Cronicas de Segurança Aeronáutica

Meu Caro,

A semana passada lancei um pequeno repto a todos os “Meus Caros” que quisessem colaborar detectando um erro de palmatória cometido pelo piloto que estatelou um Cessna C172N no aeródromo de “Quatro Vientos”. Recebi algumas colaborações. Houve um dos “Meus Caros” que acertou em cheio naquilo que eu considerei um erro de palmatória depois do avião ter cambalhotado na pista.

Porém as respostas que eu recebi encerram, em si mesmas, ideias muito mais profundas e que merecem um pouco da nossa atenção. No seu conjunto elas podem conter matéria de reflexão sobre o estado actual da Aviação Ligeira e sobre a razão de certos acidentes.

Porque seria uma pena perder estas ideias vou, na próxima croniqueta, lançá-las a debate para que, assim, a comunidade de leitores se possa aperceber das questões que atormentam aqueles que se preocupam mais com a Segurança Operacional.

Finalmente, ontem 5 de Julho, conforme havia sido prometido pelo Bureau d’Enquêtes et d’Analyses pour la Securité de l’Aviation Civile foi publicado o Relatório Final de Investigação do Voo AF447. Se quiseres aceder ao mesmo basta seguires a hiperligação. Um documento muito interessante e completo. Certamente servirá de base para muitas discussões nos próximos tempos. Eu ainda não consegui fechar a boca depois de ter lido o Capítulo 3 – Conclusões deste Relatório. Ele contem coisas más de mais para serem reais!

Para começar os nossos temas técnicos da semana irei dar a minha solução para a tal pergunta sobre o erro de palmatória cometido pelo piloto após ter estampado o Cessna C172N na pista 28 Madrid – Quatro Vientos.

Depois iremos ver uma notícia sobre um incidente grave ocorrido em Tóquio – Narita. Um incidente em que um Boeing 767-300 faz um exercício de “triplo salto aeronáutico”. Como curiosidade podemos ver o “triplo salto” em tempo real e as suas consequências. De seguida faremos um pequeno exercício de filosofia sobre a “Segurança Operacional e o papel das Entidades Reguladoras”.

Terminaremos a croniqueta da semana com mais uma abordagem do tema METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA.

The last but not de least já temos mais um acidente. Agora com um bimotor Seneca em missão de treino em Cascais.

MAIS UMA SEMANA, MAIS UM ACIDENTE

Neste annum horribilis de 2012, mais uma semana e temos a somar mais outro acidente. Deste vez com um Piper PA-34-200T Seneca, em instrução, que acabou por se desfazer em Manique a norte de Tires.

Foto do bimotor acidentado.

Como sempre, espero pelo relatório oficial do GPIAA para poder tirar conclusões factuais do acidente. Entretanto desejo um rápido restabelecimento aos nossos Companheiros. Q

ACIDENTE TÍPICO OU UMA FALHA DE INSTRUÇÃO (Parte – II)

Na crónica da semana passada analisámos um acidente ocorrido no aeródromo de Quatro Vientos no dia 15 de Janeiro de 2011. Para acederes ao relatório do acidente, Informe Técnico A-002/2011 do CIAIAC, basta seguires a hiperligação.

Para além dos factos expostos no citado Relatório referimos que o aluno piloto tinha cometido mais um erro de palmatória para além daquilo que se descrevia no Relatório. Infprmei-te que toda a informação necessária para descobrires o citado erro estava contida no corpo do artigo e do Relatório.

Na crónica anterior dizia-se que o avião – um Cessna C172N – ao capotar tinha avariado as ligações de combustível do encastramento da asa direita com o consequente derramamento da gasolina. Como deves calcular este facto corresponde a um risco elevado de incêndio e nada melhor para o iniciar do que um curto-circuito e/ou uma faísca eléctrica.

Todos nós aprendemos que na situação de um acidente destes deveremos proceder de imediato ou até em antecipação, se tal for possível, ao corte de combustível na válvula selectora e desligar todas as fontes e circuitos eléctricos de modo a evitar a tal faísca que pudesse fazer a ignição do combustível derramado.

Disse-te na crónica anterior que, interrogado o meu Neto sobre o erro que o piloto havia cometido, ele me deu uma resposta meia certa. É verdade. O rapazeco, fazendo para si próprio a ladainha do “after flight checklist” disse-me de imediato: “ – Avô, o piloto não fechou a válvula selectora do combustível!”. Expliquei-lhe que não havia evidências desse facto pelo que não poderíamos afirmar que o piloto tinha cometido esse erro. Expliquei-lhe, ainda, que estando o avião na posição invertida os depósitos ficavam abaixo da selectora pelo que a colocação desta na posição “OFF” não adiantaria muito para a diminuição do risco de incêndio. Afinal, o depósito da asa direita vertia directamente para o solo o AVGAS 100LL.

Prosseguindo na ladainha o Chico disse-me de imediato: “ – Já sei, Avô! O piloto esqueceu-se de desligar o “master switch” do avião!”. Como podes imaginar perguntei-lhe porque é que ele afirmava isso tão seguro. Resposta do garoto: “ – O farol de aterragem permanece aceso.” Basta olhar para a fotografia seguinte para verificar esta evidência. E não me digas que o farol parece aceso por reflexo do sol. Se reparares na sombra projectada no solo pelo corpo do indivíduo que se encontra no extremo traseiro da cauda do avião, verás que esta se projecta para a frente da aeronave indiciando que o sol está numa posição traseira em relação ao Cessna. Como tal não poderia incidir no reflector do farol de aterragem de modo a dar a ideia de este estar acesso. O farol estava mesmo ligado.

O farol de aterragem depois do acidente permanece aceso indiciando que o “master switch” foi deixado ligado.

O que aconteceu efectivamente, foi que o piloto, na ânsia de se afastar da aeronave não tomou a providência de desligar o “master switch”. O tal erro de palmatória. E se por acaso o piloto tivesse partido uma perna e não se pudesse afastar rapidamente do avião? A falta de cuidado de desligar o “master switch” eléctrico poderia originar um incêndio cujos resultados nunca se conhecem à partida.

É através destes pequenos pormenores que nos podemos aperceber do nível de airmanship de um piloto. Uma opinião do Fernando. Q

MAIS UM PRATICANTE DO “TRIPLO SALTO AERONÁUTICO”

Não penses que são só pilotos imberbes em início de aprendizagem que praticam o “Triplo Salto Aeronáutico”, aquela modalidade de aterragem que deixa sempre as suas marcas na aeronave, quando não nos pilotos e/ou passageiros. Também acontece aos pilotaços ultra rodados. No primeiro caso, normalmente, é falta de sapiência e prática. No segundo caso é aquele azar que um dia acontece a todos nós.

Há 15 dias aconteceu com um B767-300 da ANA All Nippon Airways, voo NH-956 de Beijing (China) to Tokyo Narita (Japan) com 193 pessoas a bordo.

Ao aterrar na pista 16R do Aeroporto de Narita, às 04:30Z (13:30 LT) teve um “hard landing with bouncing”. Ao voltar a aterrar fê-lo com o trem de proa, prática pouco recomendável. Estava o tempo muito complicado em Narita? O METAR era o seguinte:

RJAA 200430Z 23016G29KT 9999 FEW025 BKN/// 28/21 Q0998 WS R16L NOSIG RMK 1CU025A2948

Um exame imediato à aeronave mostrou que esta sofreu sérios danos pois a estrutura da fuselagem ficou toda enfolada, sinal de que foi sujeita a fortes esforços de flexão que provocaram deformações permanentes. Uma câmara de vídeo de segurança do aeroporto gravou a aterragem.

Vai a http://www.youtube.com/watch?v=S7pXjQ16f5c e poderás ver como aquela decorreu. Observarás que a aeronave aterra por duas vezes com o trem de proa a alta velocidade. Terás ainda imagens obtidas já no apron onde te poderás aperceber das avarias visíveis na fuselagem.

À pergunta “qual foi realmente a causa deste incidente?” não te posso responder pois o Japan TSB ainda não publicou, até à data em que escrevo esta crónica, qualquer relatório mesmo que provisório.

Como vês, um acidente que pode acontecer a qualquer um. Defende-te desta situação pondo em prática todo o teu airmanship. Um conselho do Fernando. Q

A AVIAÇÃO GERAL NÃO PRECISA DE MAIS REGRAS DE SEGURANÇA OPERACIONAL

Ao leres este título não penses que eu estou a defender a ideia. Passo a explicar o que é que isto significa.

Li uma notícia sobre uma ideia expendida por um blogger americano, Mr. Scott Spangler. Defende este senhor que o NTSB – National transport Safety Board não deveria impor mais regras de segurança operacional à Aviação Geral. Será que esta Aviação é diferente das outras, pergunto eu? Naturalmente que não.

Já por diversas vezes referi nestas minhas croniquetas que a “Safety” começava nas entidades reguladoras. Todos nós temos a certeza que a técnica aeronáutica está em permanente evolução. Uma parte auto criada, outra parte desenvolvida para responder a melhorias na segurança operacional impostas pelas entidades reguladoras. Propor ao NTSB para deixar de promulgar regras de segurança é o mesmo que dizer: “ Esqueçam a vossa função!”.

