600Z de 1,5 statute miles de visibilidade em neblina. Só as condições meteorológicas para as quais se espera variações são indicadas nos grupos TEMPO.

O código FM significa desde (“from”) e indica uma rápida variação das condições meteorológicas na qual todos os grupos de dados na linha anterior são alterados. No exemplo em análise FM 1600 significa a partir das 1600Z as condições passarão a ser 16010KT P6SM NSW SKC.

O código BECMG significa “tornando-se” ou “variando gradualmente” as condições meteorológicas, tornando-se o grupo predominante no fim do tempo indicado.

Assim, no exemplo anterior, BECMG 2224 significa tornando-se entre as 2200Z e as 2400Z 20013G20KT 4SM SHRA OVC020.

O código PROB40 0006 representa que existe uma probabilidade de 40% de ocorrerem as condições meteorológicas associadas ao vento, à visibilidade e às condições de nuvens no céu.

No exemplo anterior PROB40 0006 2SM TSRA 0VCOO8CB significa “40% de probabilidade de entre as 0000Z e as 0600 a visibilidade ser de 2 statue miles em situação de trovoadas ligeiras, com tecto 008 de nuvens cumulonimbus.

Para a semana que vem iremos ver as codificações do “Vento” nas mensagens TAF. Q

Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ

Como sempre, um abração do

Fernando

Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve segundo a ortografia do Acordo Ortográfico de 1945.

 

Meu Caro,

Há umas crónicas atrás debati contigo a problemática do rearranque do motor em altitude. Uma situação que te pode surgir em resultado de uma avaria ou numa situação muito mais prosaica: a má selecção dos tanques de combustível. Esta análise era feita em relação aos motores alternativos com ignição por faísca. Os chamados motores de combustão a volume constante, o universo mais largo. Porém, actualmente, começa-se a utilizar motores do tipo Diesel, os chamados motores de combustão a pressão constante. Porque estes motores têm as suas especificidades próprias, a EASA veio fazer um alerta sobre as particularidades do arranque em altitude. É isso que iremos analisar no primeiro tema desta croniqueta.

Como segundo tema proponho-te que continuemos a analisar o acidente ocorrido em London-Southend com um C150 pilotado por um piloto-aluno que executava o seu segundo voo solo. Um tema interessante quer para pilotos quer para controladores.

Terminaremos com a descodificação das mensagens TAF.

REARRANQUE DE MOTORES DIESEL EM VOO

Debatemos em crónicas anteriores o problema do rearranque dos motores em voo. Contudo, referia-me sempre a motores alternativos de ignição por faísca, os chamados motores em que a combustão se faz a volume constante. Porquê? Porque este tipo de motores representa o grande universo de fonte de energia na Aviação Geral. Contudo, existem aviões equipados com motores diesel, os motores em que a combustão se faz a pressão constante.

Será isto importante para a manobra de rearranque do motor em voo? Sim. Sim ao ponto da EASA ter emitido um documento específico sobre o rearranque dos motores diesel em voo. Para acederes ao documento original – “Proposed Special Condition Applicable to Self-Ignition Piston Engines (Diesel Engines)” – basta seguires a hiperligação.

Neste documento aquele Organismo Europeu começa por nos informar que:

“In service experience of self-ignition diesel piston engines has shown that unintended flame-out events could occur after prolonged descent at idle power setting and low outside air temperature conditions.” 

Por outras palavras, por arrefecimento prolongado dos cilindros do motor, a combustão pode deixar de se fazer e o motor “apaga-se”. Contudo:

“The occurrence may not be immediately detectable by the pilot because the engine is still rotating due to the wind milling effect of the propeller in single engine installations.”

Em que é que isto pode afectar a Segurança Operacional?

“Once the flame-out has occurred, the engine is not responding anymore when the pilot commands a power increase.”

Efectivamente o piloto acelerar o motor e não ter potência equivale, mais ou menos, a este estar a pilotar um planador só que numa aeronave que não foi construída com estas características. Numa situação destas a Segurança estará certamente em risco pois o acidente pode ser inevitável.

Assim, EASA considerou que:

“... these events constitute a potential unsafe condition and Airworthiness Directives were issued when necessary to address this problem with already certified diesel piston engines.”

