Cronicas de Segurança Aeronáutica
Segurança Aeronáutica Nº333
Meu Caro,
Para além da nossa revisão das mensagens meteorológicas, vou abordar dois temas intimamente ligados a Segurança Operacional. No primeiro abordarei os riscos da deficiente operação de um receptor de GPS. No segundo continuarei a tratar da investigação de um acidente fatal ocorrido durante um voo de instrução.
UM ACIDENTE DE NAVEGAÇÃO OU QUANDO A PRESSA DÁ EM VAGAR
Comecei a utilizar o GPS há mais de vinte anos quando fazia a “Operação Floresta”. Utilizava um Thrimble ainda bastante primitivo no qual todos os pontos da rota tinham de ser entrados em coordenadas geográficas. Ponto 1, Ponto 2, etc. Nada de bases de dados com pontos conspícuos pré-carregados. Tudo à mão.
Para além disso, visto a constelação de satélites NavSat não estar completa na altura, havia períodos de cerca de meia hora durante as missões em que se passava à navegação clássica: terreno e carta. Simplesmente, o GPS não tinha “spacecrafts” suficientes à vista para haver precisão suficiente para que os dados fossem fiáveis. Assim, o Thrimble deixava de fornecer dados de navegação.
Os receptores GPS foram evoluindo até ao estado da arte que todos conhecemos hoje. As facilidades destes instrumentos são, actualmente, mais do que muitas. Há pilotos que se deixam embalar pelo canto da sereia, e fiam-se cegamente no GPS sem cruzar a sua navegação com quaisquer outros elementos. Isto é, em minha opinião, uma postura cómoda mas que pode trazer perigos não negligenciáveis.
Meu Caro, passo a demonstrar a ideia com factos reais e dramáticos. Para tal vou-me servir de um acidente ocorrido no estado do Alaska, nas vizinhanças da cidade de Juneau. O relato é baseado no testemunho do relatório ANC11FA069 do NTSB. Como sempre, recomendo-te a leitura da versão completa deste relatório. Para o poderes fazer basta-te seguires a hiperligação.
Cessna 182P semelhante à aeronave acidentada. Fotografia da Internet.
Afinal, como se pode fazer a descrição do acidente? Simplesmente um Cessna 182P voando em condições IMC do aeródromo de Hoonah para o Juneau International Airport, um voo de cerca de 30 NM, desviou-se desta rota para a Juneau Harbor Seaplane Base. Nota que esta última, base de hidroaviões, se encontra a 6,5 NM a sudeste do Juneau International Airport. Como se perdeu este piloto? Uma história paradigmática de como não se pode ser apressado em Aviação.
Um voo que se destinava a Juneau International Airport mas que na realidade foi feito numa rota entre Hoonah Airport e o Juneau Herbor Seaplane Base. Imagem retirada do relatório do NTSB.
O nosso companheiro descolou de Hoonah Airport acompanhado da mulher que se dirigia para o Juneau International para apanhar um voo comercial. O Cessna C182 descolou de Hoonah pelas 0629 (Alaska daylight time). O piloto, apesar de voar nas condições meteorológicas citadas, não depositou qualquer plano de voo (?!).
A passageira do Cessna havia reservado um lugar no Flight 73 da Alaska Airlines, voo que partia de Juneau International às 0728. Dado que o voo do Cessna de Hoonah para Juneau International deveria demorar cerca de meia hora, estás a ver a pressa com que tudo deve ter decorrido antes da partida de Hoonah.
É interessante saber que os investigadores do acidente encontraram, junto aos destroços da aeronave, dois receptores GPS da marca Garmin: um Garmin GPSMAP 195 e um Garmin GPSMAP 495. Ambos foram enviados para o Vehicle Recorder Division do NTSB para análise dos dados gravados de modo a tentar reconstruir o voo.
Garmin GPSMAP 495 encontrado junto dos destroços da aeronave. Imagem do relatório do NTSB.
Desta análise conseguiu-se recuperar diversos minutos de dados de posição GPS quer de um, quer do outro receptor. Assim, conseguiu-se refazer todo a trajectória prosseguida durante o voo.
Da combinação dos registos de dados GPS para o dia 24 de julho de 2011, percebeu-se que a aeronave descolou às 0628 do aeródromo de Hoonah. Depois da partida, o avião tomou, supostamente, o rumo nor-noreste em direcção ao Juneau International Airport, subindo gradualmente até a uma altitude máxima de 3.619 pés, altitude GNSS. O voo prosseguiu com um heading nor-noreste sobrevoando o mar. Temporariamente a aeronave rumou a norte, subindo e descendo para ultrapassar o Robert Baron Peak, e prosseguiu o voo em direcção a Juneau, sobrevoando o Canal de Stephens.
Assim que o Cessna passou a linha de costa da Ilha de Douglas a velocidade terreno começou a diminuir numa área montanhosa abrupta. A última posição GPS foi registada às 0645:34 ADT. Esta última posição mostra que a aeronave se encontrava no local do acidente. Este facto é importante para perceber duas coisas: que o receptor GPS funcionava correctamente e que o piloto seguia a rota pré-seleccionada.
Sobreposição de imagens obtida através do Google Earth 3-D e dos dados do Garmin GPSMAP 495 através da qual se evidencia a rota seguida pelo Cessna 182P. Imagem do relatório do NTSB.
Os últimos dados GPS indicavam que o avião se deslocava a 47 mph (ground speed) com um rumo verdadeiro de 067º. As equipas de investigação determinaram que, nas vizinhanças do local do acidente, o terreno se situava a 3.900 pés msl e os destroços a 3.100 pés.
Sobreposição de imagens obtida através do Google Earth 3-D e dos dados do Garmin GPSMAP 495 cobrindo o período entre 0644:55 a 0645:31 ADT. Imagem do relatório do NTSB.
Se a aeronave fez uma rota tão linear, natural para um piloto que seguia indicação de um GPS em perfeito estado de funcionamento, porque é que o avião foi embater contra uma elevação de terreno que não era suposto estar no caminho entre o aeródromo de Hoonah e o Juneau International Airport? A razão é muito simples. Efectivamente, a análise da informação contida no Garmin GPSMAP 495 revelou que a rota pré-seleccionada não foi a anterior, mas sim entre o aeródromo de Hoonah e a Juneau Harbor Seaplane Base, uma base de hidroaviões situada a 6 milhas este-sudeste do Juneau International Airport.
Efectivamente, se a aeronave tivesse voado a rota para o pressuposto aeroporto de destino - Juneau International Airport – não sobrevoaria terreno montanhoso como aquele que acabou por sobrevoar. Um terreno situado numa linha recta entre Hoonah e a Juneau Harbor Seaplane Base.
A equipa de investigadores conclui que, não estando o Cessna 182P equipado com flutuadores, nem o seu piloto ter qualquer experiência registada de voo em hidroaviões, o acidente ficou a dever-se a uma selecção errada do aeródromo de destino. Tudo indica que, com a pressa de partir, o piloto pré-seleccionou Juneau Harbor Seaplane Base em vez de Juneau International Airport, dois aeródromos seguidos na lista da base de dados do Garmin GPSMAP 495. Como sói dizer-se: “Foi o primeiro Juneau que apareceu!”
Sempre aconselhei os meus alunos a preparar as viagens em terra com o máximo de cuidado. Com as pressas, o nosso companheiro do Alaska cometeu um erro de palmatória que custou a vida a ele e à mulher.
Diz-se em Portugal que “As cadelas apressadas parem os filhos cegos” (vox populi). Na aviação pode não se nascer cego mas acabar-se neste estado:
Estado em que acabou o Cessna 182P. Fotografia retirada do relatório do NTSB.
As pressas, às vezes, dão em vagares. Neste caso a passageira acabou por nunca apanhar o Flight 73 da Alaska Airlines. Nunca permitas que a tua pressa belisque a Segurança Operacional. Um conselho do Fernando. Q
INSTRUÇÃO, CONTROLO E ACIDENTE – (Parte – V)
Na crónica anterior, quando analisei mais uma parte do “Relatório de Acidente” do Air Accident Investigation Branch – UK (cuja leitura já te recomendei e que poderás fazer na página 70 do AAIB Bulletin: 7/2007 ), informei que o aluno do Cessna C150, um aluno com 15 horas de experiência e realizando o seu segundo voo solo, havia reportado às 1526:30 hrs a “Final”. Nesse momento a posição relativa do Cessna e do Piper Malibu – o tráfego conflituante - era aquela que se pode ver na figura seguinte.
Localização e caminhos percorridos pelo G-BABB e pelo N347DW às 1526:61 hrs. Imagem retirada do Relatório.
Ao reporte de “Final” pelo aluno, o ADC (aerodrome controler) respondeu:
“GOLF BRAVO BRAVO ROGER AND ER MAINTAIN RUNWAY CENTRELINE BUT GO AROUND ER CIRCUIT HEIGHT ONE THOUSAND FEET THERE’S FAST TRAFFIC BEHIND TO LAND”
Pouco depois para resolver a potencial situação de conflito o ADC instruiu novamente o aluno com a seguinte comunicação:
“ER GOLF BRAVO BRAVO DISREGARD THAT JUST TAKE A LEFT TURN AND FLY NORTH I’LL CALL YOU BACK IN VERY SHORTLY ”
Isto, na prática, correspondeu a, com avião configurado para a aterragem, o piloto tivesse de iniciar uma volta para a esquerda. Uma manobra para a qual certamente o aluno não tinha proficiência suficiente.
Continuemos, agora, a nossa análise a partir do momento em que o aluno é instruído para voltar 90º pela esquerda.
Às 1526:30 hrs o APC (approach controller) instruiu o comandante do Piper Malibu Seven Delta Whiskey com a seguinte comunicação:
“NOVEMBER SEVEN DELTA WHISKEY DO YOU HAVE THE AIRFIELD IN SIGHT”.
Ao que este repondeu:
“HAVE THE AIRFIELD IN SIGHT ER TURNING FINAL SEVEN DELTA WHISKEY”.
Às 1526:40 hrs o APC comunicou
“SEVEN DELTA WHISKEY ROGER THERE IS CESSNA TRAFFIC AHEAD OF YOU RANGE OF ONE MILE CLEARED VISUAL APPROACH AND ER CONTINUE”
Quanto a mim, esta comunicação parece-me algo desactualizada pois cerca de 30 segundos antes o G-BABB havia sido instruído para voltar pela esquerda com um rumo ortogonal ao rumo da “Final”. Contudo, podemos estar perante um simples aviso de alerta. Mas este alerta é lançado com muito pouca antecedência visto que, a diferença de velocidade das duas aeronaves, “One mile” é percorrida em alguns segundos.
Às 1526:50 (10 segundos depois da comunicação anterior) o APC transmitiu:
“NOVEMBER SEVEN DELTA WHISKEY THAT CESSNA TRAFFIC COMMENCING A GO-AROUND AND ER CONTINUE APPROACH”
Ao que o piloto-comandante do Seven Delta Whiskey respondeu:
“SEVEN DELTA WHISKEY LOOKING FOR THE TRAFFIC AND CONTINUE THE APPROACH”
Dez segundos depois, às 1527:00 hrs, o APC instruiu o piloto-comandnate do Malibu da seguinte forma:
“NOVEMBER SEVEN DELTA WHISKEY CONTACT SOUTHEND TOWER ONE TWO SEVEN SEVEN TWO FIVE”
Entretanto, no mesmo instante, às 1527:00 hrs, o ADC, não tendo recebido qualquer resposta à sua comunicação feita para o G-BABB quarenta ou cinquenta segundos antes, transmitiu:
“GOLF BRAVO BRAVO JUST TO CONFIRM TURN NORTHBOUND NOW”
O ADC, como continuasse a não obter resposta do aluno que pilotava o G-BABB, insistiu:
“GOLF BRAVO BRAVO TURN NORTH CONFIRM”
Só perante esta insistência o piloto do Cessna respondeu:
“BRAVO BRAVO TURN NORTH ”.
A esta confirmação do aluno o ADC respondeu-lhe com a seguinte comunicação:
“THANKS I’LL BRING YOU BACK IN BEHIND THE OTHER TRAFFIC THANKS FOR YOUR HELP”.