Para defesa da sua ideia, Scott Spangler diz que o empenho na Segurança perfeita é um objectivo em todo o universo da Aviação. Porém, continua o Mr. Spangler, “…deve-se assumir que a Aviação não é uma actividade sem riscos (mas será que há alguma actividade humana sem riscos?) e que qualquer um pode realizar uma manobra estúpida no momento errado…”. Diz ele que, contra isto, nada se pode fazer a não ser ficar em terra.

Que me desculpe o Scott mas estou em total desacordo com esta sua peregrina ideia. Afinal, até foi em terra que se deu o mais grave acidente da história da Aviação. Será porque qualquer um de nós é capaz de actuar de um modo errado, que não se deve regular a Aviação? Será que, assim, sem melhoria contínua da regulamentação, se conseguirá continuar a aumentar o nível geral da Segurança Operacional? Será que este senhor pensa que a Aviação Geral atingirá alguma vez a Segurança absoluta? Nunca este senhor terá pensado que o caminho para “a” Segurança se faz por pequenos passos e aproximações sucessivas constantes?

Pilotos a fazerem asneiras haverá toda a vida. É da condição humana. Mas também faz parte da inteligência humana “a” evolução, qualquer que seja o âmbito de aplicação. Esta é a opinião do Fernando. Q

METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – III)

Mais uma croniqueta na qual prosseguimos com a análise dos códigos das mensagens de informação meteorológica. No presente número, códigos dos METAR’s e SPECI’s.

VISIBILIDADE PREVALECENTE

Comecemos com um exemplo concreto cujo conteúdo analisaremos de seguida:

METAR KBLV 011657Z AUTO 25015G30KT 210V290 3/8SM R32L/1000FT FG BKN005 01/M01 A2984 RMK A02 SLP034

Neste exemplo, 3/8SM (3/8 of a statute mile) é a visibilidade prevalecente no aeródromo. Mas o que se entende por visibilidade prevalecente? É a maior visibilidade horizontal observada em pelo menos metade do círculo do horizonte. Nota que esta visibilidade não tem de ser contínua nos 360º do horizonte.

A visibilidade sectorial será indicada na secção das “Remarks” se esta diferir da “Visibilidade Prevalecente” e for inferior a 3 milhas conforme se exemplifica nos três seguintes exemplos:

VIS 1V2 VISibility is Variable between 1 and 2 miles

VIS 2 RWY 11 VISibility is 2 statute miles at RunWaY 11

VIS N 2 VISibility in the Northern sector is 2 statute miles

Vejamos uma outra situação de codificação de “Visibilidade Prevalecente” que difere ligeiramente do exemplo de METAR anterior.

METAR EDDF 071320Z 22008KT 9999 SCT036 SCT090 BKN280 19/10 Q1011 NOSIG

Fora dos USA, a visibilidade é indicada em metros. Como tal o código SM é omitido. O valor máximo da visibilidade, quando esta é indicada em metros, é 9999. Este código informa que a visibilidade é superior a 9.000 metros.

VISIBILIDADE HORIZONTAL AO NÍVEL DA PISTA

Esta informação, a RVR ou Runway Visual Range, é uma informação que pode ou não aparecer no METAR. Se esta informação estiver presente no METAR ela é indicada por um grupo de códigos que começa pela letra “R “ como se indica no exemplo seguinte:

METAR KBLV 011657Z AUTO 25015G30KT 210V290 3/8SM R32L/1000FT FG BKN005 01/M01 A2984 RMK A02 SLP034

Neste METAR aparece um segundo código iniciado por “R”: “RMK”. Contudo este conjunto de três letras não é propriamente um código mas, sim, uma abreviatura de “Remark” ou “Nota” em português.

O código da “Runway Visual Range” segue-se sempre ao código da “Visibilidade Prevalecente”, começando sempre pela letra R. Imediatamente a seguir a esta letra indica-se a direcção da pista. No exemplo presente 32L indica que o RVR é o da pista 32 Left. A seguir ao QFU da pista poderiam aparecer mais duas letras: C para “Center” e R para “Right”. Os quatro últimos dígitos deste código indicam-nos a visibilidade expressa em pés.

Neste exemplo, R32L/1000FT significa que a visibilidade horizontal ao nível da pista 32L é de 1000 pés.

Fora dos USA, a visibilidade ao nível da pista é reportada em metros pelo que o código FT é omitido do grupo da RVR. Assim, fora dos USA a mesma informação seria indicada da seguinte maneira: R32L/0300. Nesta situação dizer-se-ía que a RVR para a pista 32L era de 300 metros.

São estas as situações mais vulgares da informação do RVR dentro de um METAR. Porém podemos ter codificações especiais, mais detalhadas, para a “Visibilidade Horizontal ao Nível da Pista”. Como se descodificariam os seguintes códigos, não incluídos na informação anterior, nos seguintes formatos: M0600FT ou P6000FT ou R06L2000V4000FT? Vejamos caso a caso:

M0600FT – Significa que o RVR é inferior a 600 pés (M = Menos do que);

P6000FT – Significa que o RVR é superior a 6000 pés (P = Maior do que):

R06L2000V4000FT - Significa que o RVR para a pista 06L é variável entre 2.000 e 4.000 pés. Nesta codificação o V indica que o RVR é variável entre as duas cabeceiras da pista.

Se calhar nestes códigos já existem algumas particularidades que não te são familiares. É natural. Por exemplo, para teres o código R06L2000V4000FT isso implica que a pista tenha pelo menos dois visibilímetros instalados junto à mesma, o que nem sempre é vulgar.

Para a semana voltaremos aos nossos “METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA”. Entretanto, quando fores interpretar o METAR para a tua próxima viagem, faz tudo para que o faças correctamente. Um conselho do Fernando. Q

Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ

Como sempre, um abração do

Fernando

Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve de acordo com a antiga ortografia.

Meu Caro,

Esta semana entrámos no

de publicação destas minhas croniquetas em que, ao longo do tempo, tentei passar alguns conceitos que permitissem a todos os “meus Caros” praticarem uma Segurança Operacional mais profunda e activa.

Porém, entrámos no oitavo ano de luto. O nosso oitavo ano não podia ter começado pior! Mais duas mortes – instrutor e aluno - num acidente de Aviação Geral na passada terça-feira, à noite com um Cessna C152. Desta vez, em Matarraque, a sul do aeródromo de Tires. Desde Janeiro deste ano já contamos com sete mortes em acidentes de Aviação Geral. Não me lembro de uma desgraça destas.

Um Amigo dizia-me “…Também questionamos o que está a acontecer na aviação ligeira … Infelizmente, não temos respostas, mas parece-me que algo está submerso que influencia estes dramáticos eventos…”. Eu gostaria de ter uma resposta para esta questão. Tu, meu Caro, tens alguma ideia?

Fotografia do C152 após o acidente em Matarraque. Foto de José Sena Goulão, Lusa, reproduzida com a devida vénia.

Que estes nossos dois companheiros descansem em paz, são os meus votos.

Como pudeste testemunhar, ao longo do tempo fui, eu próprio, tendo altos e baixos sobre a utilidade destas nossas conversas semanais. Uns dias convenci-me da sua total inutilidade tais os resultados que me foram chegando. Através de mensagens que recebo com alguma frequência dos “meus Caros” tive, porém, dias em que me convenci da bondade destas crónicas. Não posso deixar de agradecer, naturalmente, todas estas mensagens de incentivo que tenho vindo a receber. Afinal elas fazem-me cair para o lado da possível utilidade das croniquetas.

Há uma coisa de que podes tu ter a certeza: estas croniquetas foram sempre escritas com imenso entusiasmo e na presunção de que elas poderiam dar uma achega, mesmo que muito pequenina, para melhorar o airmanship daqueles que as lêem. Tentei fazer o meu melhor. Porém, quem pode melhorar efectivamente a Segurança Operacional não sou eu. São os seus actores activos: os pilotos, os controladores, os legisladores, os investigadores e os mecânicos.

Poderia dizer mais umas tantas coisas sobre a passagem deste aniversário. Com as mortes desta semana penso que não vale a pena. Os temas técnicos que irei abordar, esses sim, têm importância. Assim, deixemo-nos de lamechices de aniversário porque o tempo é de luto e passemos aos “finalmentes” de Segurança Operacional.

Como primeiro tema técnico desta semana vou abordar um acidente típico. Aquilo a que costumo denominar como a prática do “triplo salto aeronáutico”. Porém, não posso deixar de expressar a minha opinião sobre aquilo que eu penso estar na base deste acidente: um erro de palmatória de instrução.

Depois continuaremos o nosso passeio pelos METAR’S, TAF’S, SPECI’S & Companhia. E, the last but not the least, um pequeno conselho de Verão.