Tanto mais que:

“The CS-E 240 »Ignition« paragraph ensures that the ignition system has a very high reliability. In combination with CS-E 50 »Engine Control System«, this gives confidence that a piston engine will not stop functioning in the declared flight envelope as long as the engine operating procedures are followed.”

Existe porém um problema. O legislador esqueceu-se de que:

“The ignition system also provides the ignition source for in-flight restart. But this paragraph is applicable to spark-ignition engines only. There is no specific requirement for self-ignition diesel engines.”

Como tal, temos um vazio na certificação das aeronaves equipadas com os chamados motores em que a combustão se faz a pressão constante.

Para colmatar tal buraco legislativo a EASA propôs que:

“The engine design and operating procedure must provide continued ignition capability under the intended operating conditions established in compliance with CS-E 40(d). This must be substantiated considering the fuel with the lowest cetane number by appropriate tests or other evidences. The cetane number of the fuel considered for the demonstration will be recorded in the Engine Type Certificate Data Sheet”

Permite-me uma nota pois, provavelmente, haverá alguns dos meus Caros que desconhecem o que significa o “Número de Cetano”.

O número de cetano, ou CN (cetane number), é a medida da qualidade da combustão dos vários géneros de combustível diesel em motores de ignição por compressão de ciclo Diesel. É um dos componentes mais importantes para o apuramento da qualidade global desta variedade de combustíveis.

Se quisermos fazer uma comparação com as gasolinas poderíamos dizer que o “Número de Cetano” está para os combustíveis diesel como o “Índice de Octano” está para as gasolinas.

Mas o que é o cetano? O cetano, também designado como hexadecano, é um composto químico em forma de cadeia aberta não ramificada da família dos alcanos que entra muito facilmente em ignição quando é comprimida.

Estrutura molecular do hexadecano composta por 16 átomos de carbono e 34 átomos de hidrogénio.

Por sua vez, o “Número de Cetano”(CN’s) é uma medida do atraso da ignição do combustível, isto é, o período de tempo entre o início da injecção e o início da ignição do mesmo. Em motores a diesel, os combustíveis com números de cetano mais altos têm períodos mais curtos de atraso da ignição do que combustíveis com números mais baixos. Estes valores são usados somente para os destilados relativamente leves de tipo diesel. A medição de óleos (residuais) mais pesados é feita com duas outras escalas, o CCAI (Calculated Carbon Aromaticity Index) e o CII (Calculated Ignition Index), baseadas sua na densidade e viscosidade cinemática.

Os motores diesel funcionam bem com combustíveis que tenham CN’s entre 40 e 55. Os combustíveis com números mais elevados e que possuem, por isso, atrasos mais reduzidos da ignição, dão mais tempo ao motor para que este complete a combustão. É por isso que os motores diesel de alta velocidade operam de forma mais eficiente com números de cetano elevados. Não há qualquer vantagem, em termos de desempenho ou de redução de emissões, acima de 55 valor após o qual, a performance do combustível atinge um limite.

Por tudo isto, Meu Caro, se pilotas aviões com motor diesel, tem em atenção os pormenores que se descrevem neste tema. Nunca queiras ficar sem potência quando menos esperares. Um conselho do Fernando. Q

INSTRUÇÃO, CONTROLO E ACIDENTE – (Parte – VI)

Neste mesmo tema que temos vindo a abordar há várias crónicas, na semana passada, vimos como é que um piloto-aluno, numa fase incipiente de instrução, pode ser levado ao acidente, neste caso, mortal.

Se me é permitido expender a minha opinião, antes de entrar nas considerações da averiguação do acidente feitas pelos Investigadores, gostaria de te passar uma informação que me transmitiram durante a minha formação. Ensinaram-me que, depois da aeronave entrar na “Final” e muito mais na situação de “Final Curta”, não há comunicações com o piloto a não ser em caso de uma emergência urgente. Porquê? Porque o piloto, nesta fase está super assoberbado de trabalho, não devendo pois ser desviado da execução da manobra sob pena de uma distracção, mesmo que muito curta e momentânea, pode ser levado ao acidente.

Numa situação de “Final” ou “Final Curta”, entre outras operações o Piloto, num simples Cessna em condições VMC, encontra-se empenhado em:

  • Configurar a aeronave para a aterragem;
  • Controlar a velocidade horizontal e vertical da aeronave;
  • Gerir a razão de transformação da energia potencial em energia cinética;
  • Controlar a potência do motor;
  • Controlar os efeitos do vento cruzado;
  • etc, etc, etc.