Momentos depois o N347DW chamou a “Tower” na respectiva frequência e anunciou:
“SOUTHEND TOWER JETPROP THREE FOUR SEVEN DELTA WHISKEY WITH YOU FOR ZERO SIX WE HAVE THE ER TRAFFIC IN SIGHT ON ER GO AROUND”
Ao que o ADC respondeu:
“NOVEMBER THREE FOUR SEVEN DELTA WHISKEY SOUTHEND TOWER GOOD DAY RUNWAY ZERO SIX YOU’RE CLEARED TO LAND THE SURFACE WIND ZERO SEVEN ZERO DEGREES NINER KNOTS”
O piloto deu o “acknowledge”.
Se me é permitido fazer uma nota à comunicação do ADC enfatizo a seguinte parte: “The Surface Wind Zero Seven Zero Degrees Niner Knots”. E porque é que eu enfatizo isto? Simplesmente para realçar que o aluno que pilotava o G-BABB, ao virar pela esquerda para 330º viu a sua VAV diminuir dada a componente de cauda do vento.
Às 1527:40 o ADC transmite para o Cessna a seguinte Instrução:
“GOLF BRAVO BRAVO YOU CAN TU- (PART WORD) MAKE ER A LEFT TURN AND ORBIT BACK ONTO FINAL APPROACH”
Por outras palavras: Completar a volta de 360º. A esta instrução o aluno respondeu:
“GOLF BRAVO BRAVO MAKE LEFT HAND TURN ONTO FINAL APPROACH”
Pode ler-se no Relatório que o instrutor do aluno-piloto aos comandos do G-BABB afirmou ter ficado ansioso visto a visibilidade estar a reduzir-se numa situação de sol aberto e névoa. Confirmou ainda, aos Investigadores, ter ficado preocupado pelo facto de o aluno não estar familiarizado com a manobra de interromper a “final” voltando pela esquerda para Norte. A sua preocupação principal residia no facto de o aluno se poder desorientar ao executar uma manobra destas. Assim, ele tomou a decisão de voltar a telefonar à “Torre”, quando o aluno regressasse novamente a uma segunda “final”, para pedir que o controlador o instruísse a fazer uma aterragem “full stop” pois dava por terminada a missão de treino.
Esta ansiedade, uma ansiedade de instrutor experimentado, tinha toda a razão. Usando binóculos ele observou o Cessna a afastar-se seguindo uma trajectória paralela e em sentido contrário à “perna base” do circuito. Verificou ainda que a aeronave seguia uma linha de voo mais baixa do que seria aconselhável, com uma atitude de nariz em cima e baixa velocidade. Viu, ainda, o avião inverter o rumo, fazendo uma volta muito apertada, para, depois, entrar numa “spiral dive” da qual adivinhou não haver recuperação possível.
Diz-nos o relatório do Air Accident Investigation Branch (UK) de uma forma que não traduzo para não perder qualquer pormenor na tradução:
The aircraft was seen by several witnesses to descend vertically into Eastwood Park, a public park approximately 0.5 nm north of the final approach track, where it struck the ground still rotating. The student pilot was fatally injured.
Tal como diz antes de cair o pano, de uma forma ultra trágica, uma das personagens no grande final da ópera “Os Palhaços”, de Ruggero Leoncavallo, “ – La Commedia è finita!” .
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Local de embate da aeronave com o solo no Parque de Eastwood, 0,5 milhas a norte da “Final”. Imagem Google Earth.
Estava consumada a tragédia de um voo de instrução de um jovem de 16 anos.
Para a semana prosseguiremos com a análise do Relatório para aprender qualquer coisa com este acidente. Ele é rico em ensinamentos. Q
METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – XI)
Prosseguimos hoje com a revisão dos códigos das mensagens TAF’s, essas mensagens que nos permitem ter uma noção das condições meteorológicas futuras num dado aeródromo.
LOCALISAÇÃO
TAF
KBLV 051212 14005KT 8000 BR FEW030 WS010/18040KT QNH2960INS
BECMG 1314 16010KT 3200 -SHRA OVC020 QNH2959INS
TEMPO 1416 21015G30KT 1600 TSRA BKN008CB OVC020
BECMG 1617 29008KT 3200 -RA OVC030 620304
QNH2958INS
BECMG 1819 31012G22KT 9999 NSW SCT040 WSCONDS
520004 QNH2952INS
BECMG 2021 30008KT 9999 SKC QNH2950INS T08/18Z
M01/11Z
A primeira informação que nos importa ler num TAF é a localização, ou seja, a qual aeródromo a informação meteorológica diz respeito.
Imediatamente a seguir à identificação do tipo de mensagem – no caso vertente um TAF – surge um conjunto de 4 caracteres que identifica o aeródromo para o qual o TAF é aplicável. KBLV no caso vertente. Concretamente a Base Aérea de Scott, no Illinois.
Para a semana prosseguiremos com esta nossa revisão das mensagens meteorológicas. Até lá sempre que fores voar não deixes de consultar a informação meteorológica em:
Um conselho do Fernando. Q
Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ
Como sempre, um abração do
Fernando
Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve segundo a ortografia do Acordo Ortográfico de 1945.
Segurança Aeronáutica Nº331
Meu Caro,
Devido a um embaraçoso erro vou começar esta crónica com uma rectificação ao tema debatido a semana passada sob o título “Uma Sequência de Emergência – Rearranque do Motor em Voo”.
Depois prosseguiremos com a análise do acidente que levou à morte um jovem piloto durante o seu segundo voo solo. Um acidente ocorrido no aeroporto de Londres – Southend com um Cessna C150. Um acidente do qual se podem retirar muitas ilações.
Fecharei a crónica com a primeira análise dos códigos das mensagens TAF, uma matéria para aprender ou relembrar.
Foram comunicadas esta semana, à comunidade aeronáutica, por parte da NAV, as seguintes alterações:
A new AIC 006/2012 subject "NOTICE OF MANDATE FOR DATA LINK SERVICES IN THE NORTH ATLANTIC REGION" was published and replace AIC 005/2012 and can be found in EAD PAMS and at the following link: AIS Website
New AIRAC AIP Amendment 005-12 Effective from 15NOV2012 can be found for viewing and/or download in EAD PAMS and at the following link: - AIS Website.
Para conheceres o detalhe desta informação basta seguires as hiperligações.
UMA SEQUÊNCIA DE EMERGÊNCIA – REARRANQUE DO MOTOR EM VOO (RECTIFICAÇÂO)
No 4º Passo – Potência do Motor (Posição do Throttle) eu afirmava, despudoradamente, o seguinte disparate:
“Tal como o arranque normal no aeródromo, o rearranque do motor em altitude também deve ser realizado com o throttle totalmente à frente, posição de máxima potência do motor.”
Felizmente um dos “Meus Caros” – obrigado Vitor pela tua colaboração - imediatamente rectificou a situação. Uma distracção vergonhosa da minha parte. Na realidade, pelo menos nas linhas Piper e Cessna, o arranque do motor na placa não se faz de throttle na posição de potência máxima mas, sim numa posição ligeiramente avançada. Exemplifiquemos com o checklist de um Cessna C172N:
PÔR EM MARCHA
1. carburador - Cold
2. MISTURA - Rich
3. PRIMER - 2 injecções se o motor estiver frio
4. MANETE DO GÁS - 1cm à frente
5. BATERIA - ON
6. BEACON - ON
7. CAMPO DO HÉLICE - Livre
8. STARTER - Actuar (largar quando o motor pegar)
9. PRESSÃO DO ÓLEO - A subir (máximo em 30 segundos)
10. MANETE DO GÁS - 1.000 RPM
11. ALTERNADOR - ON
12. AVISADOR LOW VOLTAGE - OFF
13. AMPERÍMETRO - A indicar carga
Lá está, preto no branco, “MANETE DO GÁS - 1cm à frente” . Fui eu próprio quem produziu este documento do avião para a frota do ACTV. Agora pratiquei uma lastimável distracção, fruto certamente da PDI…
Por outro lado, se consultares a página 4-7 do manual do Cessna C152 verás que o fabricante te diz no módulo dedicado ao procedimento do
Que me desculpem os leitores por esta falha. Porém, para além da manobra de arranque do motor no solo, coisa que qualquer piloto no activo não deve ter dúvidas, interessava-me desfazer dúvidas, sim, para a manobra de rearranque do motor em voo.
Nos POH ou Owner Manual dos aviões que pilotei, esta manobra de rearranque do motor em voo não era descrita. Por isso, com a ajuda do Zé, diversifiquei as minhas fontes de informação para saber qual a melhor posição do throttle (potência) para efectuar a manobra. Elas, porém, não são unânimes. Assim, resolvi deixar à vossa consideração as diversas filosofias de rearranque do motor em altitude. Na sua essência não são muito diferentes, como não podia deixar de ser. Vejamos:
Para o Cessna C172N a North Texas Flight Academy
http://www.northtexasflightacademy.com/files/MemorizationItemsCessna172NP.pdf
recomenda
3. Engine Failure: In Flight (Restart Procedure)
- Airspeed - 65 KIAS
- Carburetor Heat - ON
- Fuel Selector Valve - BOTH
- Mixture - RICH
- Power – IN HALF WAY
- Primer –IN & LOCKED
- Master Switch - ON
- Ignition Switch - BOTH
§ If propeller is spinning engine should start up
§ If propeller has stopped you must try to start the engine using the key
Para o Cessna C172RG o Aeroclube “Flying Particles” de Livermore, California,
http://williams.best.vwh.net/172RG_POH/3-4.html#ENGINE%20FAILURE%20DURING%20FLIGHT
recomenda:
1. Airspeed -- 75 KIAS.
2. Carburetor Heat -- ON.
3. Fuel Selector Valve -- BOTH
4. Mixture - - RICH.
5. Ignition Switch -- BOTH (or START if propeller is stopped).
6. Primer -- IN and LOCKED.
Neste caso o Aeroclube “Flying Particles” nada diz sobre a posição do throttle na resolução desta emergência.
No tocante, agora, a um avião da linha Piper - Piper PA 28-181 (Cherokee Archer II) - o mesmo Clube diz o seguinte:
ENGINE OUT EMERGENCY
1. Establish best glide – IAS 87 MPH, 76 K
2. Note wind – Select landing field
3. Carb Heat – ON
4. Mixture – RICH
5. Fuel selector valve – CHECK/SWITCH
6. Primer – LOCKED
7. Magnetos – CHECK
IF RESTART IMPOSSIBLE
MAYDAY on 121.5
Report position
Belt & harnesses – TIGHTEN
Passengers – WARN
Throttle – CLOSE
Fuel Selector Valve – OFF
On Short Final
Door – OPEN
Master & Ignition – OFF
Mais uma vez nada se diz em relação à posição do throttle para realizar a manobra de rearranque.
Vejamos o que, por sua vez, nos diz o POH do fabricante para este mesmo avião:
“3.6 ENGINE POWER LOSS IN FLIGHT
Complete engine power loss is usually caused by fuel flow interruption and power will be restored shortly after fuel flow is restored. If power loss occurs at a low altitude, the first step is to prepare for an emergency landing (refer to paragraph 3.13). An airspeed of at least 76 KIAS should be maintained.
If altitude permits, switch the fuel selector to another tank containing fuel and turn the electric fuel pump “ON.” Move the mixture control to “RICH” and the carburetor heat to “ON.” Check the engine gauges for an indication of the cause of power loss. Check the engine gauges for an indication of the cause of the power loss. Check to ensure the primer is locked. If no fuel pressure is indicated, check the tank selector position to be sure it is on a tank containing fuel.
When power is restored move the carburetor heat to the “OFF” position and turn “OFF” the electric fuel pump.”
Novamente nada se diz em relação à posição do throttle para realizar a manobra de rearranque.
Relativamente ao Piper Arrow 200 a Bridge Water State College
Diz-nos:
ENGINE POWER LOSS IN FLIGHT
Airspeed - BEST GLIDE
Heading - NEAREST AIRPORT
Throttle - CHECK FULL FORWARD
Mixture.- RICH
Alternate Air - OPEN
Fuel Pump - ON
Fuel Selector - SWITCH TANKS
Ignition - CHECK BOTH - ON
Land.-.AS SOON AS POSSIBLE
Checklist.- COMPLETE
ENGINE FAILURE IN FLIGHT / AIR RESTART
Airspeed -.BEST GLIDE
Fuel Selector -.SWITCH TANKS
Fuel Pump -.ON
Mixture.-.RICH
Alternate Air - OPEN
Engine Gauges.-.CHECKED
Ignition .-.CHECK BOTH ON (Engage If Propeller Stopped)
IF NO RESTART:
Forced Landing Checklist - EXECUTE
Checklist.- COMPLETE
Neste caso não se diz taxativamente no “Engine Failure in Flight / Air Restart” que o throttle deve estar completamente à frente. Porém, no checklist do “Engine Power Loss In Flight” diz-se “Throttle - CHECK FULL FORWARD”.