Estão disponíveis na página eletrónica do GPIAA, desde ontem:

·         A Nota Informativa do Acidente  com o Cessna 152, registo CS-AUR, ocorrido no dia 26 de junho de 2012, em Matarraque, S. Domingos de Rana

·         A última atualização do Mapa Síntese dos Acidentes e Incidentes ocorridos em 2012

ACIDENTE TÍPICO OU UMA FALHA DE INSTRUÇÃO (Parte – I)

Há umas semanas atrás um Amigo meu dizia-me: “ - Quanto aos mortos da nossa AG; infelizmente era previsível e tu próprio já tinhas escrito sobre isso. Deficiente formação pode ser uma das contribuintes.”. Não vou repetir as minhas razões pois, como dizia o meu Amigo “tu próprio já tinhas escrito sobre isso”. Vou, sim, concretizar muitas das ideias que expus em devido tempo, agora, com mais um exemplo. O exemplo de um acidente ocorrido no Aeroporto de Quatro Vientos (LECU), Madrid, durante um voo de instrução. Um voo com algumas particularidades.

Se quiseres conhecer o texto completo do Informe Técnico A-002/2011 do CIAIAC basta seguires a hiperligação.

Vejamos o que aconteceu. Um aluno de PCA com um total de 40 horas de experiência de voo, depois de fazer um voo de viagem regressou a Quatro Vientos para terminar o mesmo. Entrou na área de manobra do aeródromo através do ponto Sierra tendo sido autorizado a aterrar na pista 28, uma pista asfaltada com 1500 m de comprimento e 30 m de largura. A aeronave em causa era um Cessna C172N pertencente a uma Escola de formação de pilotos.

De acordo com o piloto, a aproximação à pista desenvolveu-se com toda a normalidade. Porém, o primeiro toque da aterragem foi aquilo que se costuma designar por “hard landing with bouncing”. A este salto seguiu-se uma segunda aterragem com o trem de proa. Uma aterragem que provocou o rebentamento do pneu deste trem.

A partir deste momento o aluno perdeu o controlo direccional da aeronave que se foi desviando lentamente para a esquerda até que o avião saiu da faixa de rolagem de asfalto, passando a circular pela faixa lateral da pista. Assim, a roda do trem de proa, rebentada, acabou por embater na tampa de uma caixa que se encontrava saliente entre 8 e 12 cm acima do solo.

Parte inferior do trem de proa com a respectiva roda depois de ter embatido com a caixa.

Como resultado deste embate a aeronave acabou por capotar, imobilizando-se como se mostra na figura seguinte retirada, com a devida vénia, do Relatório do CIAIAC.

Posição final de imobilização do Cessna C172N

O Controlador da Torre, que seguiu a parte final do voo e da aterragem, tinha, contudo outra versão dos factos. Afirmou aos Investigadores que a aeronave se aproximou demasiado alta devendo o piloto ter empurrado o manche para a frente para fazer descer o avião. Como a maioria dos pilotos sabe, nestas situações, uma rápida variação de energia potencial transforma-se no respectivo aumento da energia cinética. Como resultado, a velocidade aumenta com as dificuldades inerentes para a aterragem. Deste modo o Controlador testemunhou um planeio demasiado longo do avião sobre a pista, certamente devido a um excesso de velocidade. Seguiram-se dois ou três “hard landing with bouncing” situação que, normalmente, ao terceiro impacte no solo tem efeitos nefastos para o trem de proa. Como vimos atrás, a roda de proa rebentou fazendo a aeronave descontrolar-se em controlo direccional. Já fora da pista, a aeronave foi embater numa caixa implantada no solo tendo capotado. Deste embate resultou a fractura do trem de proa. Este, o testemunho do Controlador de serviço à Torre do aeródromo. Note-se que Quatro Vientos é um aeródromo de Aviação Geral onde decorre diariamente uma quantidade enorme de voos de treino já que se trata do único aeródromo na região de Madrid onde se podem praticar voos VFR.

Felizmente, o aluno conseguiu sair da aeronave pelos seus próprios meios, mesmo antes da chegada dos bombeiros.

Nota que, depois da cambalhota se deu a ruptura dos tubos de combustível no encastramento da asa direita com o consequente derramamento da gasolina. Esta não chegou a arder dada a intervenção dos bombeiros.

Este voo de instrução, porém, ocorre numa situação da qual discordo completamente. Vejamos os factos:

a)    O aluno estava a realizar o curso integrado para obter a licença de Piloto Comercial CPL(A);

b)    O aluno iniciou os seus voos em Abril de 2010, voando de uma forma continuada até aos finais de Agosto desse mesmo ano (5 meses de treino);

c)    Durante este intervalo de tempo realizou 28:42 horas de voo;

d)    O aluno foi “largado” com cerca de 18 horas de voo, em Junho de 2010 (3 meses após o início da instrução de voo);

e)    Entre o final de Agosto de 2010 e o dia 3 de Janeiro de 2011 (um intervalo de 4 meses) o aluno não realizou qualquer voo por motivos de doença;

f)     Duas semanas antes do acidente o aluno retomou as missões de voo tendo feito com o instrutor um voo de 1 hora e meia. Durante este, realizou uma única aterragem(!);

g)    Depois deste voo em duplo comando foi programado o voo de viagem no fim do qual se deu o acidente;

h)    As investigações consideraram que o acidente se deu por falta de perícia do aluno-piloto.

Se me é permitida uma opinião muito pessoal, um aluno que faz as suas primeiras 29 horas de voo e, depois, está 4 meses sem voltar a voar perde certamente uma percentagem muito elevada da perícia que ganhou na primeira fase da instrução. Este aluno deveria ter sido “relargado” com muito mais atenção por parte do instrutor e, de modo algum, fazendo uma única aterragem durante o citado voo de 1 hora e meia. Em meu entendimento isto constitui um erro grave de instrução devido a razões que desconhecemos. Falta de experiência profissional do instrutor? Procedimentos standard denotando um enorme facilitismo por parte da entidade formadora?

Não vou dizer que o aluno só deveria ter sido “relargado” após 10 ou 20 aterragens. Isso é tarefa que diz respeito ao instrutor. Porém afirmo sem receio de ser desmentido que uma única aterragem de treino para um aluno com 29 horas de voo que está 4 meses sem voar é definitivamente insuficiente. Não estamos a falar de um piloto com 1000 ou mais horas de voo que esteve parado 4 meses. Certamente, uma única aterragem daria para o instrutor se aperceber da perícia remanescente do piloto. Estamos, sim, a falar de um principiante com uma experiência absolutamente mínima.

Apesar do normativo aplicável – JAR/FCL – não especificar um treino mínimo a realizar pelos alunos após um período de interrupção da formação, a decisão de programar um voo de viagem a solo, após o pequeno voo de uma hora e meia depois de um período de inactividade de 4 meses, na opinião do CIAIAC, “…no fue idónea y contribuyó a que se produjera el accidente…”. Concordo integralmente. Afinal este acidente é um bom caso de estudo para instrutores e escolas.

Como dizia no início “- Quanto aos mortos da nossa AG… Deficiente formação pode ser uma das contribuintes”. “Tás” a ver porquê?

Porém o nosso aluno piloto cometeu mais um erro de palmatória. E um erro muito grave e perigoso! Não te vou dizer qual foi. Lanço-te um desafio e deixo isso para que tu, durante a semana, com a tua perspicácia medites sobre o assunto e me envies um e-mail dizendo qual foi esse erro cometido pelo “pilotaço”. Nesta croniqueta tens todos os elementos para chegares a uma conclusão. Não é um concurso porque não tenho prémios para distribuir. É uma maneira de exercitar o teu airmanship. A solução para este enigma é muito fácil. O meu Neto, criança de 10 anos de idade, acertou à segunda tentativa, não sendo a sua primeira solução totalmente descabida. Uma resposta “não totalmente certa” mas “não errada”, tal como nos exames do INAC.

Durante a semana aceito sugestões. Na crónica Nº 324 dar-te-ei a minha opinião. Q

METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – II)

Continuemos com a revisão da codificação destes documentos aeronáuticos. Mesmo um piloto experiente e rotinado poderá já ter esquecido alguns pormenores destes documentos de informação meteorológica.

Não te esqueças que as mensagens METAR e SPECI têm uma estrutura idêntica só fazendo a diferença indicada na croniqueta da semana passada. Daqui para o futuro utilizaremos, por simplificação, exclusivamente a expressão METAR para indicar os dois tipos de mensagens meteorológicas.

AUTO e/ou COR

O que significam as expressões AUTO e/ou COR se incluídas num METAR? Comecemos com o exemplo da utilização da expressão AUTO:

METAR KBLV 011657Z AUTO 25015G30KT 210V290 3/8SM R32L/1000FT FG BKN005 01/M01 A2984 RMK A02A SLP034

A expressão AUTO, num METAR, significa que a observação meteorológica foi realizada por uma estação meteorológica automática, naturalmente uma estação certificada e não uma qualquer estação meteorológica.

Uma mensagem METAR do tipo AUTO pode ter dois códigos suplementares: A01 A02A.