Se isto já são muitas funções para um piloto experimentado, imagina o que tudo isto significa para um piloto-aluno que ainda não ganhou certos automatismos! Deves ainda estar lembrado do que significava para ti uma aterragem durante a instrução. Parecia que faltava sempre uma mão ou um pé… Suavas por todos os poros. O ritmo cardíaco disparava para valores enormíssimos. Ficavas nos limites.

Agora imagina que estás no teu segundo voo solo, és informado que estás em número 1 para a aterragem, comunicas que estás na “Final”, com o avião configurado (flaps em baixo) completamente estabilizado na ladeira, com ar quente ao carburador metido (potência reduzida) e, de repente, és instruído para fazer uma volta de 90º pela esquerda para deixar passar um avião mais rápido. Certamente perceberás porque é que o aluno faleceu num acidente no seu segundo voo solo.

E o instrutor que assistiu a tudo em tempo real? Em que estado fica um instrutor ao ver o aluno morrer à sua vista?

Vejamos, agora, quais foram os factos apurados sobre o estado em que ficou a aeronave. O relatório diz-nos que, e não traduzo:

The ground was hard and dry and the aircraft came to rest on the front of the engine and its main wheels with the tail in a near vertical position. The nose wheel with its fork assembly was found approximately 40 m behind the aircraft.

O relatório informa-nos também que ambas as asas sofreram extensas deformações ao longo dos bordos de ataque devido a elevados esforços de compressão, típicos de um embate quase à vertical com o solo. Por outro lado, a ponta da asa esquerda estava torcida para cima e para trás, um sinal de que o avião estava a fazer uma “spiral dive” para esse lado no momento do embate.

Outro facto que, quanto a mim é de importância crucial para a ocorrência do acidente, porém um facto absolutamente natural quando pensamos que o piloto-aluno estava a realizar o seu segundo voo solo e é instruído intempestivamente para realizar uma manobra para a qual não estava de modo algum preparado, é aquilo que podemos ler no seguinte passo do relatório:

The wing flaps were extended by approximately 24° relative to the wing trailing edges.

Este facto pode significar uma de duas coisas:

1)    Ou o aluno não alterou a configuração de flaps que trazia na “Final”, como resultado da sua inexperiência;

2)    Ou o aluno começou a recolher os flaps tarde de mais, ficando estes numa posição em que produzem uma resistência muito elevada quando comparada com os potenciais benefícios do aumento do coeficiente de sustentação.

Como certamente a maior parte dos meus Caros sabe, o Cessna C150 é equipado com flaps Fowler, eléctricos, que se deslocam 40º ao invés do C152 que, apesar de ter mais potência, está equipado com flaps que só se deslocam 30º. Salvo melhor opinião, os 10º de flaps a mais do C150 actuam essencialmente como se de “speed brakes” se tratassem. Se não forem recolhidos a tempo só atrapalham uma manobra intempestiva pois a aeronave terá muito mais dificuldade em acelerar e recuperar velocidade aerodinâmica, factor crucial para evitar possíveis “perdas”.

Prosseguindo com a leitura do relatório ficamos a saber que os planos de cauda ficaram mais ou menos indeformados. Porém, a parte traseira da fuselagem ficou dobrada devido ao impacte. Apesar de ambos os depósitos da aeronave se terem rompido pôde ainda recuperar-se, de cada depósito, 2 galões (9 litros) de combustível limpo e sem contaminações. Este facto por si só demonstra que não houve paragem de motor devido à falta de combustível.

Dada a atitude da aeronave no momento do embate com o solo, o berço do motor foi encontrado torcido e fracturado devido às forças de impacte. Em relação ao hélice o Relatório informa-nos que as suas deformações demonstram que, no momento do impacte, o motor debitava potência.

Prossigamos na análise dos destroços da aeronave após o acidente. A chave dos magnetos, em resultado do embate, saiu do interruptor. Isto poderá acontecer em aviões mais velhos – o caso de qualquer C150 – o que traduz um desgaste da fechadura do interruptor devido a muitos anos de uso da aeronave. Porém, este facto e o seguinte não deverão ter tido qualquer importância fundamental para o resultado final do acidente. O outro facto foi a constatação, por parte dos Investigadores, de que o interruptor dos magnetos se encontrava na posição “Right”. Contudo, os pilotos sabem que, num Cessna C150, o facto de se colocar fora de serviço um magneto provoca somente uma queda de 150 rpm a um regime de 1.700 rpm e 75 rpm entre L e R. Isto, naturalmente, corresponde a uma certa perda de potência, mas muito reduzida. Não foi por isto que o acidente teve as consequências que teve.