É minha opinião, porém, que não se deve tentar o rearranque com o motor em “idle” pois o piloto pode não se aperceber do real arranque do motor. Assim, parece-me que a posição do throttle deve corresponder a um intervalo de potência entre a potência de cruzeiro e o “full power”. Penso que, numa situação real deste tipo de emergência, o bom senso e experiência do piloto contarão sempre imenso.
Volto a referir que não deves experimentar fazer o treino desta manobra sem teres um instrutor a bordo. Para além disso, se alguma vez vieres a fazer este treino, deverás fazer a experiência à vertical de um aeródromo e a altitude suficiente. Nota que, se o motor não pegar, vais ter de fazer uma aterragem de motor parado o que é sempre uma manobra não aconselhável a principiantes. Cuidado pois. Um conselho do Fernando.Q
INSTRUÇÃO, CONTROLO E ACIDENTE – (Parte – III)
Na crónica anterior vimos que o aluno no Cessna C150 G-BABB tinha ficado parado no HOLDING POINT C1 do aeródromo de Southend esperando a descolagem de um BAe 146 que ocorreu às 1517 hrs. Para não perdermos a ideia vejamos, na figura seguinte, a posição de C1 em relação à pista 06.
Southend Airport. Origem AIP [UK]. Não serve para fins operacionais.
O Holding Point C1 encontra-se indicado na ponta da seta.
No relatório de acidente do Air Accident Investigation Branch pode ler-se a seguinte informação que traduz a prática dos voos das aeronaves ligeiras neste aeródromo de Londres:
“Light aircraft such as G-BABB would usually commence their takeoff roll from the intersection of Holding Point C1 with Runway 06. Although this is 376 m from the start of the runway, it still permits a takeoff run of 1,083 m, which is considerably more than G-BABB required in the prevailing conditions. However, the departure of a light aircraft such as G-BABB following a larger aircraft such as the Bae 146 must be delayed in order for the disturbance of the air in the wake of the preceding aircraft (‘wake turbulence’) to diminish. In this case the minimum spacing is two minutes if both aircraft depart from the same point, or three minutes if the following aircraft departs from an intermediate point.”
Para resolver o problema da “wake turbulence” deixada pelo quadrimotor que tinha descolado na pista 06 a Torre instruiu o piloto, no seu segundo voo solo, da seguinte maneira:
“...as G-BABB approached the holding point, the ADC instructed the student “to minimise vortex delay runway 06 enter backtrack line up”, intending that the student should enter the runway and taxi to the beginning of Runway 06.”
Esta Instrução da Torre, apesar de absolutamente natural e correcta, veio introduzir mais um factor de ruído num piloto completamente rotinado em descolar da intersecção do Holding Point C1. Perante a instrução recebida da Torre o aluno fez o seguinte read back:
“The student then read back “BRAVO BRAVO ZERO SIX BACKTRACK”.
Afinal, esta mudança num piloto sem experiência, pode ter sido dramática pois alterou todos os pontos de referência da descolagem da aeronave. Queres ver o resultado desta mudança de ponto de descolagem? Voltemos ao texto do Relatório para perceber qual foi a manobra que o aluno-piloto executou.
“Later, when the ADC saw that, rather than entering the runway as instructed, the student had manoeuvred the aircraft at the holding point until it was facing back along the taxiway in a north-easterly direction, he transmitted “GOLF BRAVO BRAVO ER REPORT YOUR INTENTIONS”.
Em vez de fazer backtrack na pista 06 o aluno começa a fazer backtrack no taxiway onde estava estacionado. Poderás dizer-me, chegado a este ponto, que o piloto não tinha experiência para voar sozinho ou não tinha qualidades para piloto. Na realidade não era esta a situação. Tratava-se, sim, de um piloto somente com 15 hrs de experiência no seu segundo voo solo.
Perante a confusão do aluno o controlador da Torre explicou-lhe o erro que ele estava a cometer voltando a instrui-lo do seguinte modo:
“GOLF BRAVO BRAVO JUST ENTER THE RUNWAY AND LINE UP AS NORMAL”.
Deste modo o ADC trazia o aluno à sua rotina normal para, depois, lhe dar a clearance de descolagem:
“At 1520 hrs the ADC transmitted “GOLF BRAVO BRAVO LEFT HAND CIRCUIT ZERO SIX CLEARED FOR TAKEOFF SURFACE WIND ZERO EIGHT ZERO DEGREES EIGHT KNOTS”.
Tendo percebido correctamente a clearance o aluno faz o seguinte readback:
“BRAVO BRAVO CLEAR TAKEOFF LEFT HAND CIRCUIT”.
Penso que, tendo em atenção a minha experiência de aluno que também fui, neste momento o novel piloto já devia ter uma boa dose de “baralhação”.
Como informação complementar podemos referir que, no momento da descolagem do G-BABB, não havia mais nenhuma outra aeronave no circuito do aeródromo.
Para corroborar algo que digo atrás, vejamos qual a opinião do instrutor que assistia à manobra do Cessna C150, plasmada no próprio Relatório:
“…He considered that the flight was progressing normally and that the aircraft was maintaining the correct height...”.
Que ilações principais podemos, em minha opinião, tirar até ao momento?
Um aluno com 15 horas de voo, ao fazer o seu segundo voo solo, é retirado das suas rotinas habituais. Como resultado começa a ficar baralhado e a ter dificuldade de executar as instruções do ADC.
Contudo, as verdadeiras grandes complicações ainda estavam para vir. Continuaremos na próxima croniqueta. Q
METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – IX)
Nesta croniqueta vamos começar a analisar os códigos dos TAF’s. Para começar vamos descodificar a sigla TAF. Esta sigla significa Terminal Aerodrome Forecast ou seja, a previsão meteorológica para um dado aeródromo, para um período específico. Normalmente um período de 24 horas. Contudo, a partir do ano passado, passaram a ser também disponibilizados TAF’s de 32 horas. Em Portugal estão disponíveis para LPPT e para LPPS.
FORMATO STANDARD DE UM TAF (Terminal Aerodrome Forecast)
Todas as mensagens referentes a uma “Terminal Aerodrome Forecast” começam pelo código TAF.
TAF
KBLV 051212 14005KT 8000 BR FEW030 WS010/18040KT
QNH2960INS
BECMG 1314 16010KT 3200 -SHRA OVC020 QNH2959INS
TEMPO 1416 21015G30KT 1600 TSRA BKN008CB OVC020
BECMG 1617 29008KT 3200 -RA OVC030 620304 QNH2958INS
BECMG 1819 31012G22KT 9999 NSW SCT040 WSCONDS 520004
QNH2952INS
BECMG 2021 30008KT 9999 SKC QNH2950INS T08/18Z M01/11Z
FORMATO STANDARD DE UM TAF AMD (Amended Aerodrome Forecast)
Vejamos, agora, uma variante deste formato a do TAF alterado
TAF
KBLV AMD 051812 21015G30KT 0800 TSRA BKN008CB OVC020
BECMG 1819 29008KT 1600 -RA OVC030 620304 QNH2958INS
BECMG 1920 31012G22KT 9999 NSW SCT040 520004 QNH2952INS
BECMG 2021 30008KT 9999 SKC QNH2950INS T08/18Z M01/11Z
AMD 1820
Se repararmos, à frente do código identificador do aeródromo, existe o código AMD uma sigla para Amended Aerodrome Forecast. Um AMD é emitido quando a previsão meteorológica do TAF já não é representativa da situação meteorológica presente ou futura. Um TAF alterado sobrepõe-se sempre ao TAF emitido previamente. No exemplo de cima, AMD 1820 significa que a previsão foi revista às 1820Z . Ao ler um TAF corrigido deve sempre ter-se em atenção ao código da hora assinalado no fim do TAF para verificar qual é a informação mais actual.
Na próxima croniqueta prosseguiremos a nossa análise dos códigos dos TAF’s. Q
Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ
Como sempre, um abração do
Fernando
Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve segundo a ortografia do Acordo Ortográfico de 1945.
Segurança Aeronáutica Nº330

Meu Caro,
O Outono chegou e provavelmente a meteorologia vai tornar-se mais complicada do que no Verão. Naqueles dias em que não der para voar há sempre uma possibilidade de continuares a praticar Aviação. Sabes como? Fazendo revisões daqueles temas que já aprendeste há muito tempo e/ou estudando outros temas sobre os quais nunca te debruçaste. É assim que melhoramos o nosso airmanship. De seguida encontrarás a minha colaboração para te facilitar a tarefa.
UMA SEQUÊNCIA DE EMERGÊNCIA – REARRANQUE DO MOTOR EM VOO
Há muitos anos atrás fazia parte do treino dos PPA’s fazer SAF’s para a pista com o motor parado. Analisando bem a manobra não a podemos entender como um verdadeiro SAF (Simulação de Aterragem Forçada) pois, na realidade, ela era uma “Aterragem Forçada”. Nessa altura, em muitos casos, a instrução era feita em Piper’s Cub que não dispunham de motor de arranque. Uma vez parado o motor, o piloto tinha de aterrar a aeronave como se de uma situação de emergência se tratasse. Isto acabava por ser perigoso pois, se as coisas não corressem bem, tínhamos um acidente.
Quando fiz a minha formação de voo a prática já não era esta. Faziam-se, sim, verdadeiros SAF’s com o motor em “idle” mas sempre disponível em caso de necessidade. Como tal nunca treinei verdadeiramente a emergência de “rearranque do motor em voo”. Esta semana recebi uma publicação da AOPA USA na qual era exposto um conjunto de procedimentos para realizar o rearranque do motor em voo, numa situação de emergência. Uma ladainha de seis pontos fáceis de decorar, importantes lá em cima depois de uma paragem de motor, voluntária ou involuntário.
Para a execução desta ladainha de emergência começa-se de baixo para cima, do fundo do cockpit, ao centro, em direcção ao fundo do painel de instrumentos. Atingido este ponto, o piloto começa a executar os diversos passos da direita para a esquerda. Nota que há aeronaves que, devido à ergonomia do seu cockpit, a execução espacial dos procedimentos poderá não ser exactamente esta. Contudo, podemos tomar esta descrição das manobras como uma situação típica e vulgar.
Sentido de execução das manobras para o rearranque do motor.
1º Passo – Selecção do Tanque de Combustível
Comutar a válvula de combustível para o depósito mais cheio.
Entra outras razões, o motor pode ter parado por se ter consumido todo o combustível do depósito seleccionado. Para ultrapassar uma eventual situação destas ou outra, a primeira operação que o piloto deverá executar é seleccionar a válvula de combustível para a posição do depósito mais cheio. Se pensarmos na linha Cessna, sabemos que podemos ter aviões em que não é possível fazer selecção de depósitos (Modelos C150 ou C152) ou aeronaves em que é possível realizar essa selecção. Contudo, nos aviões com válvula de 4 posições – Off, Left, Right e Both – de acordo com o fabricante deve sempre voar-se com a válvula na posição “Both”. Porém, há que decidir de uma forma criteriosa. Efectivamente, dever-se-á seleccionar a válvula para a posição “Both” desde que não haja uma fuga declarada de combustível num dos tanques. Se houver fuga o piloto deverá seguir a regra de comutar a válvula para o depósito avariado de modo a consumir todo o combustível disponível no momento. Caso comutasse a válvula para o depósito não avariado, o outro depósito perderia todo o combustível sem qualquer utilidade energética. Decisões a tomar caso a caso conforme a situação real da emergência.
2º Passo – Aquecimento do Carburador
Deslocando a atenção do fundo do cockpit para a parte inferior do painel de instrumentos, seguindo o eixo central da aeronave
Aquecimento do Carburador.
Se é prática corrente, indicada nos “checklists” das aeronaves, fazer-se o arranque do motor sem aquecimento do carburador, em altitude poderemos estar em situação de baixas temperaturas que poderão ser propícias à formação de gelo no carburador. Assim, será mais seguro fazer-se o rearranque do motor com o ar quente aplicado ao carburador. Nunca te esqueças que poderemos ter condições de formação de gelo mesmo com temperaturas positivas da atmosfera. Basta que as condições de humidade – dew point – sejam desfavoráveis.