Código A01

Este código significa que a observação meteorológica foi feita por um equipamento que não dispõe de um subsistema discriminador do tipo de precipitação (chuva vs neve);

Código A02A

O código indica que a observação meteorológica automática foi melhorada por um observador humano.

Vejamos, agora, um exemplo da utilização da expressão COR:

METAR KBLV 011657Z AUTO COR 25015G30KT 210V290 3/8SM R32L/1000FT FG FU BKN005 01/M01 A2984 RMK A02A SLP034 COR 1725

A expressão COR num METAR indica uma observação meteorológica que corrige uma anterior. Assim, é anulada a transmissão prévia. Normalmente este código é seguido de uma indicação suplementar. Exemplificando: COR 1725. Esta informação indica que a mensagem de correcção foi transmitida às 1725Z .

VELOCIDADE E DIRECÇÃO DO VENTO

Num METAR, em que grupo de códigos devo procurar a informação sobre o vento? A informação sobre o vento corresponde ao conjunto de dados cujos dois últimos caracteres são as letras KT.

Vejamos no seguinte exemplo a codificação da informação sobre o vento.

METAR KBLV 011657Z AUTO 25015G30KT 210V290 3/8SM R32L/1000FT FG BKN005 01/M01 A2984 RMK A02 SLP034

·         Direcção Verdadeira

Neste conjunto os três primeiros dígitos correspondem à direcção verdadeira, aproximada à dezena de graus mais próxima, da qual o vento sopra no momento. É preciso ter em atenção que na grande maioria dos casos a direcção do vento, por ser verdadeira, não coincide com o QFU da pista, este, sim, magnético.

·         Velocidade Constante

Os dois dígitos seguintes correspondem à velocidade constante.

·         Rajada

Se o vento estiver de rajada, os dois ou três dígitos seguintes à letra “G“ correspondem à velocidade da rajada, A velocidade mais elevada do vento detectada nos últimos dez minutos.

·         Unidade de Medida do Vento

A unidade de medida do vento é sempre o knot (KT) ou milha náutica/hora.

No exemplo, o grupo de informação relativo ao vento tem a seguinte constituição: 25015G30KT . Vejamos o seu significado:

Direcção Verdadeira de onde sopra o Vento: 250º(verdadeiros);

Intensidade do Vento: 15 knots;

Rajadas: G30 (gusting) knots.

VENTO VARIÁVEL EM DIRECÇÃO

Se a direcção do vento não for constante como é que esse facto é indicado num METAR? Vejamos um exemplo:

METAR KBLV 011657Z AUTO 25015G30KT 210V290 3/8SM R32L/1000FT FG BKN005 01/M01 A2984 RMK A02 SLP034

Se houver inconstância na direcção do vento, a seguir ao grupo de códigos referentes à direcção e intensidade do vento aparecerá um grupo de códigos com essa informação. Porém, este grupo só é indicado se se verificarem concomitantemente duas condições:

a)    A direcção do vento variar 60º ou mais graus; e

b)    A intensidade do vento tem de ser superior a 6 knots.

O grupo de códigos que informam sobre a invariabilidade do vento é composto por um subgrupo de três dígitos que indica a direcção extrema mais baixa do vento e por um subgrupo de três dígitos que indica a direcção extrema mais alta do vento. Estes dois subgrupos são separados pela letra V indicativa da variabilidade da direcção do vento.

No exemplo presente - 210V290 – o código indica que a direcção (verdadeira) do vento é variável entre 210º e 290º .

Até aqui se calhar ainda não tivemos muitas novidades. Continuaremos para a semana. Q

UM PEQUENO CONSELHO DE VERÃO

Entrámos definitivamente no Verão. As temperaturas sobem que nem foguetões Ariane. Por isso, meu Caro, o comprimento das pistas “diminui”. Não fisicamente, como é natural. Mas, sim, aerodinamicamente.

Certamente estás lembrado de ter estudado o seguinte gráfico que inter-relaciona a “Altitude Densidade” com a “Altitude de Pressão” e a “Temperatura”.

Variação da “Altitude Densidade” com a “Altitude de Pressão” e com a “Temperatura”.

Se o combinares com as “Tabelas de Performance” do teu avião vais recordar-te que precisas de mais pista para descolar e para aterrar. Assim, cuidado para não teres nenhum acidente ao fim da pista. O Verão pode ser traiçoeiro para nós, pilotos. Um conselho do Fernando. Q

Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ

Como sempre, um abração do

Fernando

Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve de acordo com a antiga ortografia.

Meu Caro,

Esta semana voltarei a abordar o tema dos investigadores de acidentes com aeronaves pois não é um assunto despiciendo. Afinal estes técnicos são verdadeiros baluartes da Segurança Operacional e como eu costumo dizer no encerramento de todas as crónicas, “Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação”.

Devido aos últimos acontecimentos ocorridos no domínio da aeronáutica no nosso País e a um pedido de um dos “meus Caros”, iniciarei a partir desta semana uma revisão dos códigos e dos conceitos METAR, TAF e SPECI. É um assunto não estático pois, ainda em 2008, houve uma alteração com o aparecimento dos TAF’s de 30 horas que, em devido tempo, abordámos. Não te convenças que sabes tudo sobre este tema. Provavelmente já te esqueceste de alguns pormenores. Comigo isso já aconteceu.

Farei ainda uma rectificação a um erro cometido a semana passada na identificação de um documento comunitário. Fica reposta a verdade.

Nunca te esqueças que a Informação Meteorológica de Voo deve ser procurada em:

ERRÁMOS

A semana passada errámos trocando os indicativos da legislação que pretendíamos referir. Assim, onde se lia COMMISSION REGULATION (EU) No 1178/2011, de 3 de Novembro de 2011, deveria ler-se REGULAMENTO (UE) Nº 996/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Outubro de 2010.

INVESTIGADORES DE ACIDENTES COM AERONAVES

A semana passada assumi uma postura muito crítica relativamente ao modo como, em meu entendimento, os políticos encaram com imensa ligeireza a função de investigadores de acidentes com aeronaves e o seu natural reflexo nas funções do GPIAA. Nunca te esqueças que a função dos investigadores é fundamental para a Segurança Operacional das aeronaves, quer seja um pequenino ultraleve pendular, quer seja um Airbus A380 com as suas centenas de passageiros.

De vez em quando sou solicitado por uma companhia norte-americana a apresentar a minha candidatura a funções ligadas à Aviação. Curiosamente, esta semana, o pedido de candidatura referia-se exactamente a um lugar de “Air Safety Investigator”, na Continental Motors, Inc. (CMI), a fábrica dos tão conhecidos motores que equipam imensas aeronaves de Aviação Geral.

Para não correr o risco de distorcer nada com a tradução, que me desculpem todos os meus Caros que não dominam a 100% a língua de William Shakespeare mas reproduzirei ipsis verbis os textos retirados do pedido de candidatura.

Comecemos enunciando as funções que deverá desempenhar o candidato no seu posto de trabalho:

“Investigate incidents and accidents involving aircraft equipped with engines or other products supplied by CMI, for the purpose of providing such assistance and technical data as may be requested by the National Transportation Safety Board (NTSB), Federal Aviation Administration (FAA) and foreign governmental agencies in charge of the investigation.”

Se reparares a CMI não pretende contratar um “investigador” que “investigue” todos os aspectos possíveis de um acidente. Pretendem um investigador para desempenhar funções de “investigação específica” na área dos motores! Súper especialização? Definitivamente, não! Exclusivamente uma especialização realística para as funções.

Vejamos, agora, quais as condições a que devem obedecer os candidatos em matéria de “Formação Académica e/ou Experiência”:

“Prior experience as a General Aviation Aircraft Accident Investigator preferred.

A Bachelor's degree from a 4 year university in aviation related studies or equivalent combination of education and experience. A minimum of 5 years of experience in general aviation aircraft maintenance preferred.”

Americanices? Não. Um conceito extensível à Europa pois ninguém admitiria ter “futricas”, que me perdoem esta expressão académica coimbrã, a investigar acidentes com aeronaves. Investigadores contratados a prazo é que nunca. E penso não ser preciso dizer mais nada. Q

METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – I)

Todos nós estudámos Meteorologia durante os nossos cursos de Piloto. Uns estudaram bastante, outros assim e assim e outros mesmo nada, a variante que passa por milagre em teste de cruzinhas. Este último grupo é, depois, aquele que se mata com mais facilidade em estúpidos acidentes.

Todos nós sabemos que os nossos voos devem ser preparados antes da partida. Um dos mais importantes aspectos dessa preparação é, sem dúvida a Meteorologia. Ela ditará se podemos ou não realizar o voo pretendido. Para começar teremos de conhecer as condições meteorológicas para o aeródromo de partida e para o de chegada. Se estas permitirem o voo resta-nos, ainda, conhecer as condições de tempo em rota. Porém, nesta série de artigos irei dedicar a atenção exclusivamente às condições nos aeródromos.

Matarmo-nos por desconhecimento das condições meteorológicas é que nunca, numa época em que temos a informação à distância de um chamado “Click”.

Para produzir esta série de artigos irei apoiar-me numa publicação da USAF.