Vejamos agora que potência deveria estar a debitar o motor no momento do impacte. Como vimos atrás, pelas deformações sofridas pelo hélice, pode-se concluir que o motor rodava quando a aeronave embateu no solo. Que potência estaria a debitar? Pode-se perceber este facto a partir da posição em que se encontrava o throttle. Este comando do motor estava torcido e deslocado para trás cerca de 61 mm em relação à posição de potência máxima.

Posição do throttle semelhante àquela em que estava o do C150 acidentado – 61 mm à retaguarda.

Se esta posição do throttle deriva do embate no solo ou do facto do aluno se ter assustado quando viu o Cessna a acelerar quase à vertical no spiral dive e desacelerado o motor, parece-me que não é fundamental para o resultado final do acidente.

Os Investigadores prosseguem o seu relato afirmando que:

The carburettor heat control had been pulled out by approximately 22 mm and the mixture control was pushed fully in (the rich position).

Nesta conclusão já temos algo de muito interessante para a compreensão do acidente.

Em primeiro lugar, a mistura estava em “Rich” demonstrando que não tinha havido uma manobra intempestiva que pudesse ter levado a uma possível paragem do motor.

Em segundo lugar, o botão de aquecimento do carburador puxado cerca de 22 mm já me parece indicar que o aluno nunca mais se lembrou deste comando que foi deixado numa posição típica das pernas “Base” e “Final”. Como todos sabemos, quando metemos ar quente ao carburador, estamos a diminuir implicitamente a potência disponível produzida pelo motor. Ora, ao cumprir as instruções do ADC, voltando 90º para a esquerda, uma das primeiras acções que o piloto deveria ter tomado era retirar o ar quente ao carburador de modo a libertar toda a potência disponível produzida pelo motor. Assim percorreu toda a trajectória inversa à perna “Base”, até ao “spiral dive” final, com a potência e a capacidade de aceleração reduzidas. Um esquecimento perigoso, típico de um principiante que é levado a fazer uma manobra extemporânea.

Na próxima semana iremos começar por analisar como estavam organizadas as comunicações e funções de controlo no aeroporto de Southend. Q

METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – XII)

Prosseguimos hoje com a revisão dos códigos das mensagens TAF’s, essas mensagens que nos permitem ter uma noção das condições meteorológicas futuras num dado aeródromo.

DATA E VALIDADE

Vejamos agora como se descodifica, numa mensagem TAF, a data e o intervalo de validade da informação meteorológica contida na mesma. Analisemos o seguinte exemplo:

TAF

KSTL 211120Z 2112/2218 12006KT P6SM SCT250 WS020/25030KT

     FM211500 17009KT P6SM SCT040 SCT250

     FM211900 18012G18KT P6SM BKN040 BKN100

     FM220000 17009KT P6SM OVC040

     FM220800 17008KT P6SM VCTS OVC030CB

     FM221500 19011KT P6SM SCT030 BKN060=

Num TAF, imediatamente a seguir ao identificador ICAO do aeródromo, vamos encontrar dois grupos que indicam a data e a hora nas quais a mensagem foi preparada, por conseguinte a informação sobre a data e as horas de começo e fim de validade da informação meteorológica.

No TAF do exemplo – um TAF de 32 horas nota bem - a seguir ao identificador KSTL (Lambert-Saint Louis International Airport), o código do primeiro grupo indica-nos que a mensagem foi produzida no 21º dia do mês às 1120Z, onze horas e vinte minutos UTC.

O código 2112/2218, constituinte do segundo grupo, informa-nos que a informação meteorológica é válida entre as 12 horas do 21º dia do mês e as 18 horas do 22º dia do mês.

Para a semana prosseguiremos com esta nossa revisão das mensagens meteorológicas. Até lá sempre que fores voar não deixes de consultar a informação meteorológica em:

Um conselho do Fernando. Q

Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ

Como sempre, um abração do

Fernando

Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve segundo a ortografia do Acordo Ortográfico de 1945.