3º Passo – Mistura
Depois de meter ar quente ao carburador passemos ao procedimento de regulação da mistura.
Afinação da Mistura.
O regulador da mistura deverá ser colocado na posição “Full Rich” para um correcto rearranque do motor. Porém, o piloto deverá encarar a possibilidade de não colocar o comando da mistura em “Full Rich”, empobrecendo a mesma, se a aeronave se encontrar a uma altitude razoável. Numa situação destas, posicionar este comando em “Full Rich” poderá enriquecer demasiado a mistura Combustível/Ar dificultando o arranque do motor
4º Passo – Potência do Motor (Posição do Throttle)
Regulada a mistura a operação seguinte será a regulação da potência do motor através da posição do throttle.
Regulação da Potência através da posição do throttle.
Tal como o arranque normal no aeródromo, o rearranque do motor em altitude também deve ser realizado com o throttle totalmente à frente, posição de máxima potência do motor.
5º Passo - Primer
No caso do rearranque do motor em altitude não se deve accionar o primer. Aliás, no chão, poderá também haver situações em que este dispositivo não deverá ser utilizado.
Primer todo metido dentro e bloqueado.
Deste modo, o botão do primer deverá estar todo deslocado à frente devendo, ainda, o piloto certificar-se de que o primer está na posição “bloqueado”.
6º Passo – Magnetos e Motor de Arranque
Concluídos os passos anteriores o piloto deverá ligar os magnetos se estes não forem comandados pela chave de ignição do avião. Se estes forem comandados por esta chave o piloto deverá tentar o rearranque do motor accionando o motor de arranque através do interruptor controlado pela chave da aeronave.
Accionamento do motor de arranque através da chave da ignição.
Resumindo a ladainha de rearranque do motor em altitude temos:
Selecção do Tanque de Combustível – TANQUE COM MAIS COMBUSTÍVEL
Aquecimento do Carburador - ON
Mistura - RICH
Potência do Motor (Posição do Throttle) – FULL POWER
Primer – IN and LOCKED
Magnetos e Motor de Arranque - RESTART
Neste momento estarás, certamente, com vontade de me perguntar: “ – Como se treina esta emergência?”. Em minha opinião, com um instrutor a bordo, com a aeronave a uma razoável altitude (alguns milhares de pés), sempre à vertical de um aeródromo. Depois de uma volta de demarcação de 360º para te certificares que não está nenhuma aeronave por baixo, pára o motor. De imediato manobra o avião para a velocidade de “best glide” ou “best think rate”. Depois, cumpre os 6 passos da ladainha e rearranca o motor. Se a manobra não resultar à primeira, tenta uma segunda vez. Caso contrário prepara-te para realizares um SAF. Não tentes treinar esta manobra de emergência sem ser à vertical de um aeródromo pois não é prudente e pode acabar mal. Segurança acima de tudo. Um conselho do Fernando.
INSTRUÇÃO, CONTROLO E ACIDENTE – (Parte – II)
Na crónica anterior começámos a analisar um acidente ocorrido no Reino Unido – aeroporto de Southend – em que um jovem piloto de 16 anos, no seu segundo voo solo, perdeu a vida ao voar um Cessna C150 no circuito de aeródromo.
Segundo o modelo do “Queijo Suiço” proposto pelo psicólogo inglês James T. Reason da Universidade de Manchester, todas as grandes áreas da aviação têm um “buraco” com consequências directas na Segurança Operacional, “buraco” este que pode levar ao acidente. Porém se uma área falha, em princípio as outras áreas não vão falhar e o acidente acaba por não ocorrer. Ilustremos a ideia.
A falha de uma área pode ser bloqueada por outra área que não deixa propagar o risco de acidente.
Esta é a situação ideal mas, infelizmente, as coisas nem sempre correm assim. A trajectória de erro, por vezes, alinha-se. Foi o que aconteceu no caso em análise.
Depois de duas voltas de pista executadas correctamente pelo aluno o instrutor achou-o capaz de iniciar o seu segundo voo solo. Porém, antes de abandonar a aeronave o instrutor – às 1505hrs -fez a seguinte comunicação com a Torre:
“GOLF BRAVO BRAVO CLEAR AT ALPHA PLEASE FOR SOLO CIRCUITS ”
ao que o ADC replicou:
“APPROVED ”
Salvo melhor opinião, a partir desta comunicação, o ADC ficou informado de que a partir daquele momento os voos seriam feitos a solo pelo aluno.
Às 1508hrs é já o aluno que faz com a Torre a seguinte comunicação:
“BRAVO BRAVO TA XI FOR CIRCUIT SOLO CIRCUIT PLEASE”.
A Torre instrui-o então para taxiar para HOLDING POINT C1 do aeródromo.
Diz-nos o relatório do Air Accident Investigation Branch – UK o seguinte:
“At 1510 hrs the ADC who had been on duty during the dual flight handed over to another controller. There is no record of the information exchanged during this verbal handover, but, in the opinion of the SATCO, the relieving ADC may not have been aware at this stage that the pilot of G-BABB was an inexperienced student.
Moreover, the ADC himself stated that he had not been made aware of this fact.”
O que nos ilustra uma falha na transmissão de informação na mudança de turno do pessoal do Controlo.
Esta falha começou a alinhar os buracos do “Queijo Suiço” e a deixar a trajectória de acidente livre. Uma ideia que poderá ser representada pela seguinte imagem figurativa:
Quando as deficiências intrínsecas da segurança se alinham todas, a trajectória do acidente fica livre de prosseguir e o acidente acaba por se dar.
Às 1516hrs o aluno estabelece o seu primeiro contacto com o novo controlador para o informar que se mantinha no HOLDING POINT C1 conforme previamente instruído. Efectivamente, um BAe 146 estava para descolar da pista 06 o que veio a acontecer às 1517hrs.
Southend Airport. Origem AIP [UK]. Não serve para fins operacionais.
O Holding Point C1 encontra-se indicado na ponta da seta.
Como veremos na próxima crónica, esta descolagem do BAe 146, antes da descolagem do aluno, foi mais um motivo de “ruído” para ajudar a complicar a situação e alinhar os “buracos do queijo Emmental”.
Poderá parecer-te que estou a exagerar nos pormenores. Porém, eles são importantes para um correcto e completo entendimento do terrível acidente no qual pereceu um jovem de 16 anos. Q
METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – IX)
Para terminarmos este tema vamos hoje abordar o último parâmetro, um parâmetro que se pode revestir de muitas formas.
INFORMAÇÃO SUPLEMENTAR (REMARKS)
Os códigos da “Informação Suplementar” seguem-se posicionalmente aos códigos do “Acerto Altimétrico” e podem revestir-se das formas indicadas na tabela seguinte.
A “Informação Suplementar” pode ainda incluir:
Fenómenos meteorológicos recentes, codificados com o prefixo RE;
Temperatura da água do mar à superfície em ºC e o estado do mar de 0-9, codificada da seguinte forma: W## / S#;
Estado da pista, codificada como um grupo de 8 dígitos de acordo as regras da região de navegação aérea;
Uma previsão de evolução nas próximas duas horas poderá ter o aspecto que se descreve a seguir:
METAR EDDF 071320Z 22008KT 9999 SCT036 SCT090 BKN280 19/10 Q1011 NOSIG
Os grupos de previsão de evolução nas próximas duas horas começam quer com BECMG, quer com TEMPO, utilizando as codificações típicas das mensagens TAF. Poderá ainda limitar-se a NOSIG, que indica que “no significant changes “ são expectáveis para os elementos atmosféricos reportáveis “during the 2 hours following the reported observation“.
TABELA DE DESCODIFICAÇÃO DA INFORMAÇÃO SUPLEMENTAR (REMARKS)
A01 – Reported by automated observation equipment that CANNOT distinguish between rain and snow
A02 – Reported by automated observation equipment that CAN distinguish between rain and snow
ACC W – AltoCumulus Castellanus clouds West
ACSL SW-S – AltoCumulus Standing Lenticular clouds SouthWest through South
CB W MOV E – CumulonimBus clouds West MOVing East
CBMAM DSNT S – CumulonimBus MAMmatus clouds to the DiStaNT South
CCSL OVR MT E – CirroCumulus Standing Lenticular clouds OVeR MounTain(s) to the East
CONS LTGCA – CONtinuouS (more than 6 flashes per minute) LighTninG, Cloud to Air
FROPA – … due to FROntal Passage
FRQ – FReQuent (1-6 flashes per minute for lightning)
IR – Ice on Runway
LSR – Loose Snow on Runway
LTGCA – LighTninG, Cloud to Air
LTGCC – LighTninG, Cloud to Cloud
LTGCG – LighTninG, Cloud to Ground
LTGIC – LighTninG, In-Cloud
OCNL – OCcassioNaL (less than 1 flash per minute for lightning)
PK WND 28045/1955 – PeaK WiND 280 at 45 knots occurred at 1955Z
PK WND 34050/38 – PeaK WiND 340 at 50 knots occurred at 38 minutes past the hour
PRESRR / PRESFR – PRESsure Rising Rapidly / PRESsure Falling Rapidly
PSR – Packed Snow on Runway
RAB20SNB20E55 – RAin and SNow Began at 20 minutes past the hour, Ended at 55 min past
RCR01 – Runway Condition Reading – values 00 to 25; higher values better for flight ops
RCRNR – RCR-equipped, but No Report; or Base Operations closed
RSC – Runway Surface Condition as determined by Airfield or Operations Manager
RVRNO – RVR-equipped, but NO report
SFC VIS 2 1/2 – SurFaCe VISibility is 2 ½ statute miles; remarked when (lower) tower visibility is reported in METAR body
SLP015 – Sea Level Pressure is 1001.5 millibars
TCU OHD – Towering CUmulus clouds OverHeaD
TCU W – Towering CUmulus clouds to the West
TSB05E30 – ThunderStorm Began at 05 minutes past the hour and Ended at 30 min past
TWR VIS 1 – ToWeR VISibility is 1 statute mile; remarked when (lower) surface visibility is reported in METAR body
VIRGA – VIRGA at the station; precipitation observed but not reaching the ground
VIRGA DSNT NE – VIRGA to the DiStaNT NorthEast
VIRGA SW – VIRGA to the SouthWest
VIS 1V2 – VISibility is Variable between 1 and 2 miles
VIS 2 RWY 11 – VISibility is 2 statute miles at RunWaY 11
VIS N 2 – VISibility in the Northern sector is 2 statute miles
WR – Wet Runway
WSHFT45 – Wind SHiFT at 45 minutes past the hour
Assim dou por terminado o tema dos METAR’s e dos SPECI’s. Espero que tenha sido uma revisão interessante para o teu airmanship. Em próximas crónicas irei debruçar a atenção sobre os TAF’s (Terminal Aerodrome Forecast). Q
Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ
Como sempre, um abração do
Fernando
Segurança Aeronáutica Nº329
Meu Caro,
Até acabar de escrever esta crónica parece que não aconteceu mais nenhum acidente com uma aeronave em Portugal. Aleluia! Em minha opinião, este problema da catadupa dos acidentes ocorridos este ano é um assunto que mereceria um estudo muito cuidado pois o número de mortes é absolutamente extraordinário, e isto num ano em que pouco se deve ter voado dadas as restrições financeiras em curso no País. Mas, meu Caro, isto é um tema que ultrapassa em muito o âmbito destas minhas crónicas. Faltam-me conhecimentos e informação pormenorizada.
Esta semana, como peça de entrada, proponho-te uma análise de uma publicação da FAA especialmente dedicada aos formadores aeronáuticos. Se não és formador lê na mesma pois, certamente, aumentarás o teu airmanship. Depois reproduzo uma informação que me foi passada por um querido instrutor e amigo sobre o problema dos vapores de gasolina no interior de um avião.
Seguidamente alertarei todos os utilizadores/operadores dos Piper Comanche para uma AD da FAA: a AD 2012-17-06, Amendment 39-17169 sobre um risco de avaria no comando do “stabilator”.
Esta semana vou recorrer a uma colaboração externa que tem um curioso título: “A Segurança de Voo e a “Prima”. Leiam-na com atenção pois ela deve ser motivo de reflexão de modo a deixarmos satisfeita a Segurança Operacional.