Selo do Departamento da Força Aérea dos USA.

Uma publicação com a qualidade pedagógica tão típica dos anglo-saxónicos. Como se designa esta publicação? Simplesmente, “Aircrew Quick Reference to the METAR and TAF Codes”. Não se trata, pois, de um tratado de Meteorologia. Trata-se de um tutorial para descodificar METAR’S, TAF’S e SPECI’S.

Há pilotos que dizem que descodificam qualquer um destes documentos. Não será bem assim pois há códigos menos vulgares que não aparecem todos os dias e, muito menos, em certas regiões do Mundo. Assim, com toda a humildade façamos uma revisão da matéria. É sempre muito útil.

Porém, antes de começarmos o tema permite-me indicar-te uma fonte de METAR’S, TAF’S e SPECI’S. É a mesma de sempre. É o Instituto de Meteorologia. Basta ires ao site do Instituto e aproveitares a informação disponível no menu específico da “Aeronáutica”.

Por razões históricas relacionadas com a transmissão da informação, os 189 Estados e Territórios associados na World Meteorological Organization (WMO), uma Agência das Nações Unidas, produzem os citados documentos de uma forma codificada e não numa linguagem em claro. Por essa razão, nas nossas aulas de Meteorologia, aprendemos mais ou menos profundamente a descodificar um METAR, um TAF ou um SPECI. Porém, alguns países fornecem estas mensagens meteorológicas em inglês como é o caso dos USA através da NOAA. Afinal uma simples interface informática.

Comecemos pelos METAR e SPECI que são dois aspectos de uma mesma realidade. Vejamos as definições:

METAR (Aviation Routine Weather Report)

O METAR é uma observação meteorológica programada, realizada entre os 55 e os 59 minutos após cada hora. Numa linguagem comum, uma observação horária.

Exemplo:

METAR KBLV 011657Z AUTO 25015G30KT 210V290 3/8SM R32L/1000FT FG BKN005 01/M01 A2984 RMK A02 SLP

SPECI (Special Report)

O SPECI é uma observação não programada mas que obedece a um critério predefinido, como por exemplo uma mudança de condições VMC para condições IMC. Esta observação pode ser realizada entre o minuto 00 e o minuto 54 depois de cada hora. Quando é atingido o critério do SPECI durante a janela horária normal de observação - o período entre os 55 e os 59 minutos depois da hora certa – não é produzido o respectivo SPECI. As novas condições meteorológicas são codificadas como se de um METAR normal se tratasse.

Exemplo:

SPECI KBLV 011715Z 25015G30KT 210V290 3SM BR BKN015 01/M01 A2984 RMK SLP034

Vejamos daqui para a frente, duma maneira sistemática, como se procura a informação numa mensagem METAR e qual o seu significado.

METAR – Localização e Data/Hora

Como se determina a localização, a data e a hora do local de emissão do METAR?

METAR KBLV 011657Z AUTO 25015G30KT 210V290 3/8SM R32L/1000FT FG BKN005 01/M01 A2984 RMK A02 SLP034

O identificador ICAO composto pelo grupo de 4 caracteres que segue a designação do tipo de mensagem constitui o identificador da localização de emissão da mensagem. Neste exemplo a localização/estação é KBLV (Scott AFB)

O grupo de 7 caracteres que se seguem ao identificador ICAO constitui a data e a hora de emissão da mensagem. Os primeiros 2 dígitos correspondem ao dia do mês e os 4 dígitos seguintes informam-nos sobre a hora UTC, por vezes também designada por “hora zulo”. Daí o 7º carater ser um “Z”.

No presente exemplo, 01 indica que se trata do primeiro dia do mês e 1657Z a hora UTC à qual corresponde a observação.

Prosseguiremos com o tema na próxima semana. Até lá tenta rever o que aprendeste sobre este assunto nas tuas aulas de Meteorologia. Um conselho do Fernando. Q

Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ

Como sempre, um abração do

Fernando

Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve de acordo com a antiga ortografia.

Meu Caro,

Esta semana recebi diversas mensagens de suporte à prossecução da produção destas minhas croniquetas. Algumas delas levantavam-me a dúvida se porventura o seu conteúdo não teria já evitado algum acidente. Às vezes há acontecimentos que me lançam a dúvida exactamente do contrário. Será a isto que se chama “dúvida cartesiana”? Provavelmente. Talvez seja o defeito de questionar tudo na vã esperança de encontrar a Verdade. O problema é que parece que até hoje ninguém tem a certeza daquilo que pode ser considerada a verdadeira Verdade, passe o pleonasmo.

Assim permanecerei na eterna dúvida sobre a utilidade destas minhas linhas semanais perorando sobre a Segurança Operacional. Um dos meus Caros, o Manuel, incentiva-me a continuar pacientemente a acrescentar valor a esta actividade que tanto amamos, que é a aviação. Achei muito interessante esta expressão pois ela constitui a essência daquela que deve ser a nossa postura perante a Aviação. Quem não for capaz de a amar que a deixe definitivamente o mais rapidamente possível, pois assim poupar-se-ão algumas vidas.

Como eu prometi a semana passada, hoje vou dedicar uma parte da croniqueta ao “Relatório Anual de Segurança Operacional de 2011 do GPIAA”. Uma obra muitíssimo interessante mas que não pode ser descontextualizada do momento político que se vive actualmente em Portugal. Uma obra pela qual a Equipa do Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves está de parabéns. Um grande obrigado pela achega que deram à Segurança Operacional.

Para terminar, meu Caro, há quanto tempo não passas os olhos pelo teu Anexo 2? Parece-me que há para aí uns tantos aviadores que não o fazem há muito tempo. Se calhar outros nem sequer o leram, tantos são os erros que cometem. Assim, terminaremos com uma breve passagem de lembrete para uma definição que parece estar muito esquecida e com muito mau resultado! Uma definição inserta no Anexo 2 da ICAO. Para facilitar a pesquisa, esta matéria encontra-se nos Capítulos 3 e 5. Que definição? A definição de IMC – Instrument Meteorological Conditions.

RELATÓRIO ANUAL DE SEGURANÇA OPERACIONAL DE 2011 DO GPIAA

O Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves, vulgo GPIAA, teve a amabilidade de me enviar o Relatório Anual de Segurança Operacional de 2011. Sabendo dos enormes problemas, no tocante a recursos humanos, porque passa este Gabinete tão importante para a Segurança Operacional, foi com enorme expectativa que me “atirei” a este documento.

Não nos podemos esquecer desse Decreto-Lei Nº80/2012, em minha opinião verdadeiramente surrealista, que aplica o PREMAC - Plano de Redução e Melhoria da Administração Central (que melhoria?!) à área da prevenção e investigação de acidentes com aeronaves. Esta “pérola” legislativa, no seu articulado, entre outras coisas, diz:

Artigo 3.º

Órgãos

O GPIAA é dirigido por um diretor, cargo de direcção intermédia de 1.º grau, sendo -lhe aplicável o disposto nos artigos 18.º a 19.º -A e 25.º e 26.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, alterada pelas Leis n.os 51/2005, de 30 de agosto, 64 -A/2008, de 31 de dezembro, 3 -B/2010, de 28 de abril, e 64/2011, de 22 de dezembro.

Mais adiante, esta brilhante peça legislativa diz-nos que:

Artigo 5.º

Investigadores

…  …  …  …  …

2 — Os investigadores do GPIAA são providos por despacho do diretor, em regime de comissão de serviço, pelo período de três anos, renovável por iguais períodos, de entre profissionais de reconhecido mérito e comprovada experiência nas matérias atinentes à investigação de acidentes com aeronaves, sendo remunerados pelo nível 47 da tabela remuneratória única.

Lendo aquele diploma na íntegra somos obrigados a concluir que, do Quadro do GPIAA, o único funcionário efectivo é o seu Director! Tudo o resto serão funcionários requisitados. Isto, em minha opinião, é absolutamente impensável pois um Instituto como este tem de ter um quadro estável de investigadores muito experientes. Se me é permitida uma opinião, não me parece ser possível ter experiência, leia-se “Competência”, na área da “investigação de acidentes com aeronaves”, com investigadores a prazo! Isto porque, como tu sabes, mas certos políticos não, os “investigadores” têm mesmo de ser especializados. Altamente especializados. Um “investigador” tem de passar por formação constante. Nenhum “investigador” é enciclopédico ao ponto de poder investigar todos os pormenores de um qualquer acidente. Esse “pseudo-enciclopedismo” é uma característica acessível somente a “políticos” aparentados com os deuses do Olimpo. Não aos vulgares mortais que somos todos nós.

Será que os “especialistas” do PREMAC estarão cientes de que o COMMISSION REGULATION (EU) No 1178/2011, de 3 de Novembro de 2011, faz parte do ordenamento jurídico português? Afinal é um “Regulamento” Comunitário ao qual não nos podemos eximir. Esta dúvida assalta-me pois é meu entendimento que quem alguma vez leu este Regulamento do Parlamento e da Comissão nunca poderia ter escrito o Decreto-Lei Nº80/2012. Em minha opinião estes documentos colidem entre si mas o primeiro é prevalecente. Dura lex sed lex.