Começaremos, nesta crónica, uma série de análises sobre um acidente ocorrido no Reino Unido em que perdeu a vida um jovem de dezasseis anos certamente cheio de sonhos ao seu segundo voo solo.
FAA SAFETY BRIEFING MAGAZINE HIGHLIGHTS AVIATION EDUCATORS
Qualquer ramo da Aviação Geral tem necessidade de uma actualização permanente para que o nível de Segurança Operacional seja elevado.
Hoje proponho-te a leitura de uma publicação editada pela FAA, destinada especificamente aos Instrutores de Voo. Para acederes ao seu texto integral basta consultares o seguinte sítio: http://www.faa.gov/news/safety_briefing/2012/media/SepOct2012.pdf . Trata-se da publicação “FAA Safety Briefing” cuja edição de SET/OUT de 2012 explora o papel crítico dos formadores de Aviação.
Esta edição foca especialmente a sua atenção nos requisitos e boas práticas como, também, nas muitas ferramentas e recursos pedagógicos que podem ajudar-te a afinar as tuas capacidades de ensino. Se não fores instrutor não deixes, ainda assim, de ler esta edição da FAA pois, de certeza, vais aprender algumas coisas que melhorarão o teu airmanship. Um conselho do Fernando. Q
ACIDENTE TÍPICO OU UMA FALHA DE INSTRUÇÃO (Parte – IV)
Ainda a propósito deste tema recebi, esta semana, uma mensagem em que um dos meus ex-instrutores me dizia:
“…não tive tempo para ler com atenção as tuas considerações sobre a má vizinhança entre os vapores de gasolina e pataniscas… No entanto recordo um episódio em que o F… me pediu para lhe fazer o exame de PCA e escolheu o CS-XXX (um Cessna C152), avião em que ele dava instrução.
…Apresentou-me a aeronave depois de aceite para o voo com a alcatifa a escorrer em gasolina porque o tubo do depósito para torneira estava completamente cortado em resultado de fricção com uma antepara.
“…como deves calcular abortei o exame!”
Na realidade, um dos tubos condutores do combustível para a “válvula de corte geral de combustível” do Cessna C152, devido a uma deficiente montagem, tinha ficado em contacto com uma das anteparas por debaixo do chão do cockpit. Com o tempo e com a vibração, o tubo acabou por se partir no ponto de contacto com a antepara.
Como podes ver, não é só após um acidente com avarias graves na aeronave que pode haver libertação de gasolina e seus vapores. Como te disse na crónica anterior desconfia sempre do cheiro a gasolina dentro ou fora do avião. Pode ser indiciador de uma sempre perigosa fuga. Um conselho do Fernando. Q
PROBLEMAS NO CONTROLO DO STABILATOR DO PIPER PA-24
Apesar de não haver muitos Piper Comanche em Portugal, há alguns. Veio agora a FAA alertar os proprietários e operadores deste tipo de aeronave para o risco de o “horn” de controlo do “stabilator” aparecer com corrosão e/ou fendas. Se esta peça se partir em voo o avião vai deixar de ter controlo em “pitch” o que, certamente, será uma emergência muito grave que tem fortes probabilidades de terminar num acidente grave.
Para saberes mais sobre este problema deverás consultar urgentemente o seguinte documento da FAA: AD 2012-17-06, Amendment 39-17169. Esta AD afecta cerca de 3100 aviões.
Como sabes, muitos aviões produzidos pela Piper dispõem de um plano horizontal de cauda que realiza a função “estabilizador” e a função de “leme de controlo de pitch” com uma única superfície articulada sobre um único eixo. Daí o acrónimo “stabilator” formado a partir das seguintes palavras “stabilizer” + “elevator”.
É pois o “horn” de comando deste órgão do avião que poderá apresentar avarias que poderão levar à sua fractura e posterior desgoverno da aeronave.
Actuador do stabilator.
Se costumas voar num Piper PA-24 Comanche está na altura de mandares inspeccionar o “horn” de controlo do plano horizontal de cauda. Um conselho do Fernando. Q
A SEGURANÇA DE VOO E A “PRIMA”
Esta semana fui aconselhado a ler um interessante artigo intitulado A Segurança de Voo e A “Prima” , publicado no blogue “O Adamastor” da autoria do Ten-Cor Brandão Ferreira, artigo que reproduzo com a devida vénia. Passemos, então, ao artigo.
Desde que os irmãos Wright conseguiram, em 17/12/1903, que o mais pesado que o ar se deslocasse 36 metros acima da superfície terrestre, desafiando as leis da gravidade, que é assim!
Já para não recuarmos à “Passarola” do nosso Gusmão, que não saiu da fase de projecto. E que projecto esse poderia ter sido! Talvez conseguíssemos ter feito no Ar o que tínhamos feito no Mar, 200 a 300 anos antes…
Nem o grande Sacadura Cabral, instrutor do primeiro curso de pilotos militares, efectuado em Portugal, no já longínquo ano de 1916, em Vila Nova da Rainha, o conseguiu evitar. E como foi pena ter desaparecido no Mar do Norte nesse aziago voo da Holanda para Lisboa, em 1924!
Logo ele, de que tanto se poderia esperar!
Mas enfim, devem estar todos ansiosos por saber o que tem a “prima” a ver com isto, sem embargo de algumas “avantesmas”, descendentes da “Aviação Heróica”, ainda vivos, já terem certamente percebido.
Bom, a “prima”, melhor dizendo a “visita” à mesma é, provavelmente, a mais antiga causa de indisciplina de voo e de um número de acidentes/incidentes/perdas de vidas e bens, não despiciendo.
A “visita à prima” explica-se em duas penadas: trata-se de um avassalador ímpeto interior, resultante de um fogo vaidoso do ego, que impele o “Zé Aviador” a arriscar fazenda, normas e integridade física, a fim de poder mostrar-se à prima. Prima esta que resulta da síntese, de um conceito alargado de familiares e amigos onde assume especial relevo o ser que, no momento, faça bater mais fortemente o coração entre ânsias e suspiros: a namorada (agora, também, o namorado).
Para impressionar a dita cuja, todas as precauções se abatem e os medos se afugentam e já que “perdido por um perdido por mil”, há que, invariavelmente, planear a cena para que a “máquina” passe raivosamente baixa (eventualmente raspante) e com a maior velocidade possível (tipo “motor aos copos”), de modo a causar o máximo de impressão na retina, nos tímpanos e, até, nos pêlos do nariz dos eventuais espectadores. De preferência avisados previamente (para não se atreverem a perder o espectáculo), da hora da passagem.
Caso a meteorologia, o local e a habilidade do “artista” sejam propícios, ainda se tentará fazer umas “piruetas”, vocábulo com que os simples costumam apelidar as figuras acrobáticas feitas pelos senhores aviadores.
Um recente “incidente” ocorrido – de características insólitas, até – que não caiu, por bambúrrio, na praça pública suscitou, digamos, esta chamada de atenção.
É que por mais (maus) exemplos que se refira, com que se queira ilustrar os perigos e desadequação do acto; das sanções disciplinares, latentes ou aplicadas, com que se possa acenar; da melhoria da instrução que se foi registando ao longo dos tempos; da maior visibilidade e falta de tolerância cívica por semelhantes situações e, ainda, a maior consciencialização e exigência profissional de toda a operação aérea, etc., a visita à prima irá continuar.
Por isso não se pode descurar a mentalização, vigilância, supervisão e as sanções – numa palavra, a liderança – sobre este peculiar aspecto da “Conquista do Ar”, a fim de tentar manter o número de ocorrências o mais baixo possível - e quando surgir a oportunidade (é fatal como o destino), uma nave espacial há - de fazer uma “rapada” na superfície da Lua ou num meteorito qualquer, logo que apanhe o “Houston Center” distraído…
A razão é simples e é apenas uma: enquanto a natureza humana for aquilo que é, não há prima que não seja objecto de tentação.
Poder-se-ia tentar conseguir que a dita cuja não estivesse presente na data/hora/local, desse evento de excitação extrema, digno do melhor marialvismo. Mas digam-me, algum de vós acredita mesmo, que a “prima” seja ele quem for, se queira subtrair a tão feérico momento?
Entretanto o Gabinete de Investigação e Prevenção de Acidentes com Aeronaves continua há meses, apenas com um investigador e com o seu director demissionário.
Façam o favor de irem tentando aterrar melhor do que descolam.
Poderia juntar que a visita à Prima pode passar por uma outra variante. Pode ser um mero acto solitário do estilo “eu sou imune a tudo, nada me acontece, deixa-me experimentar os meus limites”. Efectivamente é uma outra maneira de satisfazer o próprio ego. Ocorre de vez em quando.
A “visita à prima” normalmente já ofende o ponto 4.6 do Anexo 2 da ICAO aquele que nos informa que:
4.6 Except when necessary for take-off or landing, or except by permission from the appropriate authority, a VFR flight shall not be flown:
a) over the congested areas of cities, towns or settlements or over an open-air assembly of persons at a height less than 300 m (1 000 ft) above the highest obstacle within a radius of 600 m from the aircraft;
b) elsewhere than as specified in 4.6 a), at a height less than 150 m (500 ft) above the ground or water.
O pior é quando a “visita à prima” ofende as leis da Aerodinâmica e/ou da Mecânica. Como tu bem sabes a Mãe Natureza é implacável nos seus castigos. Não há penas suspensas…
Como nos diz Brandão Ferreira evita manifestações de um carácter psicológico de “macho”. Um verdadeiro macho mostra a sua superioridade pela inteligência. E mais não digo!Q
INSTRUÇÃO, CONTROLO E ACIDENTE – (Parte – I)
Numa série de artigos que hoje começamos vamos abordar um acidente que lastimavelmente terminou com uma morte. Um acidente com diversos actores.
Numa anterior croniqueta [Crónica #129 de 02-05-2008] abordámos já este acidente, mas unicamente do ponto de vista das comunicações. Durante o período de férias pensei muito nele pois o seu Relatório de Investigação é extremamente rico em ensinamentos.
Porque o acidente ocorreu no Reino Unido a sua investigação foi realizada pelo Air Accident Investigation Branch – UK. Se quiseres conhecer o texto integral do Relatório, leitura que te recomendo muito vivamente, deverás seguir a hiperligação para o AAIB Bulletin: 7/2007 e depois, dentro dele, deverás procurar a página 70.
O acidente deu-se com uma aeronave Cessna C150L semelhante à da fotografia seguinte.
Cessna C150L idêntico ao acidentado. Um avião no qual tantos de nós nos iniciámos como pilotos.
Para teres uma macro visão dos factos vejamos a Synopsis do relatório EW/C2006/07/05 do AAIB-UK. Não traduzo para não perder o sentido de qualquer palavra.
Synopsis
The student, who was training at Southend Airport (EGMC) [no condado de Essex, a Este da cidade de Londres] towards the issue of a Private Pilot’s Licence, was on his second solo flight. Having established the aircraft on final approach, the student was instructed to go around so that a faster aircraft approaching to land behind his aircraft would not catch up with it. Both the controller’s instruction and the student pilot’s acknowledgement involved non-standard RTF phrases.
In order to avoid any possibility of conflict between the two aircraft the student was then instructed to turn away from the final approach track. During this manoeuvre, the student flew level at low altitude and it is likely that the aircraft remained in the approach configuration with insufficient power applied to maintain flying speed. In level flight, the aircraft stalled at a height from which recovery was impossible and it struck the ground in a public park approximately 1 nm from the airport. The student pilot was fatally injured. Four safety recommendations were made.
O piloto que faleceu no acidente que, como se diz no Synopsis, executava o seu segundo voo solo, tinha 16 anos. Acrescento, ainda, que o piloto havia realizado o seu primeiro voo solo dois dias antes. No dia do acidente, o instrutor fez com o aluno um pequeno voo de duplo comando para consolidar os conhecimentos tendo, seguidamente, o aluno prosseguido para o seu segundo voo solo. Como vês “per the book”.
Antes do voo, o instrutor contactou telefonicamente o Controlo de Tráfego Aéreo (ATC) na pessoa do Senior Air traffic Control Officer (SATCO) no sentido de informar que, depois de um pequeno voo em duplo comando, o piloto iria realizar o seu segundo voo solo.
Na sequência deste telefonema o SATCO passou os detalhes do voo ao Controlador de Serviço (ADC) através duma “Fita de Progresso de Voo” (FPS) sem contudo indicar o número de pessoas a bordo para aquele voo, visto não haver maneira de indicar inequivocamente na FPS essa informação. Contudo, verbalmente, o SATCO comunicou ao ADC que durante uma certa fase do voo estaria aos comandos da aeronave um aluno-piloto no seu segundo voo solo.
Tudo “per the book”. Porém, a partir deste ponto, começaram a acontecer as anormalidades que levaram à morte deste jovem de dezasseis anos. Prosseguiremos para a semana. Q
Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu “airmanship” e da tua postura como Aviador.QQ
Como sempre, um abração do
Fernando
Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve segundo a ortografia do Acordo Ortográfico de 1945.Segurança Aeronáutica Nº327
Meu Caro,
Retomo a publicação das minhas croniquetas depois das “férias” (será que um homem reformado tem férias?) escrevendo um pequeno editorial onde explicarei ou relembrarei o que me faz produzir estes meus escritos semanais.
Assim, começo por recordar que estas minhas crónicas têm como único objectivo a divulgação e a promoção da SEGURANÇA OPERACIONAL, o desenvolvimento do airmanship de todos os meus Caros e, “last but not east”, tentar diminuir os incidentes e a sinistralidade aeronáutica. Absolutamente, nada mais!
Desde sempre utilizei uma linguagem coloquial tal como utilizaria numa conversa pessoal de “porta de hangar” com os diversos receptores da mensagem. Uma conversa de amigos. Podia fazê-lo de uma forma académica cheia de solenidade e impessoalidade. Sei fazê-lo e faço-o quando é necessário. Porém, se o fizesse não transmitiria a “cor” nem daria a ênfase necessárias a uma assimilação fácil das ideias por parte dos meus interlocutores. Foi uma opção inicial minha da qual não abdico.
Tento modelar as minhas croniquetas pelo espírito do Anexo 13 da ICAO. Naturalmente, umas vezes melhor, outras vezes pior. Acontece, porém, que os “Meus Caros” têm, cada um, as suas sensibilidades e opiniões. A única coisa que têm em comum é gostarem muito de aviões. Cada um à sua maneira. Por isso mesmo, às vezes, há entendimentos pessoais diferentes daquilo que eu quero transmitir. Falha minha de certeza. Como dizem os meus primos ingleses: “ – Nobody is perfect, Sir!” . Contudo, fazendo uma adaptação muito livre do ponto 3.1 do citado Anexo reafirmo que:
“The sole objective of these chronicles shall be the prevention of accidents and incidents.
It is not the purpose of this activity to apportion blame or liability”.
Que fique muito claro!
As minhas croniquetas são documentos pessoais distribuídos pelos meus amigos e ex-alunos. De modo algum pretendem ser documentos públicos! Se fossem, já há muito tempo teria seguido os conselhos de uma série de leitores que me sugerem a criação de um blogue para uma maior disseminação das matérias. Sempre resisti a isso pois uma coisa é enviar uma mensagem a um Amigo e outra coisa é escrever para o público da Net. Em minha opinião passeiam pela World Wide Web indivíduos que são verdadeiros “maus caractistas” como dizia essa cómica personagem ficcional - o Odorico Paraguaçu – criada pelo dramaturgo brasileiro Dias Gomes e vivido na telenovela pelo saudoso actor Paulo Gracindo. Indivíduos que eu não tenho paciência nem tempo para aturar, mas que teria de aguentar se tornasse públicas as minhas crónicas. Se alguma vez isso viesse a acontecer as minhas croniquetas teriam, por outro lado, de cair no estilo académico que referi no início e que rejeito para elas.
Sei que, por vezes, as croniquetas circulam por pessoas que não constam na minha lista de distribuição. Não tenho meio de controlar o facto, pelo que não posso ser responsabilizado por uma disseminação que se faz à minha revelia. As crónicas saem do meu computador sob as condições de “Bcc” (blind carbon copy) de modo a não divulgar os receptores das mensagens. Uma segurança informática para os “meus Caros”.
Normalmente os textos que são especificamente de minha autoria, ou que assumo como tal, são escritos em tipo Arial, corpo 11 e a cor azul. Por vezes, se faço uma citação, continuo a utilizar este corpo mas com a variante “itálico”. Tudo o que aparece escrito em tipo Arial, corpo 11 e a cor verde são textos retirados de documentos que não são de minha autoria. Isto com citação de origem, ou não.
Sempre que posso remeto os leitores para a leitura dos documentos originais pois esta parece-me ser a melhor maneira de tirar todas as dúvidas. Aconselho sempre a leitura desses mesmos documentos.
Como não sou Investigador de Acidentes não me sinto obrigado ao tradicional rigor e formalismo destes. Como tal, sentir-me-ei livre para expender opiniões não rigorosamente baseadas em factos apurados como se espera do trabalho destes Técnicos. Sentir-me-ei à vontade para levantar hipóteses desde que delas se possam retirar ensinamentos úteis.
Para terminar este meu editorial volto a enfatizar que, quando faço alguma crítica ela deve sempre ser entendida como uma crítica construtiva, nunca destrutiva. Sempre no sentido de beneficiar a Segurança Operacional. Afinal, nestes textos semanais divulgo a minha livre opinião e nada mais. Não me compete a mim fazer críticas sancionatórias. Para isso existem as Entidades Aeronáuticas Nacionais.
Tanto assinalarei erros cometidos por pilotos, como por controladores, técnicos de manutenção ou por entidades reguladoras. Acima de tudo farei comentários ao “Sistema” já que os acidentes e/ou incidentes aeronáuticos normalmente têm causas múltiplas, com origem nos citados quatro vértices do “Quadrado da Confiança”. Raramente em um só. Afinal ninguém está imune ao erro pois, como enganosamente se atribui a Séneca, “errare humanum est, perseverare diabolicum”, por outras palavras: “Errar é humano. Persistir no erro é diabólico.”
Para que eu possa continuar a escrever as “croniquetas” é preciso que os “meus Caros” entendam bem o espírito positivo que me anima. Se não concordarem com ele comuniquem-me, por favor, para que eu possa retirar os vossos endereços e-mail da lista de distribuição. Não quero ser considerado um vulgar missionário que anda a disseminar a “Fé da Segurança Operacional” de porta em porta, importunando cada um.
Mas, se alguma vez acharem que me devem enviar os vossos comentários, críticas ou sugestões, sintam-se à vontade para o fazer. Será com a colaboração de todos que as minhas crónicas se poderão tornar verdadeiramente úteis.
Para terminar lembro-te que, por uma opção intelectual minha, os meus textos não são escritos segundo as regras do Acordo Ortográfico de 2009. Um acordo através do qual fomos postos a seguir as deturpações impostas na nossa língua pelos falantes de outros países. Afinal tal como dizia o grande Fernando Pessoa: “ – A minha Pátria é a Língua Portuguesa”. Eu quero continuar a ser Português.
E agora que este editorial está terminado, passemos aos temas técnicos.
Estão disponíveis na página eletrónica do GPIAA, a partir de hoje:
· A Nota Informativa do Acidente com o Airtractor 802A, registo EC-JLB, ocorrido no dia 19 de julho de 2012, na Barragem do Roxo, Beja;
· A Nota Informativa do Acidente com o Paulistinha 56-C1, ocorrido no dia 18 de agosto de 2012, em S. Pedro de Merelim, Braga
· A ultima atualização do Mapa Síntese dos Acidentes e Incidentes ocorridos em 2012
ESTAMOS NOVAMENTE DE LUTO
Mais um acidente aeronáutico, mais dois companheiros que pereceram. Até à data, neste ano de todos os recordes, já pereceram nove aviadores e seus acompanhantes. Para saberes os primeiros pormenores do último acidente segue o link indicado no GPIAA News acima indicado, referente ao acidente com o Paulistinha.
Anteontem, mais um acidente mortal com um aluno da Academia de Évora quando se aproximava do campo. Com este acidente o número de mortes subiu este ano para dez.
O que se estará a passar com os Aviadores Portugueses?
Que os nossos Companheiros descansem em paz, são os meus votos. Q
A HUMANIDADE ESTÁ DE LUTO POR UM GRANDE AVIADOR
Hoje estou de luto. Faleceu aquele que no já longínquo dia (ou melhor, noite) do dia 20 de Julho de 1969 comoveu o Mundo ao dizer aquela célebre frase: A LITTLE STEP FOR A MAN. A GIANT LEAP FOR MANKIND. Uma frase carregada de um enorme significado para toda a Humanidade.
É verdade. Faleceu hoje aos 82 anos de idade um dos grandes marcos da nossa civilização que foi esse homem que dava pelo nome de Neil Alden Armstrong.
Faleceu o homem que pela primeira vez deixou a marca das suas pegadas noutro planeta. Um homem fora de série. Depois de deixar carreira de piloto naval (1949/1952) durante a Guerra da Coreia, Neil Armstong foi admitido em 1955 pela National Advisory Committee for Aeronautics (NACA). O seu primeiro trabalho foi no NACA Lewis Research Center (agora NASA Glenn) em Cleveland. Durante os próximos 17 anos, ele foi um Engenheiro, um Piloto de Experiências, um Astronauta e um dos Administradores da própria NACA e da sua sucessora National Aeronautics and Space Administration (NASA).
Neil Alden Armstrong (1930 – 2012)
Foi um enorme Aviador. Honra à sua memória! Q
ÍNDICE REMISSIVO DAS CRÓNICAS PUBLICADAS
Há alguns meses venho construindo um índice remissivo das minhas crónicas. Foi um trabalho complicado pois este índice levou à leitura das 326 croniquetas anteriores. Tive de classificar cada tema debatido com um descritor que melhor o identificasse.
Este índice remissivo foi construído numa folha Excel onde cada tema é resumido em quatros campos a saber:
- Número da crónica
- Data da crónica
- Descritor classificativo
- Título do tema
Deste modo, os meus Caros, manipulando a folha Excel poderão fazer as ordenações que lhes sejam mais úteis para os seus objectivos.
Quem estiver interessado em receber este índice remissivo peça-mo pois enviar-lho-ei em mensagem separada através de um ficheiro no formato xls. Q
UM PENSAMENTO DE UM HOMEM QUE VIVE PAREDES MEIAS COM O ACIDENTE
Alfred Louque é um profissional americano que se dedica ao comércio de sucatas de avião. Um homem que vive paredes meias com os acidentes já que uma grande parte dessas sucatas advém de aeronaves acidentadas. Com a sua elevada experiência de observação dos destroços resultantes de desastre aéreos, tornou-se num perito em investigação de acidentes. Esta mesma experiência é muitas vezes posta ao serviço do próprio NTSB. Ao serviço do NTSB e da generalidade de Comunidade Aeronáutica. É de Louque a seguinte ideia:
“Every accident came at a price. It would be foolish not to take what we can learn from people who paid the price”.
E lembrar-me eu que durante tantos anos os relatórios de investigação de acidentes jaziam no segredo dos gabinetes sem que se tornassem úteis para a Comunidade Aeronáutica. Felizmente o GPIAA acabou com este estado danoso das coisas e a informação útil passou a circular com a necessária brevidade. Um ponto onde a nossa Aviação evoluiu positivamente. Uma opinião do Fernando. Q
FALA QUEM SABE
Michael Huerta, administrador em exercício da FAA afirmou (não traduzo para não tirar qualquer sentido à frase) que:
“…he wants general aviation pilots to be aware of safety. "We all have our routines," he said. "We just want them to take some time to sit back and ask the question 'am I doing everything I can to maintain the maximum level of safety?'...".
FAA Acting Administrator Michael Huerta
Durante uma palestra que decorreu durante o AirVenture Huerta enfatizou ainda que “…We want them to know that the thing we care about most of all is safety…”.
Mais adiante disse: “ - We want to know that every time they take the controls of their aircraft that they are safe — that we’ve done everything that we can to ensure the safety of that particular flight and that particular aircraft and everything that goes with it and they’ve taken the appropriate level of responsibility to ensure that every one of their systems is completely safe.”
Eu não seria capaz de sintetizar melhor a ideia. Pensa nisto meu Caro. Um conselho do Fernando. Q
HOMOLOGAÇÃO DE AERONAVES, MOTORES E OUTROS ÓRGÃOS (Parte I)
Quem está minimamente por dentro do mundo da Aviação sabe que a aeronave, no seu todo e/ou certos órgãos, no particular, são feitos homologar pelos fabricantes junto das Entidades Reguladoras. Estas, por sua vez, emitem os certificados de Aeronavegabilidade do avião e de alguns dos seus órgãos, e.g. motor, hélice, etc.