Não gosto de falar de cor, nem criticar por criticar. Citemos o exemplo espanhol mesmo aqui ao lado. Antes do acidente ocorrido no dia 20 de Agosto de 2008 com um McDonnell Douglas DC-9-82 (MD-82) da Spanair, ocorrido em Madrid-Barajas, o CIAIAC ou Comisión de Investigación de Accidentes e Incidentes de Aviación Civil do Ministério do Fomento de España – homólogo do GPIAA - dispunha de 6 investigadores de acidentes. (Para saberes mais sobre este acidente consulta “Informe Técnico A-032/2008”).Após este acidente o CIAIAC passou a dispor, nos seus quadros, de 14 investigadores. E não se pense que o número de acidentes/incidentes em Espanha é muito superior ao que ocorre em Portugal onde, este ano, já ocorreram cinco mortes em acidentes com aviões!

Deus permita, por todas as razões, que nunca haja no território nacional um acidente com um avião pesado de transporte ou com uma aeronave de matrícula CS no estrangeiro. Aí, o Governo vai perceber o que é abdicar de uma parte da soberania nacional e fazer uma má figura que envergonhará todos nós que, de alguma maneira, estamos ligados à Aviação.

Porque será que os diversos membros dos vários Governos Portugueses nunca se lembram que muitos deles também voam e que também podem ser vítimas dum acidente aéreo? Esquecem-se que cada um se deita na cama que faz.

E se não existe quadro para investigação o que dizer da Prevenção, esse parente pobre da sigla GPIAA? Prevenção, como não se faz de uma maneira sistemática pois isso é um luxo de países ricos, essa deixa-se a cargo da chamada “sociedade civil” esse chavão vago inventado para tapar os buracos.

Com tantas reticências é fácil cair no descrédito e não esperar qualidade de um qualquer Relatório Anual de Segurança Operacional de 2011. Quem cair nesta posição engana-se redondamente pois o documento em análise apresenta uma enorme qualidade.

Olhando para o índice deste relatório é nos dado conhecer a composição do mesmo, através dos seus capítulos:

Capítulo I – Introdução

Capítulo II – Acidentes e Incidentes ocorridos entre 2006 e 2011

Capítulo III – Acidentes e incidentes por massa máxima à descolagem certificada (MTOW)

Capítulo IV – Recomendações de segurança e Propostas de acção preventiva

Capítulo V – Actividade da investigação de segurança em Portugal

Capítulo VI – Publicações de Segurança Operacional

Nota final

Definições e acrónimos

Recomendações de segurança formuladas

Automaticamente, fui levado a fazer uma comparação deste Relatório com o muito conhecido Relatório Nall que é publicado anualmente nos USA pela Air Safety Institute.

Logo uma primeira grande diferença entre estes dois relatórios passa pelo facto do Relatório do GPIAA fazer uma análise de seis anos enquanto o americano se resume exclusivamente ao ano anterior. Com esta metodologia plurianual podemos fazer um histograma da evolução, facto que permite de alguma maneira perceber a realidade da segurança ou insegurança operacional vigente durante o período e da sua evolução. E quem está dentro do tema percebe de imediato muita coisa.

Há porém um elemento em que este relatório do GPIAA é omisso e que faz imensa falta para se obterem conclusões inequívocas. Esse elemento é o “Número de horas voadas” em cada ano. Não é despiciente a falta deste dado pois uma coisa são cinco acidentes mortais por milhão de horas de voo e outra coisa são os mesmos acidentes mortais em dez mil horas de voo.

A falta do parâmetro “Número de horas voadas”, porém, não é uma falha do GPIAA. É que parece que ninguém o conhece neste País, nem mesmo aquelas entidades que me parece terem obrigação de o conhecer!!! De certeza que não é ao GPIAA que compete fazer essa contabilidade. Recuso-me a adjectivar esta situação. De certeza que utilizaria adjectivos muito feios…

Naturalmente não vou fazer uma análise extensiva deste documento. Vou-me limitar a um pequeno apontamento sobre o “Capítulo III - Acidentes e incidentes por massa máxima à descolagem certificada (MTOW)”. Este capítulo subdivide-se por três grupos:

  • Transporte Aéreo Comercial (TPT);
  • Aviação Geral (AG) e Trabalho Aéreo (TA) com MTOM > 2.250Kg e
  • Aviação Ligeira com MTOM < 2.250Kg, que abrange a Aviação Geral (AG) e a Aviação Ultraleve (ULM), esta abaixo de 500Kg.

Neste capítulo, a Secção I - Dados Globais de Acidentes e Incidentes entre 2009 E 2011 – traça-nos uma panorâmica geral que pode ser materializada pela “Distribuição de Acidentes e Incidentes – 2009-2011”

Diagrama retirado com a devida vénia do Relatório do GPIAA.

Uma conclusão que se pode retirar de imediato é que dos acidentes ocorridos, metade teve consequências fatais. Uma relação muito desagradável pois significa que uma percentagem elevada dos acidentes foi grave ao ponto de induzir mortes.

Mas se observarmos o gráfico 17, verifica-se uma tendência decrescente de acidentes fatais, 7 em 2009, 4 em 2010 e ZERO em 2011, enquanto o número de acidentes se manteve em 2009 e 2010 (9) e decresceu 1/3 em 2011 (6). Por seu turno, os incidentes têm vindo a apresentar uma tendência linearmente decrescente desde 2009 (11 entre 2009 e 2010 e 12 entre 2010 e 2011).

Gráfico 17 retirado com a devida vénia do Relatório do GPIAA.

A caracterização dos acidentes e incidentes por tipo de operação permite obter informação mais concreta sobre a ocorrência destes eventos, cuja análise se baseia nos dados ordenados segundo a classificação constante do gráfico 19. Este gráfico mostra que o maior número de acidentes fatais (8), de acidentes não fatais (17) e incidentes (47) está agrupado apenas em dois tipos de operação: “Lazer” e “Instrução e Treino“.

Gráfico 19 retirado com a devida vénia do Relatório do GPIAA.

A conclusão do GPIAA em relação às duas últimas categorias deixa-me com a “pulga atrás da orelha”. Que instrução se anda a ministrar neste País? Caímos na tentação fácil de fazermos cursos “baratinhos”, naturalmente de qualidade duvidosa, para mantermos a “tesouraria”? A instrução é de baixa qualidade “tout court”? Ou os processos de instrução têm de ser revistos urgentemente? Não gostaria de assumir uma posição dogmática sobre este assunto. Penso que deveria ser feita uma auditoria exaustiva para podermos ter uma resposta categórica.

Neste ponto não me coíbo de citar uma frase de um Amigo, pessoa muito qualificada no tema da Segurança Operacional. Há dias atrás dizia-me ele o seguinte: “…Quanto aos mortos da nossa AG; infelizmente era previsível e tu próprio já tinhas escrito sobre isso. Deficiente formação pode ser uma das contribuintes…”. E mais não digo. Faça-se a auditoria…

Resta-me apresentar publicamente os meus parabéns à Equipa do GPIAA. Fizeram um excelente trabalho.

Meu Caro se me permitires um último conselho segue a hiperligação e faz uma leitura muito atenta do Relatório Anual de Segurança Operacional de 2011. Tens muito material para retirares ilações e se cada um de nós assumir as suas responsabilidades pode ser que “isto” melhor. Uma opinião do Fernando.Q

CONDIÇÕES DE VOO IMC (Instruments Meteorological Conditions)

Parece-me que há “rapaziada” neste País que não sabe o que são condições IMC. Para além disto esquecem-se que há muitas mortes quando se passa de condições VMC para condições IMC e não se está habilitado para o fazer.

Por definição, as condições IMC são aquelas em que não se verificam as condições VMC. Lembras-te dos parâmetros definidores destas condições? Se não te lembras está na altura de fazeres uma revisão ao teu Anexo 2 da ICAO. Em especial aos Capítulos III e IV. Olha que o saber não ocupa lugar e pode evitar-te um CFIT contra uma qualquer elevação de terreno.

MÍNIMOS VMC

Sempre que não puderes cumprir com os mínimos VMC estás dentro de condições IMC

Se não estás habilitado a voar em condições IMC não te metas em aventuras pois elas normalmente acabam muito mal pelas mais diversas razões. Abstém-te! Um conselho do Fernando. Q

Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.Q

Como sempre, um abração do

Fernando

Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve de acordo com a antiga ortografia.

Meu Caro,

Esta semana começaremos por dar notícia de mais um interessante trabalho na área da Segurança Operacional da autoria dos nossos Companheiros do GPIAA. Voltaremos ao assunto nas próximas semanas.

Seguidamente irei, mais uma vez abordar a problemática do “envelhecimento” das aeronaves, agora na óptica do fabricante Cessna, tendo especial acutilância sobre a série 100. Terminarei com um aviso da FAA sobre a fixação de ELT’s feita com fita de Velcro®. Não te esqueças que, em caso de acidente, o ELT pode ser a tua última esperança de sobrevivência.

Como notícia de última hora temos o anúncio da publicação no próximo dia 5 de Julho, por parte do BEA, do Relatório Final de Acidente do voo AF447.

Está disponível na página eletrónica do GPIAA, desde a passada segunda-feira, o Relatório Anual de Investigação de segurança 2011”, que foi elaborado em conformidade com o disposto no nº 5 do art.º 4º do Regulamento (UE) nº 996/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de outubro, relativo à investigação e prevenção de acidentes e incidentes na aviação civil.

O documento, disponível em pdf, para download, permite aos leitores:

·         Aceder diretamente aos capítulos, colocando o cursor do rato na margem direita do capítulo pretendido a partir das páginas iniciais (Nota prévia e Índice);

·         Aceder diretamente a qualquer dos temas tratados a partir do Índice;

·         Regressar ao Índice a partir do final de cada capítulo;

·         Aceder aos documentos ou processos de investigação referenciados no texto, através das linkagens existentes.

Encontra-se disponível, igualmente, uma versão do “Relatório Anual de Investigação de segurança 2011destinada à impressão para quem o pretenda fazer.

RELATÓRIO FINAL SOBRE O VOO AF447

O Bureau d’Enquêtes et Analyses pour la Sécurité de l’Aviation Civile (BEA) anunciou que finalmente, ao fim de três anos, no próximo dia 5 de Julho, durante uma conferência de imprensa, vai apresentar o Relatório Final de Acidente do voo AF447, um A330 que se despenhou no meio do Atlântico com 228 “souls on board”.

Não podemos deixar de realçar o empenho que houve na averiguação deste acidente que culminou com mais de um ano de pesquisas no fundo do oceano, a mais de 4.000 m de profundidade, das “caixas negras” da aeronave.

Ficamos a aguardar com muita expectativa por este relatório. Certamente estará recheado de ensinamentos. Q

CESSNA LANÇA UMA INICIATIVA DE SEGURANÇA PARA OS AVIÕES DA SÉRIE 100 MAIS ANTIGOS

Todos nós sabemos que a frota de aviões ligeiros mais vulgares está a atingir idades para além de tudo aquilo que seria espectável. Quem pensaria, há uns anos atrás, que aviões fabricados em 1946 continuariam a voar em 2012. Caramba, sempre são 66 anos.

Um Cessna da Série 100, uma série que se produz desde 1946.

Nestas nossas croniquetas temos abordado bastas vezes a problemática do envelhecimento das aeronaves tentando desfazer alguns mitos: ele é a corrosão, ele é a deformação mecânica que a estrutura sofre ao longo de milhares de horas de voo e respectivas manobras de descolagem e aterragem. Se fossemos hoje medir uma aeronave com esta provecta idade, encontraríamos certamente alguns desvios significativos em relação às cotas do projecto de fábrica, pura e simplesmente, devido ao uso. Por outro lado, a corrosão e a fadiga dos materiais certamente deixaram bem impressas as suas marcas. Se uma pode degradar a performance (situação perigosa em manobras marginais) as outras podem provocar a ruptura catastrófica da estrutura.

Marcas como a Cessna não podem correr riscos de verem começar a acontecer acidentes só porque produziram aviões muito bons, quantas vezes mais velhos que os próprios pilotos. Para além dos aspectos morais, há os problemas de responsabilidade civil, complicadíssimos na jurisprudência americana.

Diz-nos a Cessna através do seu Director Tom Ronnau:

Cessna Aircraft is starting an education initiative on aircraft safety for older Cessna 172 and 182 planes. The training covers supplemental aircraft inspections on Cessna single-engine planes produced from 1946 to 1986. "The intent is to not only teach them what they are looking for, but also how to identify issues that can occur more frequently with older, high-time airframes," said Tom Ronnau, Cessna's manager of technical service propeller products, in a statement.

Para te dar uma ideia do que pretende a Cessna com esta iniciativa vai ao seguinte sítio:

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=-68AdXVHHI8

e vê e ouve com atenção aquilo que o técnico tem para dizer. O que vais ver e ouvir é um simples aviso. Para saberes concretamente aquilo que deves fazer no caso do teu avião deverás consultar directamente a própria Cessna através dos canais respectivos.

Se a tua aeronave foi produzida por outro fabricante não deixes, igualmente, de ver o vídeo pois as suas generalidades aplicam-se a qualquer aeronave. Não deixes que a idade da tua máquina se torne um factor de insegurança operacional. Um conselho do Fernando. Q

LEGISLAÇÃO SOBRE A FIXAÇÃO DE EMERGENCY LOCATOR TRANSMITTERS

Infelizmente não é muito habitual ver os aviões ligeiros portugueses equipados com os chamados Emergency Locator Transmitters. Os chamados ELT’s. É pena pois eles podem salvar vidas. Como sabes, em caso de acidente com o teu avião podem ocorrer politraumatizados. Quer tu próprio, quer os teus passageiros. Num caso destes cada minuto pode ser a diferença entre a vida e a morte. É fundamental o apoio sanitário o mais breve possível após o acidente.

O País pode ter o melhor Serviço de 112 do mundo mas se os médicos e paramédicos não souberem onde tu estás aquele de nada te vale. Por isso Emergency Locator Transmitter (ELT) a bordo é fundamental para que os serviços SAR te possam localizar.

Exemplo de um modelo de ELT fixo através de uma fita de Velcro

Contudo. parece que têm surgido problemas nos aviões registados nos USA equipados com ELT’s. Assim, a FAA resolveu publicar o Special Airworthiness Information Bulletin, SAIB HQ-12-32, onde se chama a atenção para um risco de montagem que pode acabar com a inactivação do ELT. Para conheceres o seu texto completo aconselho-te muito vivamente a seguires a hiperligação. Diz-nos, textualmente, a FAA:

This Special Airworthiness Information Bulletin (SAIB) informs emergency locator transmitter manufacturers as well as installers and aircraft maintenance personnel of a concern with the ability of hook and loop style fasteners to retain their designed capability to restrain emergency locator transmitters during accident impact. In several recent aircraft accidents, ELTs mounted with hook and loop style fasteners, commonly referred to as Velcro®, have detached from their aircraft mounting. The separation of the ELT from its mount caused the antenna connection to sever, rendering the ELT ineffective.

Se esta deslocação ocorrer, pode ser perigosa pois pode parecer que o ELT está correctamente montado quando na realidade a ligação da antena está desactivada, tornando o aviónico inoperacional. Nunca te esqueças que este sistema é útil quando tiveres um acidente e quiseres comunicar ao resto do mundo que estás a precisar de ajuda, aquela ajuda que, ou chega rápida ou pode já não ser precisa. Faço-me entender? Q

Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ

Como sempre, um abração do

Fernando

Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve de acordo com a antiga ortografia.

Meu Caro,

Para hoje reservei-te uma série de assuntos bastante diferentes. Alguns bons avisos sobre segurança. Outros que, para além disso, me deixaram de boca aberta tal a estupefacção.

Por fim uma notícia de ultíssima hora: foi criado o Instituto Português do Mar e da Atmosfera.

Está disponível na página eletrónica do GPIAA, desde ontem, a NEWSLETTER 1/2012 que aborda os seguintes temas:

j  No «Editorial», o Diretor apresenta um resumo da atividade do GPIAA, no que concerne à investigação de segurança de acidentes e incidentes com aeronaves, durante o primeiro quadrimestre de 2012, a participação em reuniões e a publicação da nova Lei orgânica do GPIAA (Decreto-Lei nº 80/2012, de 27 de março)

j  Na rubrica «Aconteceu» … apresenta-se o resumo dos processos de investigação de segurança abertos;

j  Na rubrica «Divulgar é importante!», apresenta-se a relação dos processos de investigação de segurança homologados no primeiro quadrimestre de 2012, bem como a divulgação dos “Procedimentos para acompanhamento e registo das Recomendações de Segurança” e respetivo “Folheto Informativo”.

Mais um esforço dos nossos Companheiros do GPIAA em nome da Segurança Operacional. Q

FOI CRIADO O INSTITUTO PORTUGUÊS DO MAR E DA ATMOSFERA

Uma notícia de ultíssima hora: foi criado o Instituto Português do Mar e da Atmosfera. Uma união entre o IM e o IPIMAR. Estamos certos que iremos continuar com o excelente trabalho dos nossos Companheiros do Instituto de Meteorologia, pois esta é absolutamente fundamental para a nossa actividade.

Esperemos que o novel Instituto traga alguma vantagem para todos nós e não se fique por um qualquer político a querer mostrar serviço como tem ocorrido bastas vezes neste País.