Como sabes, o processo de homologação de uma aeronave ou de certos dos seus órgãos é um processo meticuloso, realizado por especialistas de ambas as partes – fabricante e certificador. Demora longos meses (mesmo anos) e, normalmente, custa milhões. De acordo com isto será legítimo introduzir qualquer alteração nas características homologadas? A resposta é um não rotundo. Efectivamente não é legal alterar as características homologadas a não ser que seja obtido aquilo que se chama um “Supplemental Type Certificate”. A Comissão Europeia diz-nos que alterações importantes aos certificados-tipo de uma aeronave por um não detentor desses certificados-tipo (o fabricante da aeronave) devem ser aprovadas de acordo com a Parte 21. Secção A. Subparte E do Regulamento da Comissão (EC) Nº1702/2003, de 24.09.2003.
Nesta subparte E diz-se:
21A.112B Demonstration of capability
(a) Any organisation applying for a supplemental type-certificate shall demonstrate its capability by holding a design organisation approval, issued by the Agency in accordance with Subpart J.
Pelo que se vê a Comissão não permite a qualquer um requerer um “Supplemental Type Certificate”. Esse requerimento só pode ser feito por empresas previamente certificadas. Tudo isto é natural e, em meu entendimento, uma manifestação do mais puro bom senso.
Ora, o “Meu Caro” F. expôs-me uma situação vivida por ele próprio que me parece ir contra o Regulamento da Comissão (EC) Nº1702/2003. Obviamente que não posso testemunhar em tribunal o que se passou pois não assisti aos factos. Porém, em meu entendimento o que interessa acima de tudo são os conceitos. Vejamos o que ele nos diz:
“Fui voar … e tive uma mão cheia de coisas sérias para me entreter:
Primeiro um motor que teimava em ter oscilações de rotação aquando do teste dos magnetos (só após um segundo teste é que se comportou convenientemente);
Em segundo o mesmo motor não teve capacidade para debitar mais de 2350 rpm, que resultou numa corrida de descolagem totalmente desnecessária. Felizmente a pista era a de Tires e não a de Santa Cruz. Bem sei que deveria ter ficado no chão.
Felizmente correu tudo pelo melhor e voltei a aterrar em plena segurança com tempo para um debriefing sobre a situação e aprender com este erro (devia ter reparado mais cedo na limitação do motor).”
Realmente “Meu Caro F.” cometeste um pecado contra a Segurança Operacional. Se achavas que a aeronave não estava em perfeitas condições, pura e simplesmente não deverias ter realizado o voo. Deverias, sim, ter participado à “Manutenção”, por escrito, os defeitos encontrados para que a aeronave fosse colocada dentro das condições do seu Certificado de Aeronavegabilidade.
Nunca acredites que “Any landing you can walk away from is a good one”. Isto é uma frase dita por um correspondente de Guerra na WWII que conseguiu sair vivo de um bombardeiro totalmente desfeito na aterragem. Lá por ser verdade uma vez, nunca tomes a frase como um dogma de fé dos Aviadores. Acreditar piamente nesta ideia pode ser perigoso.
Mas o mais interessante vem a seguir. Diz-nos o F. que:
Em conversa com o mecânico responsável pela aeronave, fui informado que aquele motor foi limitado àquela rotação para "poupar o motor". Para "POUPAR O MOTOR"?. …”
Assim, pergunto-lhe, a Cessna permite este tipo de "afinações"? É que além deste "tuning", o hélice desta aeronave tem especificações de cruzeiro (que, pelo que sei, é permitido), mas aliar 2350 rpm a um passo de cruzeiro parece-me parte da receita para a desgraça. Digo isto da boca para fora sem ter ainda estudado a situação de forma pormenorizada nem com base nos manuais técnicos do avião e, por essa razão, desculpe-me qualquer erro de principiante. Imagino um qualquer recém-encartado (seja PPA ou PLA) num dia com temperaturas a rondar os 35ºC a precisar de borregar, e a coisa a correr mal.
Ainda não leste os manuais mas estiveste atento às tuas aulas teóricas! Como tal interiorizaste os conceitos. Quanto ao “tunning” nada te consigo dizer porque ainda não consegui fechar a boca de tanto espanto. Se calhar nem a quero fechar pois iria, certamente, utilizar uma linguagem menos própria que me ofenderia certamente os meus próprios ouvidos.
Como é que se podem fazer afinações que alteram a performance do motor e, consequentemente, da aeronave?
Noutros países em que esta “coisa” da Aviação se leva um bocado mais a sério pode acontecer aquilo que eu soube há tempos atrás e que aconteceu à Delta Airlines: Delta Fined About $1 Million by U.S for Safety Violations. E quais foram as violações? Duas:
· Boeing Co. (BA) 737 with a chip in its nose cone after being notified of the issue by a Federal Aviation Administration inspector; e
· Made 884 flights between May 25, 2010, and Jan. 3, 2011, on an Airbus SAS A320 that had a broken cockpit light, the FAA charged. Airlines are allowed to defer such repairs for no more than 10 days, according to the release.
E lá se foi $1,000,000 USD para a próxima vez a companhia não fazer “alterações” às aeronaves:
- Uma lasca arrancada ao plástico reforçado do cone de nariz do avião; e
- Uma lâmpada partida no cockpit!
Outras culturas que em meu entendimento também devem ser implementadas em Portugal em nome da Segurança Operacional. Uma opinião do Fernando. Q
HOMOLOGAÇÃO DE AERONAVES, MOTORES E OUTROS ÓRGÃOS (Parte II)
Para complementar a Parte I posso descrever um outro episódio de prevaricação contra a legislação citada no início, episódio ocorrido já há uns bons anos atrás.
Um TMA necessitou retirar uma das bombas de vácuo acopladas ao motor de um Cessna para efectuar a reparação desta. Contudo, como houvesse necessidade de pôr a aeronave a voar rapidamente, resolveu efectuar uma “transformação” ao motor. Vai daí recorta uma tampa em acrílico com o formato do encaixe da bomba de vácuo e o avião lá foi voar. Passado um bocado já o avião tinha feito uma aterragem de emergência fora do aeródromo visto o Lycoming ter parado por gripagem. Tudo porque o TMA, pessoa por quem eu pessoalmente nutria estima, não se lembrou que o acrílico se deforma com o calor. Aparafusada ao motor, a tampinha de plástico, como seria de esperar, apanhou um “escaldão”, deformou-se, o motor perdeu o óleo de lubrificação e a gripagem sucedeu como consequência. Felizmente o piloto sobreviveu.
Meu Caro, estás a perceber porque é que as peças têm uma razão para serem homologadas? Nenhum fabricante responsável faria uma tampa de cárter num plástico termossensível como o polimetil-metacrilato. Os desenrascanços à “antiga Portuguesa” às vezes dão mau resultado. Teria sido bem escusado esta prevaricação legal. No caso vertente até havia uma outra solução segura e legal à mão.
Se és TMA não te esqueças da tua responsabilidade como sendo um dos vértices do “Quadrado da Confiança” sem o qual não há Segurança Operacional. “Tunning”, nunca! Uma segunda opinião do Fernando. Q
METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – VII)
Prosseguindo um trabalho que vimos fazendo desde há alguns meses atrás, vamos continuar esta semana com a análise dos códigos das mensagens de informação meteorológica. Na presente crónica, códigos dos METAR’s e SPECI’s. Uma análise feita com o apoio da “Aircrew Quick Reference to the METAR and TAF Codes” da USAF.
TEMPERATURA E PONTO DE ORVALHO
Estas duas grandezas são de uma importância vital para o Aviador. Como é que eu percebo através de uma mensagem METAR ou SPECI o valor das citadas funções? Comecemos por um exemplo:
METAR KBLV 011657Z AUTO 25015G30KT 210V290 3/8SM R32L/1000FT FG BKN005 01/M01 A2984 RMK A02 SLP034
É no grupo imediatamente a seguir ao grupo das condições de nebulosidade que vamos encontrar a informação sobre as condições de “Temperatura” e “Ponto de Orvalho” (dew point). Note-se que esta informação é indicada em graus Celsius.
Neste exemplo, 01 é a temperatura em graus Celsius (1ºC) ,e M01 é a temperatura do ponto de orvalho igualmente indicada em graus Celsius (-1ºC) . Um “M” nestes campos de temperaturas tem o significado de “negativo (minus)” (abaixo de 0ºC). Q
Por hoje fiquemo-nos por aqui. Não quero esgotar todos os temas logo na primeira sexta-feira. Q
Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador. E, de tudo isto, depende a tua vida e a dos teus passageiros.QQ
Como sempre, um abração do
Fernando
Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve segundo a ortografia do Acordo Ortográfico de 1945.Segurança Aeronáutica Nº325
Meu Caro,
Conforme prometido, esta croniqueta vai ser feita com base numa série de ideias que me foram lançadas por diversos dos “Meus Caros” sobre os tristes acontecimentos dos últimos tempos, os quais acabaram por enlutar toda a Comunidade Aeronáutica Portuguesa. Limitar-me-ei a comentar e alertar para as questões de Segurança Operacional intrínsecas a essas ideias. Não entrarei em detalhes dos acidentes pois só me sinto habilitado a fazê-lo após as entidades oficiais publicarem os seus relatórios. Escrever sem conhecer os factos é igual a lançar boataria. Sobre estas ideias que me foram enviadas pelos meus correspondentes limitar-me-ei a expender conceitos gerais, e não a comentar os acidentes no seu particular. Sempre assim procedi, quer com acidentes em Portugal, quer com acidentes no estrangeiro. Por isso recomendo sempre a leitura completa dos Relatórios oficiais.
Mais uma vez manifesto a minha pública homenagem aos sete companheiros que nos seis primeiros meses de 2012 partiram para todo o sempre. A eles e às famílias enlutadas. Manifesto ainda a minha solidariedade àqueles outros que acabaram por se ver numa qualquer cama de hospital durante o mesmo período.
A semana passada, o Semanário “SOL” publicou com chamada de 1ª página, um interessante artigo assinado pela jornalista Joana Ferreira da Costa intitulado “Acidentes Ficam por Investigar”, no qual se debatem as dificuldades do GPIAA para exercer as suas funções derivado da escassez de meios humanos. Para ler o artigo basta seguir a hiperligação. Um artigo que põe o dedo na ferida da Prevenção e Investigação de Acidentes Aeronáuticos em Portugal. Uma nódoa negra na Segurança Operacional.
Por seu turno, o Diário de Notícias publicou em 9 de Julho um artigo não assinado no qual se debate o mesmo tema.
Estão disponíveis na página eletrónica do GPIAA, a partir da passada sexta-feira, 6 de Julho:
· A Nota Informativa do Acidente com o Piper PA-34-200T, registo G-TAIR, ocorrido no dia 03 de julho de 2012 na Quinta de Manique, Alcabideche
· A ultima atualização do Mapa Síntese dos Acidentes e Incidentes ocorridos em 2012
O PILOTO, O SISTEMA MAIS FRACO DOS SISTEMAS EMBARCADOS
Algumas vezes, ou porque faltámos às aulas de “Factores Humanos” durante o nosso curso, ou porque temos o complexo do “Super Homem”, achamos que, enquanto pilotos, não temos qualquer tipo de limitações. Nada de mais errado! Enquanto piloto, temos muito pouca resistência. Nada que se compare com os outros sistemas do avião. Queres um exemplo? Vamos a ele.
Dizia-me o José o seguinte, em relação a este assunto:
“Sobre o acidente de Matarraque li hoje no relatório do GPIAA que decorria uma aula de instrução que já durava há uma hora e que iam para a 13ª aterragem.
O meu instrutor sempre me disse que neste tipo de treinos, a partir dos 30/45 minutos, a aula já se torna pouco produtiva porque os alunos tendem a ficar cansados e a desconcentrar-se mais. Isto falando de dia logo, de noite, pelos motivos óbvios da maior complexidade e limitações do corpo humano, o esforço suponho que seja muito maior o que me faz inferir que se entra na fase de desconcentração mais cedo.”