Como li na Internet “…escusavam de copiar a designação norte-americana: NOAA - National Oceanic and Atmospheric Administration…”! Ver mais comentários em:

http://www.meteopt.com/forum/media/im-fundido-no-instituto-portugues-do-mar-da-atmosfera-6015-3.html

Longa vida ao Instituto Português do Mar e da Atmosfera se ele for uma situação válida para Portugal. Caso isso não aconteça resta-nos esperar pela próxima legislatura esperando que surjam pessoas mais bem informadas. Tenho alguma dificuldade de ver meteorologistas (e dos bons) misturados com carapaus…Q

UMA FONTE DE INFORMAÇÃO ONDE SE ABORDA SEGURANÇA OPERACIONAL

A Revista HINDSIGHT, de cujo corpo redactorial a NAV Portugal faz parte, é uma publicação sobre Segurança Operacional do Eurocontrol.

A Revista HINDSIGHT, publicada duas vezes por ano, destina-se a Pilotos, Controladores e outras carreiras aeronáuticas e tenta abordar questões operacionais e factores humanos. Acaba de ser publicado o seu Nº15 que contem matéria de elevado interesse. Se pretenderem consultar este, ou qualquer outro número especial, não hesitem em contactar com o nosso Caro Leitor:

Virgilio Belo

Responsável pelo Núcleo de Avaliação de Ocorrências de Segurança

Head of Air Traffic Management Safety Occurrences Investigation

Direcção de Segurança e Desempenho Operacional

Tel: +351218553475-6 e-mail: Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.

Aproveitem mais esta fonte de informação dedicada à Segurança. Um conselho do Fernando. Q

PILOTOS TRANSPLANTADOS – PERIGO OU NORMALIDADE?

Há poucos anos um dos “Meus Caros” leitores desta croniqueta travou uma enorme batalha com as autoridades aeronáuticas deste País pois não lhe renovavam a licença de voo após ter feito um transplante hepático. Nota que este nosso Companheiro não era propriamente um “kamikaze” que pretendia voar a qualquer custo pondo-se ele próprio em risco e pondo terceiros igualmente em perigo. Afinal, ele é médico e sabia bem do que estava a tratar. Conforme ele me contou foi uma luta de mais de sete anos. Porém ganhou pois houve pessoas inteligentes que acabaram por se render às evidências.

Agora recebi uma outra notícia sobre uma pessoa transplantada que recebe formação para ser PPA. A minha formação é na área da Engenharia e, como tal, não me posso pronunciar tecnicamente sobre o assunto. Limito-me a noticiar pois algum dos meus Caros pode estar nesta situação ou ter algum Amigo na mesma.

Diz-me a notícia que a nossa companheira Jennifer Julian, de 54 anos, de Castro Valley, na Califórnia, começou a sua formação e treino para a obtenção da licença de PPA depois de ter sofrido um duplo transplante de pulmões. Sem querer expender qualquer opinião, ao ler esta notícia fiquei realmente espantado. Porquê? Porque os nossos pulmões foram feitos para operar ao nível do mar e pouco mais. Ora, quando descolamos aos comandos de uma aeronave, não será propriamente para fazer “rapadas” sobre o Atlântico. Os nossos pulmões vão operar numa situação de algum esforço para oxigenar convenientemente aquele líquido vermelho que as nossas veias e artérias transportam.

A Jennifer Julian fez o seu primeiro voo solo em Outubro de 2011 e, neste momento, já tem 210 h de voo.

Desta notícia ressalta-se o facto dos especialistas de Medicina Aeronáutica americanos, certamente após certificarem-se que a Jennifer tinha condições para pilotar uma aeronave, não tiveram rebuço em dar-lhe a “licença médica” indispensável para obter a sua qualificação de piloto. Diz-nos a nossa companheira "But I want to earn the Guinness record for taking the most hours to learn to fly". E acrescenta "Remember, I've been given another chance in life, so time is a bit more flexible for me.". Acrescento: quantos de nós não pensam ou não deveriam pensar da mesma maneira?

Para saberes mais sobre este caso visita o seguinte sítio:

http://www.generalaviationnews.com/2012/05/17/from-survivor-to-student-pilot/

Que a nossa companheira Jennifer Julian faça muitos voos em total segurança é aquilo que certamente todos lhe desejamos. Q

O RISCO DE MATERIAIS IGNÍFUGOS NO COCKPIT DO AVIÃO

Na Escola onde eu aprendi a voar - a Escola do ACTV - tínhamos um director que era súper cuidadoso com todo o material de voo. Uma das “batalhas” que ele assumiu como sua foi a substituição das alcatifas e dos forros dos bancos dos diversos aviões da Escola por materiais ignífugos.

E com a colaboração de uma companhia que tinha nos seus armazéns retalhos inúteis para os seus aviões, libertámo-la destas inutilidades e equipámos todos os aviões com materiais ignífugos. Um luxo? Não. Uma operação de segurança. É que naquela altura ainda se podia fumar nos aviões…

E se fosse hoje? Estou certo que o Zé assumiria a mesma batalha e as alcatifazinhas seriam daquelas que detestam chamas. Mas será que todos pensam assim? Não! Repara-me só nesta notícia que eu recolhi na Flight Safety Information [May 22, 2012]

An OLT Express Airbus A320 made an emergency landing in Sofia, Bulgaria on 17 May after suffering cabin decompression and, subsequently, a fire in the cabin. All 147 and eight crew members evacuated the aircraft safely with no injuries, according to the Polish carrier.

The aircraft was en route from Warsaw to Hurghada, Egypt, as flight YAP7107 when cabin pressure was lost at cruising altitude and the oxygen masks deployed. The cause of the decompression has not yet been determined, the airline says.

The captain decided to make an emergency landing in Sofia.

The fire was caused by a short-circuit in an oxygen generator, which then fell onto the cabin carpet during the oxygen mask deployment. It ignited the carpet, but this was "immediately extinguished" by the cabin crew, says OLT.

Os geradores de oxigénio que equipam os actuais aviões de linha modernos são tubos que contêm lentilhas de clorato de sódio e um dispositivo de ignição. O dispositivo que inicia a reacção, quando tu dás o esticão na máscara para a colocares na cara, provoca uma libertação de calor suficientemente elevada para desencadear a reacção do clorato de sódio. Esta, por sua vez, auto-sustenta-se libertando o oxigénio e uma grande quantidade de calor.

Dentro do invólucro central está contido o clorato de sódio e à direita o dispositivo de ignição.

Naturalmente se a alcatifa não for ignífuga, ao entrar em contacto com o tubo gerador de oxigénio, tem forte possibilidade de pegar fogo. Foi o que aconteceu no Airbus A320 da OLT Express.

Meu Caro, cuidado com as tuas alcatifas e os forros das cadeiras do teu avião. Segue o exemplo do Zé. Q

A PRAGA DAS BOGUS PARTS

Já nestas minhas crónicas abordei os perigos da instalação nos nossos aviões das chamadas “Bogus Parts” ou “Peças Contrafeitas”. Estas peças, sem certificação aeronáutica, são uma verdadeira tentação para todos aqueles que querem “poupar” uns cobres. Na cadeia da instalação das “bogus parts” podem entrar diversos actores: desde aqueles que nem sabem o que são “peças contrafeitas” até aos “chico-espertos” que enganam os primeiros com “bogus parts”.

Compreendo que, para um vulgar aviador, seja difícil distinguir uma peça com certificação de uma feita num qualquer vão de escada sem qualquer tipo de verificação técnica. A única maneira de o aviador se defender passa por recorrer a oficinas de manutenção, elas próprias certificadas e garantindo o máximo de seriedade. Depois, seja o que Deus quiser!

Pôr um assunto tão complexo e que pode concorrer para a Insegurança Aeronáutica de uma maneira tão importante nas mãos de um simples fenómeno aleatório, poderá parecer completamente estulto.

Será que efectivamente o problema das “bogus parts” é assim tão frequente? É-o, o suficiente para ser perigoso. E achas que só oficinas menos habilitadas se deixam enganar por esta questão das peças contrafeitas sem certificação aeronáutica? Estás completamente enganado!!!

Repara na seguinte notícia que acabo de receber. Repara no título da mesma:

“China-made counterfeit parts found in US military aircraft”

Leste bem o título! Em projectos militares americanos foram encontradas peças contrafeitas em quantidades impressionantes! Sim. Em Cessnas ou Pipers? Não. Em aviões como os seguintes e outros:

Alenia C-27J Spartan, um avião de transporte aéreo táctico de média capacidade

A versão mais avançada do C-130: o C-130 J com as cocardas da USAF

Boeing P 8A - Poseidon

Os fabricantes destas aeronaves compram as peças a uma cadeia de empresas e, no fim, lá estava uma que, sem qualquer rebuço, comprou na China as peças não certificadas. Segundo se pode ler no relatório “...It noted that counterfeit parts change hands many times before being purchased by contractors and that "contractors may know little about the ultimate source of the electronic parts they purchase...”. Tal e qual como as técnicas de lavagem de dinheiro!

A Comissão do USA Senate, depois das suas investigações, concluiu pela existência de 1.800 peças contrafeitas num total de 1 milhão de peças. Quase 2 em cada 1000 peças.

Tem muito cuidado meu Caro com peças aeronáuticas não certificadas. Elas constituem um verdadeiro perigo. Um conselho do Fernando. Q

Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ

Como sempre, um abração do

Fernando

Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve de acordo com a antiga ortografia.