Meu Caro José, não poderias estar mais certo. Todos nós nos lembramos que, quando tirámos o nosso PPA na fase de “Voo Baixo”, o que nos custava realizar 6/7 aterragens em uma hora. E isto de dia. Já tirei a minha licença há um bom par de anos mas não me esqueci. Chegava ao fim extenuado e cheio de dores na mão esquerda de tanto agarrar o “yoke”. Esta da mão foi um vício errado que depois acabei por corrigir. O cansaço não.
Na modalidade de “Rallye Aéreo” os treinos de aterragens eram fundamentais para não sermos prejudicados em prova. Apesar de já sermos pilotos treinados nunca ultrapassávamos os 45 minutos de treinos consecutivos. É que “elas”, a partir de certa altura, deixavam de acertar na faixa dos dois metros. Já não era treino. Era queimar horas de voo. Nota que estes treinos eram feitos de dia, altura em que a acuidade visual é muito mais precisa e numa altura em que o ciclo circadiano ainda não começava a “desligar” diversos circuitos do cérebro.
Sobre este tema aconselho-te a leitura duma pequena mas interessante publicação da FAA intitulada “FATIGUE IN AVIATION”. Para a obteres basta-te seguires a hiperligação. Poderás, ainda ler o Capítulo do X do Airplane Flying Handbook – Night Operations -, igualmente da FAA.
Se quiseres aprender mais algumas coisas sobre a fadiga como factor de (In)Segurança Operacional aconselho-te a ler alguns conceitos da Royal Canadian Air Force. São conceitos que se aplicam a profissionais, militares ou simples pilotos particulares. Estuda o conteúdo do artigo “Challenges of Fatigue During Night Operations”. Para lá chegares segue a hiperligação. Diz-nos o Captain Jason Virtue o seguinte “...it is no surprise that fatigue is the most challenging human factor the squadron must face. Fatigue decreases the performance of all aircrew regardless of professionalism, motivation or training...”. O “Sistema Homem” comporta-se desta maneira e não há volta a dar-lhe.
Mas será possível diminuir os riscos. Naturalmente há. O Capt. Virtue dá-nos algumas ideias muito simples. Vejamos algumas: “...While the strategic nap has been the squadron's best defence against fatigue, a few simpler techniques have also helped. An in-seat stretch, a non-mission specific conversation or leaving the cockpit for a brief time has proved to be effective against fatigue...”. Infelizmente, como num Cessna C152 não é possível esticar as pernas ou sair do cockpit, talvez a solução passe por interromper o voo e fazer isto em terra firma. Prolongar voos para além de um certo limite constitui certamente um risco pouco razoável e que pode ter graves repercussões sobre a Segurança Operacional.
Portanto, meu Caro, estou de acordo com o “Meu Caro” José. Assim, se te propuserem fazer 13 aterragens nocturnas, acho que será assisado da tua parte contrapropores um menor número de operações deste tipo. Não ganhas nada para melhorar o teu airmanship e ainda te expões a riscos desnecessários e perigosos. Um pequeno conselho do Fernando. Q
TREINO DE ATERRAGENS NOCTURNAS NA PISTA 17 DE TIRES
Nunca treinei nem pratiquei aterragens nocturnas em Tires, como tal não tenho experiência directa dessas manobras. Contudo, tenho algumas ideias que podem ajudar. Por exemplo tenho bem presente os contornos do acidente do KOREAN AIR FLIGHT 80, com um BOEING 747-300, que acabou num CFIT na aproximação à pista 06L de Guam, um CFIT contra Nimitz Hill no sentido da descida da colina. Para perceberes o contexto completo deste acidente aconselho-te a consultares o Relatório PB00-910401/NTSB/AAR-00/01/DCA97MA058 do National Transport Safety Board. Para obteres o Relatório basta-te seguires a hiperligação.
Mas o que tem este acidente com a ideia que o José nos passou? Vejamos primeiro qual é a ideia do Zé. Disse-me ele o seguinte:
“…A acrescer a este factor que não me parece descurável, há outros 2 que gostaria de destacar. O primeiro é o facto de se fazer treino de voltas de pista nocturnas na pista 17 de Cascais que apresenta a especificidade de ter uma colina após o fim da pista e toda a área ser extremamente povoada de casas. Isto implica que todas as descolagens se traduzam numa altura real do avião ao solo reduzida minimizando o tempo de reacção numa hipotética avaria que ocorra. O elevado aglomerado de casas enfatiza o problema pois elimina soluções de aterragens forçadas e sendo de noite muito mais arriscado e difícil se torna. No meio de tudo a A5 pode ser o único escape numa situação de emergência...”.
No caso de Tires, na aproximação à Pista 17, a aeronave tem de passar sobre o Monte de Manique onde está instalada a estação DVOR/DME CAS. No caso do avião coreano, este falhou o embate na estação NIMITZ VOR/DME por pouco mais de 50 metros. Para além disso, o Comandante vinha num estado de cansaço tal, que não o deixou pensar correctamente perante os factos que ocorreram durante a descida.
Como questiona o Zé, será correcto realizar mais de 13 aterragens nocturnas passando a descer sobre o Monte de Manique para a cabeceira da pista 17? A mim parece-me um exagero, tanto mais que se trata do treino de um piloto sem muita experiência. Os franceses têm um provérbio que diz “Petit à petit l’oiseau fait son nid”. Porquê querê-lo construir todo numa noite? Por mim parece-me um mau princípio. Uma simples opinião! Q
OS 180 DA MORTE
Mais uma vez vou utilizar as palavras do Meu Caro Zé e não só, para ilustrar este ponto ao qual penso dedicar futuramente uma crónica, pois é um tema que levanta muitas dúvidas aos pilotos.
Dizia-me o Zé que:
“… O segundo aspecto que me chamou a atenção foi o facto de ter sido comunicado a alteração da pista em uso após a 13ª descolagem, da 17 para a 35, e depreender pelas palavras escritas no relatório que o piloto tentou inverter o sentido (180º) para aterrar logo na 35. Um avião que vai na subida após descolagem, velocidade próxima do mínimo, e prancha para uma volta de 180º, sendo verdade, é claramente um erro grosseiro, sempre aprendi que nem que nos falhe o motor, voltar para trás nunca pois daí à perda é um instante. Com um instrutor a bordo custa-me crer que tal tenha ocorrido mas esperemos por mais informação para tirar melhores conclusões…”.
A estas palavras nada tenho a acrescentar por agora pois elas, no caso concreto, dizem quase tudo.
O “Meu Caro” Amigo A. enfatiza exactamente este ponto quando me diz:
Cheira-me mais a perda em volta: avião ainda a subir flaps e (comme d'habitude e com a sensibilidade de um elefante numa loja de cristais) pedido do controlador para mudar os "planos" no pior momento. Mas, se foi efectivamente perda, o instrutor devia ter actuado.
Não sei, é só um... "cheiro".
Ele sabe por experiência própria o que é isto. Foram factos que se passaram há uns anos no fim de uma viagem a Espanha.
A asneira já tinha começado antes de entrar no espaço de Cascais. A Controladora de Lisbon Approach, quando o Cessna C172 subia da Lagoa de Albufeira para Norte, a 80 kt, instruiu o piloto com a seguinte “ordem”: - CS-XXX reduce your own speed by 20 knots.”. A “pequena”, sem perceber o alcance da sua instrução, pretendia que a aeronave voasse com uma velocidade muito pouco segura acima da velocidade de perda da aeronave. Com os seus anos de prática o piloto pode cumprir a instrução colocando os flaps na posição “Full” e o nariz do avião em cima. Como deves calcular, não é muito agradável voar nesta atitude com a aeronave toda “molengona”. Isto implica uma enorme atenção na pilotagem pois basta uma pequena variação no vento e a situação pode-se complicar e muito.
Depois dos “beijinhos” de despedida ao Controlo de Lisboa o avião entrou na zona de controlo de Cascais onde foi autorizado a aterrar. Chegados à “final curta” o Controlador “mete os pés pelas mãos”, como sói dizer-se, e manda alinhar e descolar de imediato uma aeronave que manobrava no aeródromo. E o Cessna C172, completamente configurado com “full flaps”, estabilizado e com velocidade para aterrar, recebe a “instrução” para fazer 360 pela direita para, assim, evitar o tráfego que iniciava a sua corrida de descolagem. Nota que o Cessna C172 estava a cerca de 350 ft AMSL!!!
Se o piloto não tivesse a experiência que tem a fazer aterragens de precisão, muito provavelmente eu, hoje, não te estaria a escrever esta crónica. É que para fazer a manobra para a qual fomos instruídos, ou se tem experiência e se consegue aguentar o avião sem o meter em perda, ou é morte certa. Àquela altitude, na “final muito curta” da pista 35 de Tires, não existe altura para a mais pequena falha. Parqueado o avião, tive que “levar um papo” com o Controlador. Conversa muito pouco amistosa durante a qual lhe expliquei várias coisas. A primeira foi que, se os factos se tivessem passado com um aluno pouco experiente, teria havido um acidente pela certa. É que os alunos-piloto têm a tendência natural em seguir “ad letera” as instruções do Controlo de Tráfego Aéreo. Bastava termos “pranchado” um pouco mais e o “Factor de Carga em Volta” faria o resto. Já nem quero falar do facto de que, quando ficássemos com um “heading” de 170º, provavelmente ficaríamos com uma razoável componente de vento de cauda. E mais não digo! Afinal, tu também estudaste Aerodinâmica e Performance…Q
Todas estas coisas que foquei são muito más e muito feias pelas mais diversas razões. Estou mesmo a ver a cara da Segurança Operacional. Devem ser só lágrimas! Para a semana continuaremos a analisar os comentários que me foram chegando dos “Meus Caros”. Agora, passemos à Meteorologia!
METAR’S, TAF’S, SPECI’S & COMPANHIA (Parte – IV)
Mais uma semana na qual prosseguimos com a análise dos códigos das mensagens de informação meteorológica. Na presente crónica, códigos dos METAR’s e SPECI’s. Uma análise feita com o apoio da “Aircrew Quick Reference to the METAR and TAF Codes” da USAF.
TIPO DE CONDIÇÕES METEOROLÓGICAS
Como posso verificar se existem condições meteorológicas especiais? Vejamos um exemplo:
METAR KBLV 011657Z AUTO 25015G30KT 210V290 3/8SM R32L/1000FT FG BKN005 01/M01 A2984 RMK A02 SLP034
Se um elemento meteorológico (precipitação ou obstrução à visibilidade) tiver sido observado, este facto será indicado no grupo de informação imediatamente a seguir à “Visibilidade”. A ausência de um grupo de dados sobre condições meteorológicas informa-nos sobre a ausência de precipitação ou outro tipo de obstrução à visibilidade no momento em que foi realizada a observação meteorológica que está na origem do METAR. Neste exemplo, “FG” representa “Fog” (nevoeiro).
Para descodificar correctamente um grupo de “condições meteorológicas”, temos de olhar para seis elementos chave (dependendo do tipo de fenómeno, um ou mais destes elementos pode ser omitido). Por ordem, estes elementos são:
- Intensidade (símbolo que precede o código);
- Proximidade;
- Descritor;
- Descrição do Tipo de Precipitação;
- Obscuridade (para além da precipitação);
- Outros.
Na tabela seguinte indicam-se os elementos das condições meteorológicas:
Vejamos agora alguns exemplos das diversas combinações de códigos que formam um conjunto de informação:
Escalpelizemos a formação de um destes códigos.
+SHRASNPL – heavy rain showers, snow, ice pellets
Elemento (+) = Heavy – pesado, forte
Elemento (SH) = Shower - aguaceiro
Elemento (RA) = Rain – chuva
Elemento (SN) = Snow - neve
Elemento (PL) = Ice Pellets – escamas de gelo
Como pudemos ver, cada código é formado por elementos dos dois quadros: “Quadro dos Qualificadores” e “Quadro dos Tipos de Fenómenos”. Eventualmente, se o qualificador é “Moderado” este não aparece na formação do código completo das “Condições Meteorológicos”.
Para a semana continuaremos com a análise da formação dos códigos dos METAR’s. Q
Deixa-me terminar lembrando-te que Aviação sem Segurança Operacional não é Aviação. Nunca te esqueças que esta, por sua vez, depende do teu airmanship e da tua postura como Aviador.QQ
Como sempre, um abração do
Fernando
Fernando Teixeira, por opção intelectual, escreve de acordo com a antiga ortografia.